Em meio ao novo anúncio do governo de um novo programa para economizar energia, brasileiros refletem sobre a crise hídrica e o aumento da conta de luz
Camilla Millan Publicado em 03/07/2021, às 11h00
Nas últimas semanas, um dos principais assuntos discutidos nas casas brasileiras é a conta de luz em alta. Nos jornais, a crise hídrica e um planejamento que lembra o horário de verão também é alvo de debates - mas qual é a relação entre todos esses assuntos?
O Brasil enfrenta uma grande crise hídrica, com falta de água nos reservatórios de hidrelétricas, responsáveis pela maior parte de fonte energética no Brasil. O maior consumo de água, falta de chuvas e mudanças climáticas podem explicar grande parte dessa crise. Uma das consequências dessa situação? Aumento da conta de luz.
Na terça, 29 de junho, foi divulgado o reajuste na conta de luz dos brasileiros. O preço da energia estava sendo cobrado no segundo patamar da bandeira vermelha, quando é preciso aumentar ao máximo as taxas para equilibrar as contas dos fornecedores de eletricidade. A taxa, contudo, foi reajustada de R$ 6,24 para R$ 9,49 para cada 100 quilowatts consumidos por hora - valor que pesa (e muito) no bolso.
Em meio à crise hídrica e à necessidade de aumentar a conta de luz, o governo anunciou uma nova medida de incentivo ao uso de energia fora dos horários de pico. A ação lembrou aos brasileiros o horário de verão extinguido pelo presidente Jair Bolsonaro no início de 2019. Afinal, a iniciativa é a mesma? Se há diferenças, quais são?
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Para entender mais sobre os impactos da crise hídrica na conta de luz e os questionamentos acerca do horário de verão, a Rolling Stone Brasil conversou com Eduardo Amendola, professor de economia da graduação e MBA da Estácio, doutorando em Ciências Econômicas na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e especialista em Economia Aplicada, com ênfase em Economia Monetária e Fiscal, Finanças e Mercado Financeiro.
Desde a invenção do horário de verão no Brasil, em 1931, a medida tinha um objetivo muito evidente de melhorar o aproveitamento da luz natural, reduzindo a concentração de consumo no horário de pico, entre 18h e 21h. Em 25 de abril de 2019, contudo, Jair Bolsonaro (sem partido) assinou o decreto que acaba com o horário de verão por considerar que a medida perdeu "razão de ser aplicado sob o ponto de vista do setor elétrico".
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Entretanto, em meio à crise hídrica e aumento das contas de luz no Brasil, o governo declarou na terça, 29 de junho, uma nova medida de incentivo para as empresas deslocarem o consumo dos horários de maior demanda de energia para os horários de menor demanda, mudando os turnos. Em entrevista à Rolling Stone Brasil, Eduardo Amendola falou sobre as problemáticas da ação:
“Sou um pouco reticente. Você tem uma indústria que funciona de 8h às 18h e ela passaria a funcionar das 18h às 8h. Para a indústria ser motivada, os funcionários precisam receber adicional noturno e o custo das empresas aumenta. Além da mudança cultural muito grande também. E penso que trabalhar no contraturno aumenta demais o índice de acidente de trabalho. Isso gera um custo muito grande para as empresas. Como você vai motivá-las? Com incentivo fiscal - e vai custar muito para o governo em um momento que não há caixa.” explicou.
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Amendola acredita que, no momento, a medida “não será produtiva” para o governo. Por isso, o professor vê o retorno do horário de verão no final de 2021 como uma alternativa para a atual situação do Brasil:
“Assim incentiva o setor de turismo e em 2022 podemos reavaliar se essa nova medida pode ser colocada em prática junto ao horário de verão. Pensando num ambiente futuro, em 2022, teremos o crescimento de PIB, melhora da arrecadação… Caminhando para um patamar mais aceitável ou controlado,” explicou.
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Diante deste cenário, é importante refletir sobre o real impacto do horário de verão quando falamos na demanda por energia. Conforme explicado por Eduardo Amendola, a geração de energia depende da demanda.
A principal responsável pela geração de energia é a hidrelétrica - e quando os reservatórios estão baixos, outras fontes de energia são acionadas para entregar a quantidade necessária para a população. Essas alternativas, como eólica e térmica, contudo, são mais caras - e o valor é repassado para o cidadão.
Eduardo Amendola comentou: “A companhia geradora de energia de uma determinada região ganha concessão e se compromete a entregar toda quantidade de energia demandada. Quando a indústria liga uma máquina ou uma família liga a televisão, aumenta o consumo de energia. Você tem que gerar, basicamente no mesmo instante, aquela energia.”
Por isso, de certa forma, o horário de verão tinha sua importância na hora de criar um hábito de consumo para a demanda não aumentar muito nos horários de pico. Quando a empresa não tem a capacidade gerar a energia suficiente, compra de outras fontes ao preço definido por elas.
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Com a diminuição no nível de chuvas e a alta demanda por água nas indústrias e nas casas dos brasileiros, a capacidade da principal fonte de energia - as hidrelétricas - cai, e é cada vez mais necessário recorrer a alternativas.
“Quando a empresa precisa solicitar essas outras fontes, que geralmente são mais caras do que a usinas hidrelétricas, ela tem que pagar a diferença. Isso começa a aumentar muito o custo de geração de energia (...) Quando ele aumenta, isso começa a impactar na bandeira [das contas de luz],” afirmou Eduardo Amendola.
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Segundo o professor, os custos variáveis da geração de energia elétrica impactam as bandeiras tarifárias. A bandeira vermelha em seu maior patamar, situação enfrentada pelos brasileiros atualmente, indica que o custo para gerar eletricidade aumentou.
Graças às diferentes fontes energéticas no Brasil atualmente, o risco de apagões diminuiu no Brasil, mas o encarecimento é uma realidade, conforme explicou Eduardo Amendola: “Temos outras fontes para incluir nessa matriz então provavelmente não vamos encarar um apagão, mas certamente vamos encarar a conta de luz mais cara.”
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O aumento da luz, contudo, não é a única impactada pela situação atual: “Alimento, transporte, produtos manufaturados, de tecnologia e todos os outros serviços como demandam energia, terão um custo de produção mais elevado e acabam repassando isso para o consumidor final,” relatou.
Ainda, o aumento na inflação é uma realidade. A crise hídrica enfrentada no Brasil atualmente é a pior dos últimos 91 anos - e ela tem esse grande impacto na inflação, que se refere resumidamente ao aumento dos preços.
Em comunicado à imprensa, a Enel justificou o reajuste realizado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), em vigor a partir de 4 de julho: "Os principais fatores que influenciaram este aumento foram a alta da inflação (IGP-M) e o aumento dos custos com aquisição de energia (produzida pelos geradores, incluindo aí Itaipu) e com o transporte dessa energia até a distribuidora (valor pago às empresas transmissoras)."
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Diante desse cenário de crise hídrica, alta na luz e na inflação, é importante ter consciência no uso da energia, mas, principalmente, na água. O professor Eduardo Amendola compartilhou algumas dicas:
“Energia não vai faltar. Ela só pode ser mais barata ou mais cara dependendo do estoque de água que tiverem no reservatório. Então precisamos usar a água de forma eficiente. Se, de fato, diminuirmos ou conseguirmos mudar a demanda do horário de pico, a geração de energia terá um custo menor por não precisar acionar outras fontes mais caras,” disse.
O professor também explicou que o impacto não é tão grande quando falamos das casas dos brasileiros, pois os verdadeiros consumidores são a indústria e o setor agropecuário. A sensação de coletividade, contudo, é importante:
Eduardo Amendola explicou: “O setor produtivo é o que mais consome energia e água. Colaboramos, mas de forma marginal. A mensagem é importante para gerar coletividade e um consumo consciente, mas os grandes demandantes são as indústrias e agropecuárias, principalmente quando falamos em água.”
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