- Jehnny Beth (Foto: Johnny Hostile / JB Alt )

O mundo sombrio e singular de Jehnny Beth sem o visceral Savages

Com o disco To Love Is To Live, a cantora francesa estreia em carreira solo

Julia Harumi Morita Publicado em 09/07/2020, às 07h00

“Eu estou nua o tempo todo / Eu estou queimando por dentro / Eu sou a voz que ninguém pode ouvir”. Com ruídos tensos e o som de um tic-tac acelerado, Jehnny Beth se apresenta e inicia uma narrativa sonora sobre a própria vida e mortalidade em To Love Is To Live, o primeiro disco solo da cantora, lançado no dia 12 de junho.

Jehnny possui uma habilidade surpreendente de transitar por gêneros musicais. No início da carreira, a artista explorou o indie rock ao lado de Nicolas Congé na dupla John and Jehn a partir dos meados da década de 2000. 

A parceria também deu origem à persona Jehnny Beth - afinal, as pessoas achavam mais fácil chamá-la de Jehn do que de Camille Berthomier, verdadeiro nome da cantora francesa. Da mesma forma, Congé adotou o nome artístico Johnny Hostile.

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Jehnny Beth (Foto: Steve Gullick)

Em 2011, depois de dois discos, Jehnny ainda assumiu os vocais do visceral Savages e mergulhou no post-punk com os álbuns “Silence Yourself” e “Adore Life”. Contudo, depois do segundo trabalho da banda, a cantora foi atingida por uma epifania vigorosa causada pela morte de David Bowie.

O último disco da carreira do astro camaleônico, Blackstar, possui um tom transcendental e premonitório sobre a trajetória de Bowie, que morreu dois dias após o lançamento da obra, em 2016.

Jehnny conversou com a Rolling Stone Brasil e revelou acreditar que, independente da idade, as pessoas são atravessadas por pensamentos inevitáveis sobre a morte em certos momentos da vida. 

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Aos 35 anos, a artista explicou que recorreu à arte para expressar sentimentos difíceis de entender, mas necessários. “Existem momentos na vida, seja jovem ou velho, que você se lembra da própria mortalidade e meio que passa o resto da vida e todos os dias para esquecer”, disse a cantora.

Ela completou: “Mas, na verdade, quando nos lembramos, isso traz uma urgência e intensidade para a vida, que acho muito inspiradora e criativa, muito rica. E eu acho que quero trazer essa urgência para o disco”.

“Eu realmente queria fazer esse álbum, porque queria mudar o jeito como trabalhava”, disse Jehnny enquanto contava que, ao invés de se voltar para as performances nos palcos,  como fazia no Savages, ela buscou se concentrar na narrativa do disco. 

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“Artistas como Beyoncé  ou Kendrick Lamar, eles realmente fazem álbuns que não são apenas singles conectados, existe uma narrativa no disco e eu me sinto muito inspirada por isso. Eu amo álbuns, então, eu esqueci completamente do palco e sentei para fazer um”. 

To Love Is To Live é um verdadeiro conflito sonoro. Ao longo de 11 canções, Jehnny provoca os ouvidos com guitarras distorcidas, um piano sensível, vocais indecifráveis por causa dos efeitos, vozes graves e sóbrias, gemidos, sussurros e agudos angustiados ou raivosos.

A artista reflete sobre as circunstâncias que formam o caráter humano, como a cidade fria retratada em “Innocence”, o desejo intimidador exibido em “Flower” e os pecados que serão cometidos em “We Will Sin Together”.

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“E, de qualquer jeito eu cansei / De tentar consertar o que está errado / Então continue encarando as lentes / Você vem nos implorar / Amar é viver / Viver é pecar”, ela canta em “We Will Sin Together”. 


As contradições são um dos “prazeres particulares” que motivam a busca de Jehnny pela escuridão na claridade e vice-versa. Por meio de máscaras do bem ou do mal, a cantora consegue desconstruir as invenções humanas sobre a vida. 

“Eu acho que nós somos feitos de contradições. Eu quero aceitar essa complexidade e mostrar isso no trabalho que faço, mostrar os seres humanos como pessoas complexas.”

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A artista continua: "Às vezes, a religião te diz que as contradições são pecados [...] Eu sinto que nós precisamos entrar dentro das nossas próprias cabeças, achar essas paredes que foram construídas e tentar colocar uma porta ou uma janela”. 

Na faixa “A Place Above”, os sons sombrios de Jehnny ganham uma nova dimensão na voz do ator Cillian Murphy, estrela da série Peaky Blinders convidada pela artista para interpretar um monólogo dramático.

Cillian Murphy é um ótimo ator e eu realmente amo a voz dele. Eu sabia que ele era um fã, então eu apenas entrei em contato, pedi para ele ler o texto que tinha escrito para o disco e ele disse sim. Quero dizer, o que eu gosto nele é a habilidade de interpretar monstros no cinema e não ter medo de mostrar lados que não são necessariamente bons.”

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A figura do homem exagerada e assustadoramente autoconfiante também é interpretada por Jehnny em “I’m The Man”. Já na faixa seguinte, “The Rooms”, o texto ganha inúmeras vozes, mas, desta vez, a cantora responde: “Porque eu vi tudo / Eles não me dizem como acaba, garoto / Então a mulher fez o homem, o homem fez um deus”.


Apesar de To Love Is To Live ser o primeiro disco de Jehnny fora de uma dupla ou banda, a cantora não gosta de dizer que é um álbum solo, mas pessoal, pois ele é o resultado de colaborações com diversos artistas, entre eles Romy Madley Croft, do The xx, Joe Talbot, do IDLES, e o antigo parceiro Hostile.

Jehnny ainda disse que Romy foi uma parceira fundamental durante o processo de criação e conseguiu auxiliou a artista a “revelar lados que ainda não tinham sido mostrados no álbum”.

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No primeiro disco da carreira solo, Jehnny Beth constrói uma narrativa sonora afetiva e poderosa em formato de espiral sobre o mundo sombrio e singular que habita. 

“[To Love Is To Live] é algo que me fez sentir que não tinha escolha. Era uma necessidade. Eu senti que precisava fazer um trabalho que seria tipo um legado”, disse Jehnny. “Senti que era a hora certa para isso.”

A cantora completou: “Agora que está lançado, eu me sinto aliviada e sinto que as pessoas podem me ver, você sabe, eu posso começar a construir em cima disso. [...] Esse disco foi a grande base para o que está por vir para mim”.


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