O quarteto paulistano Inky - Divulgação

Inspirado por Talking Heads, Inky se “animaliza” em orgânico segundo disco

Liberado esta semana, Animania ganha show de lançamento em São Paulo, neste sábado, 27

Lucas Brêda Publicado em 27/08/2016, às 15h50 - Atualizado em 29/08/2016, às 18h36

“Nessa eu não toco, então fico mais tranquila só para cantar”, comenta Luiza Pereira no apertado, porém adequado estúdio em que o Inky costuma trabalhar, na casa do guitarrista da banda, Stephan Feitsma, na Zona Sul de São Paulo. Esta semana, o quarteto ensaiou exaustivamente as músicas do novo disco, Animania, para o show deste sábado, 27, na capital paulista, no Centro Cultural São Paulo.

A princípio, o comentário de Luiza soou óbvio, mas o gesto da vocalista de deixar o teclado de lado diz muito sobre o atual estágio do Inky. Animania, recém-lançado, é orgânico e construído pelos atrevidos riffs de guitarra, o baixo sempre pulsante e batidas dinâmicas, deixando os sintetizadores – antes principal condutor das músicas da banda – na camada sonora mais superficial. É o lado mais humano – ou animal – do quarteto paulistano.

Desde que lançou Primal Swag, em 2014, a banda tocou em todos os lugares possíveis – incluindo o prestigiado festival catalão Primavera Sound –, trocou de baterista – Luccas Villela agora ocupa o posto –, gravou e soltou digitalmente o segundo disco da carreira. Se na estreia o Inky soou demasiadamente experimental, eletrônico e irresoluto, agora o quarteto se conhece com mais propriedade e parece saber exatamente onde quer chegar.

“Fazemos o oposto da canção”, tenta explicar Luiza, referindo-se ao processo criativo da banda, baseado em jams que acabam reduzidas às faixas finalizadas. “É um riff, que vira uma base, sobre a qual eu coloco um synth e depois aquilo vai ganhar uma letra e realmente virar uma canção. Mas, desta vez, queríamos que este disco fosse ‘mais canção’, ter letras que expressassem isso, mais refrães.”

O baixista, Guilherme Silva, lembra que o Inky “começou como uma banda de música eletrônica”. “Aos poucos fomos miando do eletrônico”, acrescenta. Nos shows do primeiro disco, o grupo chegou a usar sons programados e metrônomo para controlar as batidas. “Era uma indução da performance ao vivo com base no eletrônico”, comenta Villela. “E o Primal Swag tinha uma pegada de repetição de beat muito forte. É meio acrescentar camadas.”

Villela, a propósito, é um dos pontos elementares no processo de “animalização” do Inky. “Venho de uma outra escola, então esse lance de repetição não é nem um pouco minha cara, nem um pouco meu estilo”, confessa o baterista, que, quando entrou no grupo, há cerca de um ano, foi cooptado a tocar com o click, prática que ele detestava. “Era horrível”, diz. “Hoje já internalizei, mas no começo era muito difícil.”

Quase como uma resposta às “amarras” das batidas do primeiro trabalho, Villela adicionou dinamismo e vigor à seção rítmica do quarteto – a qual também foi incrementada pela curiosa influência do Talking Heads. Os integrantes redescobriram o clássico disco Remain in Light (1980) – a incursão dançante e balançada do grupo de David Byrne, com produção do lendário Brian Eno – e acabaram levando a experiência para os estúdios da Red Bull, em São Paulo, onde Animania foi gravado.

“Temos a mania de apelidar as músicas quando estão sendo feitas com nomes de bandas e colocamos alguma como Talking Heads”, conta Silva. “Eu só conhecia ‘Psycho Killer’ e, em algum momento, falamos: ‘Vamos ouvir Taking Heads’. A primeira coisa que vimos foi o vídeo de uma performance deles em Roma, em 1980, com um monte de gente em cima do palco. Era a perfeita fusão de rock com música africana, o que a gente estava precisando ouvir na época. Quando ouvimos esse disco, ficamos em choque”. “David Byrne é o swag do branquelo”, brinca Luiza.

Neste contexto, a escolha de Guilherme Kastrup – que, entre outros projetos, comandou o já clássico álbum A Mulher do Fim do Mundo (2015), de Elza Soares – como produtor faz ainda mais sentido. “Sabíamos que ele era a pessoa [certa]”, revela a vocalista. “Ele é mestre dessa parte rítmica: percussão, bateria, grooves. No Primal Swag, soamos ao vivo, não tem nada adicional. Neste disco, queríamos colocar tudo que tivéssemos direito. E o Kastrup foi perfeito.”

O encontro com um dos ícones do “samba sujo” paulistano pode ser notado claramente em “In the Middle of a Rising”, faixa derradeira de Animania, mas também aparece nas imperfeições sonoras e ruídos das músicas. “Todo chiado que você ouve é dele”, aponta Silva. “E ele tem uma mania de o primeiro take de tudo ser o que vale”. Villela acrescenta: “Só depois ele entendeu que não funcionamos assim”. “Ele se apegava ao erro”, lembra Luiza. “Dizia: ‘Ah, mas é bonitinho, é sincero’. E eu respondia: ‘Mas não pode ser assim’. E algumas coisas acabei deixando.”

Além de Kastrup, a cena musical de São Paulo é representada na faixa “Devil’s Mark”, segunda do disco, com participação do Bixiga 70, que preenche com metais a canção. O coletivo é um dos convidados a participar do show do grupo este sábado, 27, assim como o Far From Alaska, cujos integrantes são amigos do Inky. Outra adição de Animania é o quarteto de cordas, que tocou na balada sombria “The Rarest Good”.

Depois de três performances – entrosadas, ainda que com os integrantes avidamente concentrados – no ensaio do grupo, Silva pediu minha opinião sobre os novos sons do Inky. Quando subir ao palco do Centro Cultural São Paulo, o quarteto vai mostrar como se desprendeu das referências e certezas de dois anos atrás, levando ao estado mais visceral e agressivo o “rock eletrônico” que lhe é característico. O Inky afrouxou a gravata, tirou a camisa de dentro da calça e está dançando desajeitado. É o swag do branquelo.

Lançamento de Animania em São Paulo

27 de agosto (sábado), às 19h

Centro Cultural São Paulo | Rua Vergueiro, 1000, Liberdade, São Paulo

Ingressos: R$ 20 (há meia-entrada)

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