Mesmo com problemas no som, ex-vocalista do Smiths investiu em repertório de todas as suas fases e conquistou o público no Espaço das Américas neste domingo, 11
Bruno Raphael Publicado em 12/03/2012, às 01h28 - Atualizado às 14h08
O cantor Morrissey fez o seu terceiro e último show no Brasil neste domingo, 11, repetindo o mesmo set list de suas apresentações anteriores no país. Foram 19 músicas - seis delas de sua antiga banda, o Smiths - executadas para cerca de 8 mil pessoas, que esgotaram todos os ingressos no Espaço das Américas, em São Paulo.
Antes da apresentação do músico britânico, a cantora Kristeen Young foi a responsável por entreter a plateia. Com um show teatral e que remete muito à islandesa Björk, Kristeen baseou seu repertório de pouco mais de meia hora em V the Volcanic, EP lançado no início de 2011. Ela foi bem recebida pelo público, que, porém, voltou a gritar o nome de Morrissey após a apresentação, quando videoclipes de outros artistas como Nico, Brigitte Bardot e New York Dolls eram exibidos no telão.
O telão desapareceu pouco depois das 21h, quando um Morrissey trajado da tradicional camisa com quase todos os botões abertos e um crucifixo no peito, abriu com "First of the Gang to Die". "Agora que vocês me acharam, como poderiam me deixar?", disse o ex-Smiths, com a carismática petulância que marcaria suas intervenções durante as músicas nesta noite. Uniformizados, os integrantes de sua banda usavam as camiseta "Assad Is Shit" - uma crítica ácida ao presidente da Síria, Bashar al-Assad, cuja repressão aos seus opositores deixou cerca de 90 mortos no último sábado, 10.
A acústica do Espaço das Américas não favoreceu o show, cujo som ficou embolado a maior parte do tempo. O impacto da abertura das canções que vieram a seguir, como "You Have Killed Me", "Black Cloud" e "When I Last Spoke to Carol" foi quebrado por uma inconstância sonora que atingia até a área mais próxima ao palco. Os telões laterais, desligados, também não ajudavam os fãs que pagaram até R$ 200 na pista comum para ver o britânico após 12 anos longe do Brasil.
"Alma Matters", da fase noventista de Morrissey, precedeu "Still Ill", a primeira do Smiths executada na noite. O público, ensandecido, teve em seguida "Everyday Is Like Sunday", cantada em um domingo tipicamente britânico na capital paulista, repleto de chuva e nublado. Os fãs, com os cabelos molhados de suor, pulavam e balançavam as mãos ao som de um Morrissey simpático, que brincou diversas vezes com o público.
"Speedway", com uma pausa no meio da canção para um verso à capela de Morrissey, foi o primeiro grande momento intimista da noite, dando lugar a "You're the One for Me, Fatty" e a épica "I Will See You in Far-Off Places", uma das melhores músicas do cantor no disco Ringleader of the Tormentors (2005).
Momento de "colocar a mão na consciência", o hino vegan "Meat Is Murder" deixou o Espaço das Américas em silêncio. No telão, eram mostrados galinhas, bois e vacas sendo cruelmente mortos. "Morte sem razão é assassinato", cantava Morrissey, que saiu de cena por instantes enquanto a banda fazia uma jam session que beirava o rock progressivo, com direito a intervenção de um gigantesco gongo instalado atrás do baterista. Como aconteceu anteriormente em sua passagem pelo Brasil, ele criticou o Príncipe Harry, que está no país. "Não, não, não", repetiu Morrissey, ao insistir que o país não desse seu dinheiro ao Reino Unido.
"Ouija Board, Ouija Board", um single obscuro dos anos 80, passou quase despercebido. O mesmo não se pode dizer de "I Know It's Over", canção do Smiths do disco The Queen Is Dead, que iniciou uma série de lágrimas por parte de alguns fãs presentes. Evocando sinceridade em cada um dos seus versos, Morrissey não ligou para a acústica do local e fez sua voz dramática ressoar por todos os cantos. Ovacionado, em "Let Me Kiss You" o britânico atirou sua camisa ao público, exibindo boa forma no auge de seus 52 anos de idade.
O ápice do show, e que deve permanecer nas lembranças dos presentes por algum tempo, foi com "There Is a Light That Never Goes Out". "Agora que já estamos um pouco mais íntimos, acho que podemos fazer isso", disse Morrissey, antes do clássico riff criado por Johnny Marr ser executado. No refrão, o britânico chegou a demonstrar surpresa com a recepção da plateia, que cantou - quase gritando - o quão celestial seria morrer ao lado de alguém num acidente com um ônibus de dois andares. "I'm Throwing My Arms Around Paris", hit mais recente, deixou os ânimos mais calmos.
"Please, Please, Please Let Me Get What I Want", executada em uma versão ainda mais minimalista do que a original, foi amplamente atrapalhada por um ruído que vinha das caixas de som do lado esquerdo do palco. Morrissey, menos carrancudo do que em outros dias, deixou de lado as reclamações e se manteve interessado em agradar - e ser agradado. Ganhou flores, presentes e, após uma rendição da clássica "How Soon Is Now", afirmou: "Estou tão feliz, não consigo ir embora", disse, com um sorriso triste. "Não sei o que fazer."
Fechando com "One Day Goodbye Will Be Farewell", Morrissey retornou ao palco com uma bandeira do Brasil enrolada na cintura, gesticulando e fazendo gracejos ao público. Inúmeros "eu amo vocês" vieram antes que um suado, esgotado e dedicado showman deixasse o palco. Doze anos não diminuíram nem um pouco o amor dos fãs pelo britânico - e vice-versa. Mas espera-se que em sua próxima vinda a infraestrutura seja digna do carisma do ídolo.
Veja abaixo o set list da apresentação:
"First of the Gang to Die"
"You Have Killed Me"
"Black Cloud"
"When Last I Spoke to Carol"
"Alma Matters"
"Still Ill" (The Smiths)
"Everyday Is Like Sunday"
"Speedway"
"You're the One for Me, Fatty"
"I Will See You in Far-Off Places"
"Meat Is Murder" (The Smiths)
"Ouija Board, Ouija Board"
"I Know It's Over" (The Smiths)
"Let Me Kiss You"
"There Is a Light That Never Goes Out" (The Smiths)
"I'm Throwing My Arms Around Paris"
"Please, Please, Please Let Me Get What I Want" (The Smiths)
"How Soon Is Now?" (The Smiths)
Bis
"One Day Goodbye Will Be Farewell"
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