Além de Pennywise e Coringa, esses palhaços nos fazem entender de onde vem a coulrofobia
Vinicius Santos Publicado em 14/09/2019, às 11h00
2019 tem sido um bom ano para os palhaços, pelos menos para aqueles que ganham a vida assustando as pessoas, em vez de fazê-las rir. Com o sucesso de bilheteria internacional de It: a Coisa 2 e a aprovação unânime da crítica do Coringa de Joaquin Phoenix, pode-se dizer que os palhaços bizarros estão em alta.
Mas porque será que esse tipo de personagem tem tanto apelo? Como essa figura que deveria transmitir alegria e diversão ganhou tantas representações macabras? Listamos aqui alguns dos palhaços mais notórios e assustadores da cultura pop (e da vida real) para traçar as raízes da coulrofobia (termo médico que descreve o medo de palhaços).
Comecemos a desvendar o medo pelo Palhaço do Crime da DC. O criminoso psicótico está constantemente sorrindo, mesmo enquanto comete as maiores atrocidades, e em toda a trajetória tragicômica como vilão ele busca abalar a sociedade e o Batman ao zombar e ridicularizar os ideias de justiça, lucidez, honestidade, ordem e certeza.
O Coringa é desse jeito por ser uma criado a partir do arquétipo do Trickster. Para quem nunca ouviu falar, arquétipos são imagens que existem no imaginário popular e servem como modelos de comportamento: o pai, a mãe, o herói, deus, o diabo, entre outro. No caso do Trickster, ele é o puro transgressor, o agente do caos e inimigo da ordem, assim como um o humor bobo da corte é o oposto da seriedade do rei.
Esse palhaço assusta por abalar as fundações de nossas vidas por zombar delas, e esse desprezo e comportamento autodestrutivo contra coisas que valorizamos (trabalho, leis, racionalidade) o torna perigoso e ameaçador. O Coringa sempre vem para causar o caos, e isso dá medo.
Como a primeira adaptação em filme, de 1990, de It: a Coisa, de Stephen King, chamava, Pennywise é uma obra-prima do medo. Esse palhaço sinistro é na verdade uma entidade que se alimenta de medo (e carne humana, quando convém), e para fazer isso ele pode mudar de forma, e vira a coisa que você mais teme.
Pennywise é uma combinação de tudo o que há de assustador sobre palhaços: com um humor sádico e infantil ao mesmo tempo, ele é um predador de crianças, e usa a forma de artista de circo para se aproximar delas, em uma perversão do conceito de alegria e segurança. A maquiagem de palhaço exagerada afasta a semelhança com um humano também, causando uma estranheza no espectador, de algo que não é completamente normal, ainda que tente parecer
Para fechar o pacote, Pennywise ainda é monstruoso, podendo ganhar presas e garras e abusando de poderes sobrenaturais e ilusões para sumir com as criancinhas que se afastam demais dos adultos para brincar. Praticamente uma figura folclórica que, como o bicho-papão, serve como um conto de advertência.
Tudo bem, eu sei que a primeira opção que veio a cabeça ao pensar sobre palhaços assustadores não foi Krusty, o palhaço de Os Simpsons. Nem mesmo a segunda ou terceira. Mas o que causa medo neste personagem na verdade mais entristece do que assusta, e aos adultos mesmo.
Krusty é fumante, alcoólatra, abusa de outras substâncias na série também e é profundamente infeliz com a sua carreira de apresentador de TV, em uma inversão dos valores associados ao palhaço e crítica social ao desgaste causado pela profissão. O medo que sentimos de Krusty é de que nossas vidas se tornem parecidas com a dele.
Mesmo que você ainda ache Krusty mais engraçado (ou digno de pena) do que aterrorizante, em Os Simpsons também há Sideshow Bob, que mesmo não se fantasiando de palhaço lembra fisicamente um (pés gigantes e cabelo espalhafatoso), e após ser humilhado por Bart e demitido por Krusty jura matar o garoto e se vingar de ex-chefe. Completamente psicótico, Sideshow Bob é o típico vilão perseguidor, só que em forma de palhaço.
Continuando nas séries da Fox, Twisty the Clown, de American Horror Story, foi um artista de circo itinerante que teve sua carreira arruinada por dois anões do circo que o difamaram, espalhando o rumor de que ele molestava crianças. Desesperado por não conseguir mais emprego, o palhaço falido tenta se matar dando um tiro de escopeta na boca, e termina desfigurado e louco.
Twisty decide então continuar a “fazer as crianças felizes” de uma maneira perturbada, raptando e matando as vítimas. Ele ainda veste a roupa de palhaço agora imunda e usa uma máscara assustadora, que esconde um rosto mutilado. Sem tantas críticas sociais ou conceitos complexos desta vez, esse personagem é apenas pura matéria-prima para pesadelos.
Nosso representante brasileiro da lista, o segundo intérprete Bozo do SBT, Arlindo Barreto, tinha uma vida pessoal muito complicada, com a frustração por nunca ser reconhecido como comediante por sempre estar fantasiado no programa.
Arlindo ficou viciado em cocaína, sexo e crack, com histórias dele usando drogas nos bastidores do programa do Bozo logo antes das transmissões, realidade que foi exibida no filme nacional Bingo: O Rei das Manhãs (de 2017). Apesar de ter se convertido e hoje ser pastor evangélico, o drama de Arlindo ajudou a criar o folclore brasileiro de histórias bizarras de palhaços e deixar o bordão “Alô criançada! O Bozo chegou!” levemente sinistro.
Máfia, demônios e palhaços são algumas das coisas que definem Spawn. Criado pela lenda dos quadrinhos Todd McFarlane na editora Dark Horse, o agente da CIA Al Simmons é morto numa emboscada durante uma missão e, ao chegar no inferno, faz um pacto com o demônio Malebolgia para ser revivido com poderes em troca de servidão, e se torna Spawn. O anti-herói obviamente se rebela, e a criatura enviada para discipliná-lo é o Violador.
O Violador é um palhaço demônio: obeso, sádico, com doses cavalares de humor negro e a capacidade de virar um monstro horrendo, este membro da lista não é apenas aterrorizante, é ofensivo e também detestável. Um ótimo vilão, ainda que um péssimo palhaço.
Todos conhecem o ditado popular “a vida imita a arte” e, no caso dos palhaços assustadores, a afirmação infelizmente também se mostrou verdade. Durante os anos de 1972 e 1978, no estado de Illinois, nos Estados Unidos, John Wayne Gacy, mais conhecido como “o palhaço assassino” sequestrou, torturou e matou ao menos 33 adolescentes.
Gacy recebeu o apelido devido ao trabalho que tinha em eventos de caridade e festas de arrecadação de fundos, aonde ia caracterizado como “Pogo” ou “Patches, o palhaço”, usando do emprego de comediante infantil para escolher e se aproximar das vítimas. Casos como o de Gacy mantém o medo bem vivo no imaginário popular principalmente nos Estados Unidos, país onde todos os palhaços dessa lista foram criados.
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