Los Hermanos tem público de Paul McCartney e quebra recorde em despedida em São Paulo

Banda fez a última apresentação da turnê de 2019 na noite de sábado, 18, no Allianz Parque

Pedro Antunes

Publicado em 19/05/2019, às 10h56
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- Rodrigo Amarante, dos Los Hermanos, se joga nos braços do público (Foto: Breno Galtier / Divulgação)

É bom falar isso logo: não existe banda maior no Brasil do que os Los Hermanos. É claro, as turnês esporádicas ajudam a manter a mística em torno do quarteto original formado por Marcelo Camelo, Rodrigo Amarante, Bruno Medina e Rodrigo Barba, mas qual outro ato é capaz de encher estádios no Brasil com guitarras penduradas no pescoço, mesmo 14 anos sem lançar um disco inédito?

Neste sábado, 18, Camelo, Amarante, Medina e Barba se despediram de mais uma turnê de reunião, a maior delas, cheia de superlativos, com uma apresentação no Allianz Parque, em São Paulo, com 27 músicas e duas horas de duração. 

Antes disso, passaram por arenas e estádios, quebraram um recorde de público seguido do outro. No Maracanã, no dia 4 de maio, tocaram para 43 mil pessoas. Recorde. Em São Paulo, foram 45 mil. Novo recorde histórico - foi a mesma quantidade de gente que, por exemplo, lotou o estádio para assistir Paul McCartney.

Percebam: os Los Hermanos atingiram, numericamente, um patamar de Paul McCartney nas turnês pelo Brasil, que, na última passagem pelo mesmo estádio, também reuniu 45 mil pessoas. 

Em 2007 os Hermanos anunciaram uma pausa por um período de tempo indeterminado. Deixaram como legado de quatro discos de estúdio (Los Hermanos, 1999, Bloco do Eu Sozinho, 2001, Ventura, 2003, e 4, 2005) e e dois álbuns ao vivo (Ao Vivo no Cine Íris, de 2004, e Na Fundição Progresso, gravado em 2007 e lançado em 2008).

Desde então, reúnem-se em turnês esporádicas. Em 2009, em uma noite incrível, abriram para o Radiohead e Kraftwerk. Em 2010, fizeram mais alguns shows, aqui e ali, inclusive passando pelo festival SWU. O mesmo se repetiu em 2012, em 2015 e, agora, em 2019.

Mas há algo de especial nesta última turnê, encerrada no sábado, 18. E isso vai além do lançamento de "Corre Corre", a primeira música inédita dos rapazes desde o disco 4, e do público massivo em cada uma das apresentações. Tem mais a ver com entendimento, deles, como banda, e do público, assumidamente entregue.

Foram anos de algumas negações. Os Hermanos, por exemplo, deixaram de tocar Anna Júlia, canção executada como nunca em 1999 e responsável por colocá-los no auge - e ai de quem citasse a música que chegou a ser regravada pelo beatle George Harrison. O mito "Los Hermanos não gostam de Anna Júlia" obviamente já caiu por terra e é destroçado por versões ao vivo poderosíssimas - no Allianz Parque foi de chorar, de fato, ouvir o coro.

Também houve um tempo no qual gostar de Los Hermanos era motivo de chacota. Tudo bobagem. É ouvir "Corre Corre", a mais nova da banda, e perceber quantas bandas indies brasileiras adoradíssimas e na crista do hype aprenderam direta ou indiretamente com os Hermanos.

Agora, parece existir uma comunhão maior, entre banda, público, história e repertório. Os Los Hermanos têm mais tempo "em pausa" do que em atividade, veja só. Mas parecem entender que há muito o que festejar, afinal.

No show, Ventura é o mais celebrado. São dez canções vindas do disco. É seguido por 4 e Los Hermanos (com seis músicas tocadas de cada um) e, por fim, pelo Bloco do Eu Sozinho (com quatro).

O público dos Los Hermanos é conhecido por cantar mais alto que a própria banda. A estrutura de som do Allianz, contudo, foi capaz de fazer com que Amarante e Camelo, revezando-se nos vocais, fossem mais ouvidos do que as 45 mil vozes do lado de cá.

Vale destacar também o palco, em si, assinado por Batman Zavareze. As cores, as luzes e os telões que se moviam, com imagens sobrepostas, eram lindos de se ver, ao longo de duas horas de show e 27 músicas.

Na narrativa escolhida pelos Hermanos, o início se dá com "A Flor" e é encerrada por
"Pierrot", duas canções icônicas no repertório do grupo. É o amor juvenil, pós-adolescente, mas ainda assim entregue demais. Tem hormônios, corações dilacerados e desespero.

A cada ano que passa, esse tipo amor fica mais distante dos agora quarentões Hermanos, assim como de cada fã das antigas. Canções sobre esse amor funcionavam antes porque era o tipo de amor que se conhecia na época. Funcionam agora justamente pelo motivo contrário. É um sentimento tão inocente, delicado, que emociona. Como eles mostraram na nova "Corre Corre", gravada em março de 2019, o tempo endurece os corações, as cicatrizes criam uma proteção no coraçãozinho machucado e o sentimento, quando brota, é outro, menos urgente.

Todos esses sentimentos se costuram bem ao vivo. Às vezes, mudamos de perspectiva. Se antes, em "O Velho e o Moço", era mais fácil se identificar com o personagem mais jovem da canção de Amarante, agora entendemos melhor o mais velho deles. É bonito perceber a transformação, deles e nossa também.

De uma bandinha de hardcore que falava de amor e tocava para pouquíssimas pessoas, normalmente amigos e colegas da PUC-Rio, até ao status de bandão capaz lotar um estádio foi um longo caminho. Novos e antigos fãs se misturam agora porque aquilo que os Los Hermanos toca é um sentimento universal. Tratam do amor de forma ora direta, ora rebuscada, mas sempre entregue. E isso não envelhece, mesmo que os fios de cabelos brancos estejam mais visíveis e a cabeleira, mais rala, digam o contrário.

Confira, abaixo, o setlist do show: 

"A flor"
"Além do que se vê"
"Retrato pra Iaiá"
"O vencedor"
"O vento"
"Todo carnaval tem seu fim"
"Condicional"
"Corre Corre"
"Primeiro andar"
"A outra"
"Morena"
"Pois é"
"Sentimental"
"Samba a Dois"
"Tenha dó"
"Quem sabe"
"Descoberta"
"Anna Júlia"
"O velho e o moço"
"Paquetá"
"Do sétimo andar"
"Último romance"
"De onde vem a calma"
"Conversa de botas batidas"

Bis:
"Deixa o verão"
"Azedume"
"Pierrot"

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