Surrealista na medida certa, o filme sobre músico inglês não é professoral o bastante para gerar uma nova onda de fanatismo ou de recordes quebrados
Pedro Antunes Publicado em 02/06/2019, às 12h01
Até dói no coração escrever algo assim, mas é verdade. Por melhor que seja, por mais barreiras da estética quadrada do cinema que rompa, Rocketman não poderá ostentar os mesmos números de Bohemian Rhapsody, aquele álbum de fotografias animado, clichê e por vezes desrespeitoso sobre a trajetória do Queen e de Freddie Mercury.
Elton John não terá aumento tão significativo nos seus números nas plataformas de streaming e nem mesmo a audiência dos veículos de comunicação, como a Rolling Stone Brasil, será alta o suficiente para manter o longa no noticiário por muito tempo, algo que acontece com Bohemian Rhapsody.
Tudo isso dói porque Rocketman é um filme excelente, daqueles que merecem ganhar quatro estrelas em um total de cinco, capaz de unir as músicas de Elton John dentro das situações nas quais a história dele é contada, transformando-o em um musical psicodélico de ritmo bom.
O filme, que estreou no Brasil na quinta-feira, 30, é protagonizado por Taron Egerton e dirigido por Dexter Fletcher, o mesmo diretor que ocupou a cadeira deixada por Bryan Singer depois dele ser acusado de abuso sexual em Bohemian Rhapsody. Embora a direção seja a mesma, a mão que o roteiro dá é outra.
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Curiosamente, tanto John, quando os integrantes do Queen Brian May e Roger Taylor participaram ativamente da elaboração do roteiro. Mas enquanto o Queen encontrou problema com a sua primeira tentativa de protagonista (Sacha Baron Cohen deixou o filme por entender que May e Taylor queriam um filme que amenizasse as cenas mais pesadas), John encontrou em Egerton a sua contraparte. São tão parecidos que às vezes é possível confundi-los.
Egerton também está seguro no papel difícil de Elton John, um gênio que cresceu sem amor dos pais, e encontrou, no piano, uma forma de se expressar. Um astro pop de primeira grandeza, mas também falho e com buracos em um coração acostumado ao desamor. "Ninguém vai amá-lo de verdade", ele ouviu sua mãe dizer, ao telefone, quando decidiu revelar a ela a sua sexualidade.
Elton é um personagem complexo, de fato - como era Freddie Mercury, interpretado no fim por Rami Malek em uma atuação que lhe rendeu o Oscar de Melhor Ator na cerimônia realizada em 2019. Complexo porque ele tem dificuldade em acessar suas emoções quando não é por meio da música.
E em vez de ser professoral, Rocketman tem um roteiro que desafia aquele do lado de cá a pensar, ouvir as canções de Elton John executadas na tela para compreender a jornada pela qual passa o seu protagonista.
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Em Rocketman a música serve à história e esse era o problema de Bohemian Rhapsody - no qual a história servia à música e, ao final da exibição, a sensação era de ter assistido a um longo videoclipe de duas horas e tantos minutos.
A música de Elton John é inserida em Rocketman em momentos especiais, como quando ele se apresenta para o público norte-americano pela primeira vez e todos parecem flutuar. Mas não será suficiente para trazer um público novo, não tem "bastidores da canção", como Bohemian Rhapsody (alguns deles no filme do Queen, inclusive, tiveram algumas "liberdades" adicionais no momento de serem recontados no cinema). A intenção inteira é outra em Rocketman.
A voz de Egerton é também protagonista nos momentos musicais, ele quem canta as canções também já lançadas em formato de disco, uma semana antes do filme estrear, em todas as plataformas de streaming.
Rocketman define, desde a primeira cena, quando a sua história vai terminar. O que tem prós e contras. O filme não segue uma jornada do herói, dividida em três atos, porque o ponto mais baixo na carreira de John está nos minutos finais. Também é preguiçosa a maneira como a história é contada a partir de um depoimento do personagem.
Mas Rocketman é valioso ao tirar o caráter místico do personagem, uma das figuras mais importantes da música pop na segunda metade do século passado. Humaniza Elton John, suas falhas e escancara seus erros.
O acerto foi convencer o próprio Elton John a embarcar nessa jornada de se rever nas telas de cinema. Ele concordou em ter sua vida exposta, os abusos de drogas, de álcool, as relações que teve no passado.
Tudo faz parte de um processo de despedida também. Elton John está deixando os palcos. A atual turnê é a última dele. Em breve, também lançará uma autobiografia. Ele se despede da vida na música justamente para viver a vida que existe além dela, com seu marido e dois filhos.
Vai viver o amor de uma família como ele nunca teve. A falta desse amor o levou à música e a chegada desse amor, mesmo que tarde na vida, vai abraçá-lo aos 72 anos.
De certa forma, toda a existência de Rocketman difere de Bohemian Rhapsody. O filme de Elton John não vai varrer recordes, lotar plateias por meses a fio e tudo mais. Mas embora o timing essa esse - o momento no qual Bohemian Rhapsody mostrou à Hollywood que cinebiografias podem ser muito rentáveis -, Rocketman é um filme sobre o amor, família e companheirismo. A música, em si, só está ali para compor a história.
Infinitamente melhor, é verdade, mas as comparações dos números vão acontecer e Bohemian Rhapsody, neste caso, terá vantagem. Mas só nesse quesito.
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