- Santiago Mazzoli, João Viegas, Novato Calmon, Thiago Barros e Popoto Martins Ferreira (Foto:Camila Tuon)

Na contramão das tendências, Raça resgata com sinceridade o hardcore em novo disco

Saúde, terceiro álbum da banda, foge dos sintetizadores clichês e aposta na energia das cordas e dos pedais

Igor Brunaldi Publicado em 12/04/2019, às 08h20

Nesta sexta, 12 de abril, o Raça lançou Saúde, terceiro disco da banda paulistana formada por Popoto Martins Ferreira (guitarra e vocal), Thiago Barros (bateria), João Viegas (teclado e vocal), Santiago Mazzoli (guitarra) e Novato Calmon (guitarra e vocal).

Sucessor da calmaria nostálgica de Saboroso (2016), o novo trabalho volta o olhar para a energia mais agressiva de Deu Branco (2014). Com essa decisão, a banda estufa o peito e bate de frente contra algumas das maiores tendências da música atual: a predominância de sintetizadores e a coadjuvação das guitarras.

As teclas não foram extintas. Elas ainda estão presentes no som, prestando auxílio à ambientação, mas são as cordas e suas distorções que se responsabilizam pela força motora.  

Sobre essa mudança e a vontade rebelde de andar na contramão daquilo que está na moda, o vocalista Popoto, em entrevista exclusiva à Rolling Stone Brasil, reflete: "Acredito que a maior virtude do Raça seja o nosso compromisso com o inesperado".

"Esperamos deixar para trás nosso lado amador", completa. "Esse disco ainda conversa com nossos sons anteriores, então só vamos dar um jeito de apresentar um espetáculo do começo ao fim. A vontade é de sempre expandir."

Concretizado com o apoio dos fãs em uma campanha de financiamento coletivo, o álbum de fato surpreende em diversos aspectos: é explosivo, hardcore, sincero e provocativo. E apesar de abraçar a proposta de ser visceral e barulhento, é inteiramente compreensível, fácil de digerir e de se identificar.

As letras das faixas são apresentadas com uma honestidade punk. O vocabulário é simples e as mensagens chegam aos ouvidos como confissões cruas e despidas de alegorias.

Porque as coisas são como elas são. Não adianta fugir. E a fuga não é um tema que faz parte do espectro de Saúde, que expõe medos interiores, fragilidades do ser e a busca por superação, mesmo que através do confronto.

Popoto conta que a inspiração para o título surgiu da difícil tarefa de seguir um estilo de vida saudável. "Esse processo te tira da zona de conforto, mas resolve as questões que precisam ser tratadas". E é essa busca por esclarecimento consigo mesmo que permeia todo o álbum, como por exemplo na música "Paciência", em que declara: "Eu exponho minha fraqueza/ Exagero na defesa".

A franqueza fica perceptível também por não tentarem cantar letras próximas da linguagem escrita. Eles apresentam suas reflexões com o auxílio único e exclusivo da pureza da fala coloquial, com em "Mó Real", na qual o vocal afirma: "Suor e lágrimas/ Isso é real/ Suor e lágrimas/ Isso é mó real".

Apesar do peso quase que onipresente no instrumental, o Raça não abdicou daquela ternura apresentada em Saboroso. "Pouco do Todo" e "Chama" (lançada como single em novembro do ano passado aqui mesmo pela RS Brasil) resgatam esse lado, sem soarem deslocadas do resto da tracklist.

Mas a música que de fato incorpora o espírito dessa nova era é "Domingo". Intensa e imersiva, a canção abre com uma explosão e, logo em seguida, mergulha na repetição serena do mantra "São tantas questões que preciso resolver/ Antes de amar alguém", para, mais ao fim, voltar a repetí-lo com a intensidade de quem precisa de uma vez por todas enfrentar e entender esse fato.  

A capa é também resultado de um esforço coletivo, e que reflete o conceito do álbum. Desde o modelo fisiculturista (encontrado por Déborah Moreno) realmente pintado de cinza (como o personagem criado pelo vocalista para as ilustrações dos singles) e posando para a fotografia de Marcus Steinmeyer, até a calça verde (confeccionada por Popoto, Novato e Fernanda Yoshiro), cor que, curiosamente, representa a cura.

Saúde é o disco do Raça com maior número de faixas (12 ao todo) e o mais curto em duração (total de 29 minutos), além de ser o primeiro que lançam pelo selo Balaclava. O quinteto conta também com a contribuição de vocais das amigas Heloisa Cleaver e Bruna Guimarães, conhecida pelo seu projeto BRVNKS.

O álbum já está disponível nas plataformas digitais, e a banda fará o show de lançamento no próximo dia 4, na Associação Osaka, com apresentações também do Gorduratrans e da YMA.

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