Recém-saída do Pixies, ela liderou o Breeders na apresentação da íntegra do álbum lançado em 1993
Pablo Miyazawa Publicado em 25/07/2013, às 14h13 - Atualizado às 14h43
“É o aniversário de 20 anos de Last Splash.” Todos ali presentes sabiam, mas Kim Deal fez questão de anunciar, em português arrastado e um sorriso sincero, o motivo para a terceira visita do The Breeders ao Brasil.
Lançado no último dia de agosto de 1993, durante os últimos suspiros do auge da era grunge/alternativa (In Utero, do Nirvana, sairia duas semanas depois), Last Splash é um típico produto de sua época. Ousou na estranheza e se superou na doçura, alavancado por um single deliciosamente bizarro – a eterna “Cannonball” – e apoiado pelo irresistível apelo de uma dupla de gêmeas de sorriso fácil na comissão de frente. Tivesse sido lançado um ano depois, em meio à ressaca da morte de Kurt Cobain, o álbum dificilmente teria o mesmo impacto e, por consequência, nem mereceria tal tributo duas décadas mais tarde.
É notável como a maior parte das 15 faixas pouco funciona fora de contexto. Há aquelas fáceis de cantar junto, ainda que pouco convencionais, com levadas pop e alta rotação na MTV na época – a citada “Cannonball”, “Saints”, “Divine Hammer”, “I Just Wanna Get Along”; do outro lado, há as arrastadas, etéreas, com trajetórias ilógicas, quase aleatórias – “No Aloha”, “Invisible Man”, “Roi”, “Mad Lucas”, “Hag”. Há ainda espaço para vinhetas instrumentais (“Flipside”, “S.O.S.”) e baladas com a combinação ideal de melodia e delicadeza (“Do You Love Me Now?”, “Drivin' on 9”).
Se foi a intenção do Breeders criar um clássico conceitual, não é possível afirmar. O fato é que, 20 anos depois, Last Splash funciona na íntegra e ao vivo tão bem quanto em CD. O show realizado na noite da quarta, 24, parte do evento Popload Gig (no Cine Joia, em São Paulo), seguiu a estrutura básica da turnê Last Splash XX, que a banda realiza desde março pela América do Norte e Europa. Uma a uma, as músicas de Last Splash foram tocadas com os arranjos originais, interrompidas por breves pausas para trocas de instrumentos, risadas e saudações joviais. “Tudo bem?”, Kim perguntava casualmente para o público, meio que sabendo a resposta. Há algumas semanas, ela anunciou a saída definitiva do Pixies, banda na qual conquistou status icônico e dividiu holofotes de modo pouco justo com o líder Black Francis. No Breeders ela é a inevitável dona do show, mas prefere dividir o fardo do palco com as parceiras de crime. O carisma da banda em ação – aqui na formação completa que gravou Last Splash em 1993 – torna a experiência ainda mais singular e interessante.
Gêmea idêntica de Kim, a guitarrista Kelley contrasta o sorriso iluminado com a responsabilidade de criar as sonoridades mais cáusticas. Ao lado dela, a baixista Josephine Wiggs se esforça para manter a postura blasé calculada, mas deixando escapar sorrisos discretos. Bendito entre as mulheres, o baterista Jim Macpherson se esconde nas sombras, querendo não comprometer. A violinista Carrie Bradley brilha quando lhe é permitido – o belo solo em “Drivin' on 9” chega a emocionar. Líder natural, Kim comanda o ataque com magnetismo, um misto adorável de graça espontânea e desleixo simpático, com a doçura da voz pouco comprometida pela passagem do tempo. Quando algum provocador da plateia começou a cantar alto o monólogo de abertura de “Hey”, hit do Pixies, a multidão se apressou a exigir silêncio. Não pegava bem constranger a dona da festa naquele momento. A noite permitia espaço a apenas uma sessão de nostalgia, e ela era destinada ao Breeders.
As duas entradas de bis trouxeram os tradicionais covers - “Happiness is a Warm Gun” (“we know a Beatles song!”, exclamou Kim) e “Shocker in Gloomtown” (do Guided by Voices) – e músicas do primeiro álbum, Pod (1990), e do EP Safari (1992), ambos do tempo em que Tanya Donelly ainda fazia parte da formação (ela deixou o Breeders para montar o hoje extinto Belly). A suingada “Hellbound” finalizou o show sem clímax, mas da maneira como tudo começou: com múltiplos e largos sorrisos – os genuínos de cima do palco refletindo os espontâneos da plateia.
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