“Fiquei espantado com a direção que Alex havia tomado”, conta guitarrista sobre a primeira vez que ouviu as ideias do vocalista para o disco Tranquility Base Hotel & Casino
Jonah Weiner Publicado em 03/05/2018, às 16h42 - Atualizado em 04/05/2018, às 11h18
O primeiro álbum do Arctic Monkeys em cinco anos é exuberante e claustrofóbico ao mesmo tempo, como uma pessoa enlouquecendo em um pequeno quarto de uma casa nas montanhas e criando dentro da própria cabeça um mundo fantástico. De certa forma, foi exatamente assim que nasceu Tranquility Base Hotel & Casino. Estamos no meio de abril, apenas algumas semanas antes do lançamento do disco, (previsto para 11 de maio) e, após descer do bairro Hollywood Hills, onde mora, Alex Turner chega à lanchonete para tomar café da manhã. Não são nem dez da manhã, mas ele veste um traje nítido, vintage, elegante e de cor castanho-claro, com bolsos no estilo safári e calça boca-de-sino. Assim que ele se senta à mesa, esclarece: “Christian Dior”.
Turner conta que começou a compor o novo trabalho da banda em 2016, no estúdio que tem em casa, em frente a um piano Steinway Vertegrand que, de acordo com ele, ganhou de aniversário do empresário. Como um grande admirador da capacidade de mudança de estilo de artistas como John Lennon e David Bowie, ele buscava produzir algo que não soasse nada como o disco anterior do Arctic Monkeys, o AM – que vendeu mais de 1 milhão de cópias, com sua infinidade de riffs serpenteantes e grooves pesados. Como nunca havia composto em um piano, achou que o Vertegrand proporcionaria a nova sonoridade que procurava, e estava certo. Surgiram então acordes, progressões e “viradas de jazz” que “invocaram em mim essa ideia de um caráter de lounge, que eu nunca teria pensado se estivesse tocando guitarra. Me lembrou das coisas que meu pai tocava no piano.” Ele lista outras influências que tiveram papel importante no processo de criação: Histoire de Melody Nelson, do francês Serge Gainsbourg, Born to Be With You, da Celine Dion, e a trilha sonora jazzística composta por François de Roubaix para o clássico de 1967 Le Samourai, dirigido por Jean-Pierre Melville.
“As pessoas me dizem que o nosso último disco tem um ar norte-americano, mas eu não sinto isso tanto quanto sinto no novo”. Ao explorar o Vertegrand, Turner se viu abordando temas como escapismo, compondo versos sobre pessoas que se conectam a dispositivos de realidade virtual e fugindo para colônias espaciais rapidamente gentrificadas. Existem diversas referências auto-reflexivas à ficção científica ao longo do álbum, inclusive uma faixa nomeada em homenagem a esse gênero. “A ficção científica cria esses outros mundos para comentar sobre o nosso mundo”, ele conta. “E essa ideia em si era muito interessante para mim”. Um narrador nos dá as boas vindas ao Tranquility Base, um hotel luxuoso e pós-apocalíptico na lua, possivelmente gerado por computador. “Escrevi as letras com o microfone em uma mão, e apertando o botão de gravar em um eight-track [tecnologia de gravação em fita, popular nos Estados Unidos entre 1960 e 1980] com a outra”, relembra. Em seguida, passava todo o material através de uma bugiganga do final dos anos 1960 chamada Revox A77, criando, como ele mesmo descreve, “toda essa oscilação”, compondo então uma ambientação brega e retrô-futurista. O resultado é um álbum estranhamente cativante sobre o papel do entretenimento – o desejo de criar e escapar para lá – durante épocas de agitação e crise.
Tudo isso pode representar um enorme perigo para os fãs de Arctic Monkeys – principalmente para aqueles que esperam ouvir o rugido de guitarras pelas composições. E Turner sabe disso. O guitarrista Jamie Cook e o baterista Matt Helders se juntam a nós na lanchonete, e Cook conta que ficou surpreso quando o vocalista mostrou pela primeira vez as demos, em fevereiro de 2017. “Fiquei espantado com a direção que Alex havia tomado”, conta. “Precisei ouvir algumas vezes para sequer começar a...” ele sorri. “Foi tipo: 'Merda, o que vamos fazer com isso?'”
Helders ressalta que a nova sonoridade resultou em um processo de aprendizado para ele também. “Em todos os discos que fizemos até agora, eu sempre quis fazer algo completamente original, como uma batida que ninguém nunca pensou em fazer”, ele completa, acrescentando que, desta vez, deu uma sossegada. “Percebi que não era sobre mim, era sobre tocar para as músicas.” Quando pergunto a Turner se o distanciamento drástico dos grandes riffs pode ser interpretado como um “foda-se” em direção às expectativas dos fãs, ele sorri: “Talvez haja um lugar e um momento para esses riffs e para esse 'foda-se'”.
Mas ele enfatiza que não estava pensando muito na reação do público. Talvez nada capture exatamente o quão fundo ele caiu no próprio buraco do coelho como quando começou a criar e construir à mão o modelo do hotel que dá nome ao álbum, uma vez que as músicas estavam finalizadas. A capa do disco começou a partir do rascunho de um hexágono que Turner fez – representando o sexto trabalho da banda. A ideia cresceu conforme ele buscava inspiração em arquitetos da metade do século, como Eero Saarinen e John Lautner. Ele conta que, durante dois meses, “ia à loja de materiais de arte com uma certa frequência”, comprando cartões de ilustração e os cortando com estilete, fazendo formatos diferentes. “Fiquei muito consumido. Acordava no meio da noite e mergulhava nisso, chamando de modelo de lobby, como aquelas coisas que às vezes ficam nos lobbies dos prédios, representando a construção – essa repetição me atrai, como no filme O Iluminado, que tem aquele labirinto em miniatura no lobby, e dá para ver as pessoas lá.”
A referência ao clássico filme de Stanley Kubrick levanta uma questão um tanto quanto óbvia: quem ao redor de Turner achou que ele estivesse enlouquecendo enquanto perseguia essas obsessões solitárias? Ele conta que sua namorada, a modelo Taylor Bagley, o apoiou totalmente, assim como o cachorro Scoot. “Era eu e ele lá, todo dia”, diz, enquanto dá uma risada. “E ele também não me falou que eu estava enlouquecendo”.
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