Artista lançou, em 2018, o projeto multimídia Amar É Para os Fortes, com um disco e um filme, e volta a São Paulo para três shows (um gratuito)
Nicolle Cabral Publicado em 27/04/2019, às 15h00
“Tragam um vasilhame para encher de liberdade, de cumplicidade. Tragam um vasilhame para encher de força", diz o poeta Zizo (interpretado por Irandhir Santos) nas caóticas ruas do Recife em Febre de Rato, longa-metragem dirigido pelo pernambucano Cláudio Assis.
Uma hora e cinquenta minutos depois diante do filme, Marcelo D2 teve o primeiro vislumbre da sua obra transmídia, Amar é Para os Fortes, lançada em 2018.
Composta por um disco e um filme de mesmo nome, ela mostra como o artista foi capaz de transcender o conceito maniqueísta do bem e do mal e criar uma interseção própria. Amar É Para os Fortes ressalta a desorganização da metrópole, a polícia, o medo, o mau cheiro da cidade, é claro, mas também deixa a arte, o amor, o respeito e a liberdade sobressaíram dentro desse caos.
Foi a partir disso que floresceu a sua décima obra, contabilizados os trabalhos solo e a trajetória com o Planet Hemp. Ao todo, 40 pessoas participaram do novo projeto. "Foi o meu disco mais coletivo de todos, eu fui pegando quem estava em volta de mim", conta.
D2 sempre foi um aspirante do audiovisual. No disco anterior, Nada pode me Parar (2013), o rapper produziu um vídeo para cada música. Dessa vez, inspirado por referências artísticas, decidiu levar a sério a ideia de criar um projeto audiovisual íntegro.
"Talvez tenha sido mais difícil do que fazer o meu primeiro disco", brinca, ou não, o artista. "Teve um momento que eu duvidei, achei que não ia conseguir fazer, que não ia ficar bom. Mas quando ficou pronto, eu amei ver o que virou".
Febre de Rato de Cláudio Assis está na espinha dorsal do projeto. Não é por acaso que a música quase homônima, "Febre do Rato", foi a primeira a ser criada pelo rapper. Nela, expõe a sua frente de batalha, dentro da loucura da rua e da violência, no intuito de, no fim, ver a arte como esperança da periferia.
"Às vezes, nada dá liga, amigo Zizo dizia, cachaça e rapariga essas horas é poesia", assim como citado nos versos do D2, o personagem de Assis acredita que a poesia é capaz de embriagar e é necessária para provocar uma reação: "Não há mal maior quando o mundo não precisa de amor. (...) Tome poesia para esse mundo!", recita o poeta.
O álbum-visual de Marcelo D2, disponível exclusivamente na Apple Music, é uma crônica do Rio de Janeiro, na qual Stephan Peixoto, o filho mais velho de D2, é o protagonista da obra e interpreta Sinistro, um jovem da periferia que tem a sua crew, que eles chamam de "Mulato". O coletivo tem a ideia resistir à violência e mostra a trajetória do personagem para se aproximar da arte e o encontro de um amor. Bem mais potente que a narrativa do amor romântico, D2 evidência o amor fraterno, suas raízes e a união pela arte.
Sempre que possível, o longa criado e dirigido por ele retoma a ligação com o seu cordão umbilical. Com a tela em preto e branco, entre as canções "Alto da Colina" e "Febre de Rato", Sinistro aparece em plongée, como boa parte das cenas do longa, olhando para a janela de uma casa em que alguém assiste a cena de Febre de Rato no instante em que o personagem de Assis se expõe: "As pessoas ficam falando em futuro, em mudança... Mas não tão nem aí para o que realmente tá mudando. Perderam a capacidade de espernear pras coisas mudarem. Desaprenderam."
Lançado às vésperas das eleições para presidência do País, o disco passeou pelas ruas da Lapa, do Centro, Glória e do Catete no Rio de Janeiro e nasceu de uma gestação em que se efervescia o ódio, a intolerância, o assassinato de Marielle Franco, que inclusive, é lembrada no filme Amar é Para os Fortes com a placa "Marielle Presente" e no disco, e faixa "Resistência Cultural".
Além disso, emergiu entre a presença ativa de Marcelo nas redes sociais manifestando suas indignações durante a campanha. "Caraca, que momento para lançar o disco, né? Teve um instante em que eu abandonei as coisas para ficar discutindo política, foi foda", comenta D2.
Sendo essa então, a premissa maior, amar é realmente para os fortes. A transição dessa atmosfera dentro do disco ressoa pelo chamado da "Parte 2}", que é quando chega ao microfone os versos esperançosos embasados na união, na luta e na fé.
O disco contou as participações de Sant, Orochi, Seu Jorge, Anna Majdison, Rodrigo Amarante, Gilberto Gil, Danilo Caymmi, Alice Caymmi e Rincon Sapiência.
Marcelo goza de 25 anos de carreira, com o título dos maiores expoentes do rap nacional, e responsável por estilizar o gênero ao inserir, durante todos esses anos, uma de suas paixões: o samba. "Eu tava um pouco cansado do que eu já vinha fazendo. A ideia de fazer um projeto totalmente diferente, me acendeu uma chama de novo. Trabalhei com paixão e vontade. O disco é isso, não tive como fugir."
Mesmo não sendo religioso, o cantor encerrou o seu disco com um afro-samba, "Filho de Obá", em homenagem a um orixá feminino muito cultuado nas religiões de matrizes africanas e lembrada pela sua grande força.
Em Amar é Para os Fortes, Marcelo D2 conseguiu transpor para os palcos toda a idealização do seu projeto. A partir deste domingo, 28, D2 inicia um circuito Sesc na capital paulista. Abrindo a agenda do artista, ele se apresenta gratuitamente no Sesc Itaquera, às 15h30, no domingo, 28. Nos dias 2 e 3 de maio, retorna a São Paulo e traz a sua ópera-rap para o Sesc Pompeia às 21h30.
Os shows, enfim, estendem a obra e se revelam como o vasilhame do artista que está ali, exposto, para enchermos de força.
Pantera Negra 3 será um dos últimos filmes antes da aposentadoria, diz Denzel Washington
Spotify lança podcast afrofuturista que mistura histórias de ficção com entrevistas
Keke Palmer afirma que Ryan Murphy a "destruiu" durante as filmagens de Scream Queens
Oasis no Brasil: Entenda o que é o Fan Ticket anunciado pela banda
Guitarrista mais rápido da história é homenageado com estátua de bronze; veja
Dwayne Johnson está aberto a filmes 'mais profundos': 'Eu evoluí'