Segundo disco da banda, lançado nesta sexta-feira, 22, acaricia corações machucados com bejinhos e calma
Pedro Antunes Publicado em 22/03/2019, às 10h31
O ombro do melhor amigo, que não se importa se as lágrimas molharem-lhe a roupa. O colo de mãe, com cafuné macio, em silêncio. O abraço demorado num reencontro com amor que há muito, por circunstâncias diversas e imutáveis, já não é mais seu. O beijo do seu amor (esse sim, seu), após uma longa ausência da cidade.
Há melancolia, há saudade, há compreensão, há paciência e a falta dela, tudo isso encaixotado por Liniker e os Caramelos em 13 músicas prontas para serem levadas para viagem, para lidar com sentimentos por vezes similares e, principalmente, confortá-los. Assim chega Goela Abaixo, o segundo disco da trupe de Araraquara, lançado nesta sexta-feira, 22, e realizado com o auxílio do edital Natura Musical.
Enquanto o primeiro álbum de Liniker e os Caramelows, chamado Remonta, de 2016, era uma caixinha de cartas nunca entregues, escritas de Lini para si mesma, nos dias e noites quentes demais da cidade do interior de São Paulo quando ainda tinha 16 anos - e, por isso mesmo, continham trazia uma urgência danada, um imediatismo rasgante. "Deixa eu bagunçar você", propunha, pedia ou implorava Liniker em "Zero", música de Cru e Remonta.
Goela Abaixo nasce de um outro momento. Tudo mudou bastante para Liniker, hoje aos 23 anos, e a banda, Rafael Barone (baixo), Pericles Zuanon (bateria), William Zaharanszki (guitarra), Renata Éssis (backing vocal), Marja Lenski (percussão), Fernando TRZ (teclados) e Éder Araújo (saxofone).
Apontados como promissores quatro anos atrás, com canções shows emotivos e músicas como "Zero", gravadas de forma caseirona e transformadas no EP Cru, eles caminharam para o refinamento quando, em 2016, lançaram Remonta, produzido por Marcio Arantes e gravado no excelente Red Bull Station, em São Paulo.
A partir daí, Liniker e os Caramelows caíram no mundo. Visitaram 20 países em turnês e ficaram mais distantes de casa do que jamais haviam experimentado - possivelmente, também sem essa intensidade toda.
Saudade. Esse é um bom ponto de partida para entender Goela Abaixo, o disco "das coisas que precisavam ser ditas", como brincou Liniker, em entrevista à Rolling Stone Brasil. Há muito o que dizer sobre saudade, sentimento incontrolável (não são todos incontroláveis?), mas o mais ambíguo deles - pode ser bom ou ruim, leve ou um fardo, doce ou azeda.
Goela Abaixo invariavelmente nasce da distância daquele lugar que se entende por lar, seja ele uma casa, um apartamento, um bairro, uma cidade, ou alguém, amigo ou amante. O disco foi gravado em diferentes partes do mundo. De Berlim ("Beau" e "Calmô") e Lisboa ("Amarela Peixão") a São Paulo, Botucatu, Araraquara e Rio de Janeiro. O que também ajuda a transformar Goela Abaixo num disco de saudade.
É também deliberadamente apaixonado. Como uma inserção falada de Liniker em "Goela", a última do disco: "Gostar de alguém é meio assim mesmo. Dói um pouquinho adormece a boca, embriaga, é tipo jambu, né, me faz tremer".
Grooveado, o disco é feito para dançar com calma, com passinhos modestos para o lados - manter os olhos fechados é opcional, mas altissimamente recomendado. Um disco que se deita, esteticamente, no meio termo entre os dois singles lançados previamente. Entre a explosão de "Lava", o primeiro deles, e "Calmô", o segundo - uma música antiga de Liniker e os Caramelows, nunca antes gravada, mas hipnótica em shows e uma das mais pedidas pelos fãs da banda.
Nos aspectos de produção, o disco também é um híbrido. Há algo de caseiro, como foi com o EP Cru, e cristalino, algo que veio com Remonta. "Tínhamos essa vontade de fazer o disco soar assim", conta Rafael Barone, baixista e produtor do álbum. Ele, aliás, divide a tarefa em "Lava" (com Maurício Fleury), "Bem Bom" (Mahmundi) e "Gota" (Caê Rolfsen).
"Cru era aquela coisa crua", diverte-se o músico. "Inclusive, existem várias questões naquele disco que eu faria diferente hoje. Já Remonta foi super bem produzido, limpíssimo, com muitas edições. Eu queria dar um passinho para trás, sem voltar tudo. Que tivéssemos um 'play' de banda real."
Goela Abaixo tem duas partes, lado A e lado B, sendo a segunda parte, menos explosiva, ganhar tons dramáticos, entre os versos cantados por Liniker e o piano comandado por Fernando TRZ.
Suas canções também foram escritas nas distâncias que a vida nos impõe. O texto de Goela, já citado aqui, foi criado no hall de um hotel em Paris, durante a turnê de junho de 2017. "Aprendi, com essas viagens para o interior e para o exterior que gosto de viajar pra poder voltar", conta Liniker.
É preciso avisar, contudo, que Goela Abaixo arde também. Desde o primeiro segundo de "Brechoque", canção escolhida para abrir o disco. Ouvi dizer que colocaram meu amor numa estante de brechó / Passe de lá e pegue ele pra mim / Borde, pinte, reinvente como tudo que você já faz", anuncia a cantora.
É uma introdução breve, de pouco mais de um minuto de duração, que fala do amor que será apresentado depois. Usado, deixado num brechó, para ser usado e levado por outro alguém, como o cíclico momento de amar e desamar.
Aos poucos, a cada audição, Goela Abaixo vai acrescentando ardência. São versinhos pontuais que jorram sentimentos. "De Ontem", quarta do disco, é ótima nisso.
"De ontem, quando cê abriu a porta do elevador da casa sua / Foi como se eu estivesse nua e inteira, camuflada nas retinas do teu olhar / Coisa de bicho, olhos de lua e a sua íris crua na memória fotográfica / Que não me pesa guardar para lembrar naquele depois / Que eu fico comigo", canta Liniker.
Na sequência, na mesma faixa, vem o xeque-mate para corações feridos e ainda não-curados por amores confusos. "Teu porteiro me trata íntima, já não me acha visita / Tenho rubros sinhas de sossego que explodem dos dedos / A cada sete que eu aperto de perto."
Em "Boca", ela canta: "E na boca, aqui dentro de mim tudo buzina. / Eu acordo de manhã faxinando o coração que atravessa a esquina / Rumo à padaria dos meus sonhos que serve aquele detóx / E o garçom de rosa choque, sorri como quem já te beijou".
O que Liniker faz aqui, em excelência, é uma grande reflexão sobre o amor nos tempos do ódio, do receio, da superficialidade, dos apps, dos chats, dos nudes. O faz com intensidade de quem sente isso na pele, no peito e na boca.
Goela Abaixo também tem seu sentido ao pé da expressão. De dizer o que precisa ser dito, ouvido, assimilado. "Então", diz Liniker em "Textão", música declamada, só com voz, "queria te pedir uma coisa: não se trepa em 15 minutos." Aqui, não há distração, é a mensagem de Liniker o que importa.
"Pois até as 3h, tem papo de vinho e seda. É para tocar. Não se trepa em 15 minutos porque a expectativa muitas vezes não se cria só. Antes que ela aconteça, tem cnoro na cama, tem troca de pijama, tem olho enquanto eu passo café me chama, declama, derrama malandramente o caule, o broto, o estopo de ser e estar. Não se trepa em 15 minutos. Não foge, no susto, pedala, se dói, te cutuco. Se atropela, me morde no muco", ela segue em "Textão".
Ali está o contraponto das canções mais apaixonadas, o outro lado, a decepção. "Às vezes, as pessoas precisam de um textão desses. Eu acho que as pessoas tem uma construção da minha identidade como se eu fosse um anjo. Não se trepa em 15 minutos. Cansei de foda rasa, de gente irresponsável".
Como disse Thiago Pethit, ao lançar seu disco Mal dos Trópicos (Ascensão e Queda do Orfeu da Consolação): "O amor é o que nos torna humanos. O desamor também."
Intenso, Goela Abaixo ama de todas as formas. Sente em todos os tempos, no passado, presente, futuro. Porque machuca, muitas vezes, é verdade, mas também pode ser pleno, leve e lindo.
"É um disco sobre busca, entender nós mesmos no mundo e o lugar que queremos estar", diz Liniker. "Estamos crescendo, em ascensão constante, lançando um segundo disco, mas cada um de nós sabe o ponto de ônibus que tem que descer para chegar em casa."
O show de estreia de Goela Abaixo será neste sábado, 23, no Cine Joia. Mais informações aqui.
Ouça Goela Abaixo, novo disco de Liniker e os Caramelows:
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