Moby/ Tradução: Bruna Veloso Publicado em 23/03/2014, às 12h41
“Olá, meu nome é Moby e eu sou vegano.”
(Ao que, presumo, você responde: “Olá, Moby”. Veja, mesmo que nunca tenha estado em uma reunião dos 12 passos, você provavelmente já viu uma na televisão, já que quase todas as séries precisam ter uma cena envolvendo uma reunião dos 12 passos. Ou pelo menos parece.) Então, aqui está a minha apresentação, ou como eu me tornei vegano.
Quando eu tinha duas semanas de vida, minha mãe tirou uma foto minha na banheira de bebê, no nosso apartamento subterrâneo no Harlem, em Nova York. Na foto, estou eu e, olhando para mim, estão:
Nosso cachorro (Jamie).
Nossa gata (Charlotte).
Nossos dois ratos de estimação (sem nomes).
Na imagem, eu estou olhando para cima, para os quatro animais, e eles estão olhando de volta para mim. Eu pareço bastante satisfeito, e eles parecem bastante satisfeitos. E tenho certeza de que naquele momento os neurônios no meu sistema límbico [área do cérebro responsável pelas emoções] registraram que animais eram ótimos e benignos. Enquanto eu crescia, minha mãe e eu tivemos uma série de animais de estimação. O “alojamento”, durante mais ou menos 15 anos, incluiu: quatro cachorros, 12 gatos, uns 1000 filhotes de rato, uma iguana, três esquilos-da-mongólia, um hamster e uma pequena cobra.
Nas entranhas da besta: um retrato dos horrores da indústria da carne.
Eu amava nossos animais. Quando um morria, eu ficava com o coração partido, chorando inconsolavelmente pela triste e injusta morte de qualquer que fosse o cão ou gato ou rato ou lagarto que tivesse morrido (e, com tantos animais, houve muita morte e muito choro). Não queria nomear favoritos entre os nossos animais, mas meu favorito era Tucker, o gato que eu achei no lixo. Quando eu tinha 10 anos de idade, estava andando perto do aterro da cidade e ouvi alguns “miau miau miau” vindos de uma caixa. Abri a caixa e dentro achei três gatinhos mortos e um gatinho quase morto (tão jovem que os olhos dele ainda estavam fechados).
Peguei o gatinho e corri para casa. Minha mãe e eu pulamos no carro (não literalmente) e fomos para o veterinário. O veterinário foi compreensivo, mas não encorajador. “É raro filhotes viverem sem as mães quando são assim tão jovens”, ele disse, “então tente não se apegar.” Levamos Tucker para casa (eu dei o nome para ele enquanto estávamos no carro), assumindo que ele morreria em breve, mas, do nada, nosso cachorro da raça dachshund, George, o adotou. George se tornou a mãe substituta de Tucker, o limpando e o mantendo aquecido, e Tucker acabou vivendo até os 18 anos.
Um dia, quando Tucker tinha 9 anos e eu tinha 19, eu estava sentado com ele ao sol na escada da casa da minha mãe em Connecticut. Foi um momento perfeito, idílico e aconchegante, garoto e gato ao sol. Enquanto estava sentado lá, tive uma epifania. E muitas das minhas epifanias são bem óbvias, então talvez você ache essa epifania um pouco óbvia.
Mas, em todo o caso, aqui está minha epifania. Sentado nas escadas, pensei: “Eu amo esse gato. Faria qualquer coisa para protegê-lo e para fazê-lo feliz. Ele tem quatro patas e dois olhos e um cérebro incrível e uma vida emocional incrivelmente rica. Eu jamais, nem em um trilhão de anos, pensaria em machucar esse gato. Então, por que estou comendo outros animais que têm quatro (ou duas) patas, cérebros incríveis e vidas emocionais complexas?” E sentado nas escadas no subúrbio de Connecticut com Tucker, o gato, me tornei vegetariano.
Isso foi em 1985, 29 anos atrás.
A razão para eu ter me tornado vegetariano era simples: eu amava (e amo) animais e não quero me envolver em nada que contribua para ou leve eles ao sofrimento. De início, isso me fez parar de comer carne vermelha e frango. E em seguida peixe (se você passar algum tempo com peixes vai perceber muito rapidamente que eles sentem dor, e que ficam muito mais felizes quando não estão sendo fisgados, caçados com arpões ou em redes). Aí, eu pensei: “Eu não quero contribuir para o sofrimento dos animais. Mas as vacas e as galinhas em fazendas comerciais de laticínios e ovos parecem muito infelizes, então por que ainda estou tomando leite e comendo ovos?” Assim, em 1987 eu abandonei todos os produtos de origem animal e me tornei vegano. Simplesmente para que eu pudesse comer e viver de acordo com a minha crença de que animais têm suas próprias vidas, que eles têm direito de ter suas próprias vidas e que contribuir com o sofrimento animal é algo de que eu não quero fazer parte.
Isso foi há 27 anos. Sendo um gênio da matemática, posso dizer seguramente que sou vegano há 27 anos. Ao passar do tempo, meu veganismo foi reforçado à medida que aprendi sobre saúde, mudanças climáticas e o meio ambiente. Descobri que o ato de comer carne, laticínios e ovos é em grande parte responsável pelo desenvolvimento de diabetes, doenças no coração e câncer. Descobri que a produção comercial de animais é responsável por uma enorme porção das mudanças climáticas, mais do que todos os carros, caminhões, barcos e aviões juntos. Descobri que para produzir cerca de meio quilo de grãos de soja são necessários 200 galões de água, enquanto que para produzir cerca de meio quilo de carne bovina são necessários 1800 galões de água. Descobri que uma das principais causas do desmatamento florestal é o corte de árvores para a criação de pastos para fazendas industriais. E descobri que a maioria das zoonoses, doenças que são transmitidas dos animais para os humanos (pneumonia asiática, doença da vaca louca, gripe aviária, etc.), são resultado da agricultura animal. E como argumento decisivo: eu também descobri que comer uma dieta rica em gorduras e produtos de origem animal pode ser um fator determinante para a impotência (como se eu precisasse de mais razões para ser vegano).
Quanto mais eu estudava sobre saúde e meio ambiente, mais me comprometia com o fato de ser vegano. E tenho vergonha de admitir isso agora, mas houve um período (inevitável na vida de um vegano) no qual eu era o cara insuportável que gritava com os amigos toda vez que eles comiam carne. Com o passar do tempo, percebi que quando gritava com meus amigos o resultado não era eles comerem menos carne – eles apenas ficavam irritados comigo e não me convidavam para as festas deles. E talvez eu seja egoísta, mas gosto de ser convidado para as festas dos meus amigos.
Aprendi, eventualmente, que gritar com as pessoas não é o melhor modo de fazê-las ouvir o que você tem a dizer. Quando eu gritava com as pessoas, elas ficavam resistentes e na defensiva em relação ao que quer que fosse que eu estivesse tentando falar. Mas descobri que ao dividir informações e fatos de maneira respeitosa com as pessoas, eu podia fazê-las ouvir o que eu estava dizendo – e podia até fazê-las considerar as minhas razões para ter me tornado vegano.
Que fique claro: só porque eu sou vegano, não estou dizendo que você deva ser. Seria irônico se eu me recusasse a impor a minha vontade aos animais, mas impusesse minha vontade a outros seres humanos.
Você deveria se informar o melhor que puder e comer e viver da maneira que parece melhor para você. Mas, empiricamente e epidemiologicamente, você (e todos nós, na verdade) têm melhores chances de viver uma vida mais longa, mais feliz e mais saudável se evitar produtos de origem animal produzidos em fazendas industriais, já que fazendas industriais tratam seus animais horrivelmente mal, e a carne e os laticínios que vêm desses lugares estão repletos de antibióticos e hormônios sintéticos e bactérias, etc.
Ok, eu poderia dizer mais, e eu adoraria dizer mais, mas sinto que explanei aqui as razões pelas quais me tornei e permaneço vegano. Acho que, para concluir, fora as questões de saúde e mudanças climáticas e zoonoses e resistência de bactérias a antibióticos e impotência e degradação do meio ambiente, eu lhe faria uma simples pergunta: você conseguiria olhar nos olhos de um bezerro e dizer “meu apetite é mais importante que o seu sofrimento”?
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