No Cultura Inglesa Festival, a banda escocesa tropeçou na falta de entrosamento entre os integrantes; antes disso, o grupo Los Campesinos! mostrou alegria ao tocar no Brasil
Lucas Brêda Publicado em 26/05/2014, às 09h12 - Atualizado em 27/05/2014, às 18h28
A chuva que castigou a cidade de São Paulo neste domingo, 25, não poupou a 18ª edição do Cultura Inglesa Festival, realizado novamente no Memorial da América Latina, na região da Barra Funda. Poucas pessoas encararam o clima ruim durante a tarde para ver as atrações brasileiras, Monique Maion, com covers de Amy Winehouse, e as bandas formadas por alunos e funcionários da Cultura Inglesa, Voliere e Staff Only. Já quando o relógio se aproximou das 18h, e os galeses do Los Campesinos! deram início à apresentação, os espaços próximos ao palco já pareciam bem preenchidos.
Em 2013, o festival Cultura Inglesa trouxe Magic Numbers e Kate Nash. Relembre como foi.
A banda europeia apresentou um pop rock animado, mas pouco criativo, que se encaixa perfeitamente na alcunha de indie festivo. Com o frontman Gareth Campesinos! muito entusiasmado, mas de voz oscilante, o grupo deixou claro que tocar no Brasil foi um dos pontos altos na carreira de oito anos e cinco álbuns.
E, de fato, o passeio em terras brasileiras, que ainda rendeu uma passada no estádio do Morumbi para assistir à partida entre São Paulo e Grêmio, no dia anterior, parece ter sido mais marcante para o próprio Los Campesinos! do que para o público do Cultura Inglesa Festival, pouco interessado na empolgação dos galeses.
The Jesus and Mary Chain
Quando já passava das 19h30, a chuva abriu espaço para a entrada do Jesus and Mary Chain, anunciada por Gaía Passarelli, ex-VJ da MTV. Algumas cópias do clássico e primeiro álbum da banda escocesa, Psychocandy, eram erguidos por alguns fãs, enquanto outros traziam a marca do grupo estampadas nas camisetas. Aos poucos, as capas de chuva eram deixadas de lado, e “Snakedriver” já era entoada pelo vocalista Jim Reid. Uma entrada sem muito alarde ou celebração, seguida por “Head On” – essa sim, bem recebida e devidamente cantada pelo público.
Reid se mostrou, à primeira impressão, um frontman tímido e pouco habituado ao palco nos últimos anos, algo compreensível devido às turnês esporádicas do grupo. Alternando goles de cerveja entre as partes vocais, ele permanecia contido; enquanto se apoiava no pedestal do microfone e passava a mão na testa, parecia nervoso, mas não perdia a firmeza ao cantar.
A falta de intimidade com o palco nos últimos meses (o The Jesus and Mary Chain ficou cerca de um ano sem fazer shows) criou também um clima de ensaio entre os irmãos Reid (Jim e o guitarrista, William) e os outros três integrantes. Frequentemente o vocalista adiou o início das canções para “pedir o tom” ao irmão, e no meio de “Sidewalking”, ele fez a primeira paralisação da apresentação. Acusando algum erro no andamento da canção, o frontman fez com que a banda parasse e recomeçasse a música logo em seguida. A plateia pode não ter ligado muito, mas as interrupções – a partir dali, constantes – quebraram o ritmo do show.
Mesmo com o clima morno (e com guitarrista William recebendo olhares desconfiados dos companheiros), o show se manteve agradável com a força de um repertório que visita aleatoriamente os quatro primeiros discos do grupo. Músicas como “Far Gone and Out” e “Between Planets” puseram a cantarolar a parcela do grupo que parecia ter entre 30 e 40 anos, maioria ali. Conforme a apresentação seguia, Reid ficava mais confortável – distribuiu até beijinhos revestidos de carisma britânico.
O Jesus and Mary Chain, conhecido por tocar em um volume ensurdecedor, também não chegou a “incomodar” os ouvidos dos paulistanos. Pelo menos não de quem assistia a uma distância média (gente que estava à frente do palco afirmou que ali o som estava bem alto). As distorções e microfonias soaram comportadas em relação ao barulho bem guiado que fez do grupo uma das bandas mais influentes na década de 1980 e na seguinte.
Entrevista: Jesus and Mary Chain volta ao Brasil após seis anos, mas não faz grandes planos.
Com “Some Candy Talking”, as gotas de chuva voltaram a perturbar o público, e Reid logo disse: “Felizes quando chove?”, e puxou o hit “Happy When It Rains”, tirando o blazer (revelando uma camiseta de Loaded, disco do The Velvet Underground), e criando um momento de magia para a plateia. A partir de então, voltava a chover. E estava todo mundo contente.
Após interromper e recomeçar a canção seguinte, “Halfway to Crazy”, e fazer o mesmo com “Just Like Honey”, um dos maiores hits do Jesus and Mary Chain, o vocalista criou um anticlímax, deixando a sensação de que as faixas poderiam ter sido mais intensas sem as paradas. Em “Just Like Honey”, ele chamou uma moça ao microfone para contribuir com os backing vocals (quase inaudíveis) e passou a música inteira com as mãos nos ouvidos, incomodado com a falta (ou excesso) de retorno. A plateia pouco percebeu, e cantou a música como se estivéssemos em 1985.
“Se vocês quiserem mais, já sabem o que fazer”, disse Reid, rapidamente ao fim da música, sugerindo que a banda voltaria para um bis. O clima de anos 1980 seguiu com “The Hardest Walk” e “Taste of Cindy”, e deu lugar a “Reverence”, derradeira e mais empolgante canção do show. O espaço para improvisações de bateria e guitarra, até então limitado, surgiu na faixa de Honey's Dead (1992). Embora contido, Reid cantou com vigor os versos: “I wanna die just like Jesus Christ” (“Eu quero morrer como Jesus Cristo”).
Alguns minutos depois das 20h30, uma apresentação conturbada e até morna na maior parte do tempo, ganhou um encerramento grandioso, fazendo valer não o ingresso (já que o festival foi gratuito), mas a batalha contra uma chuva insistente em um fim de tarde e início de noite preguiçoso de domingo. A falta de entrosamento e de decibéis atrapalhou, mas não impediu que grandes canções agradassem e tornassem a volta encharcada para casa mais feliz.
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