- Anelis Assumpção (Foto: Divulgação/Cultura Inglesa)

Os mergulhos interiores e criativos de Anelis Assumpção: da composição de Taurina à reinvenção durante a pandemia de coronavírus [ENTREVISTA]

Em entrevista à Rolling Stone Brasil, a cantora refletiu sobre a carreira artística e a responsabilidade enquanto artista nas redes sociais

Isabela Guiduci | @isabelaguiduci Publicado em 12/03/2021, às 07h00

Anelis Assumpção, uma das principais cantoras e compositoras brasileiras da atualidade, e o nome por trás do fantástico disco Taurina (2018), em entrevista à Rolling Stone Brasil, relembra os processos criativos do álbum, fala sobre a carreira musical e a responsabilidade nas redes sociais.

Compositora original e múltipla, Anelis Assumpção criou uma carreira artística impecável e sólida. Com letras em português, inglês e espanhol, a artista traz um lirismo memorável, repleto de crítica social, amor, sentimentos, sensações, complexidades pessoais e comida - como uma boa taurina. 

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Em 2011, lançou o disco de estreia Sou Suspeita, Estou Sujeita, Não Sou Santa e mais tarde, em 2014, Amigos Imaginários - ambos espetáculos musicais. Quatro anos após o segundo álbum, a cantora parece atingir um nível ainda mais acentuado da criatividade com o icônico e delicioso, Taurina (2018).

Como artista, é influenciada “de diversas formas” desde o nascimento por um dos nomes mais importantes do cenário musical nacional e da cultura brasileira, o pai, Itamar Assumpção: "Cada momento, tenho uma influência diferente [vinda dele] ora na postura, ora no pensamento, ora na musicalidade, ora no auto didatismo. Sobretudo, na verdade."

"A coisa mais importante que meu pai serviu como artista, como cidadão e como homem preto brasileiro foi ser uma pessoa de verdade, inteira, com uma vida condizente com as convicções. É uma influência eterna, não que ela seja reproduzida, mas provoca o meu dia a dia o tempo todo", completa.  

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 Maturidade da carreira artística e significados de Taurina (2018)

Capa de Taurina (Foto: Reprodução)

Mergulho Interior” é a faixa que abre Taurina. Como o nome revela, a música é uma viagem complexa, além de ser um convite magnífico para degustar cada palavra dentro das 13 canções que compõem o álbum: “Vamos dar um mergulho interior”, convida a cantora e compositora brasileira. 

Taurina é uma tradução musical do próprio mergulho interior de Anelis Assumpção - e a intensidade do disco consegue provocar as sensações mais incríveis, assustadoras, curiosas e divertidas. A compositora conduz sentimentos de maneira excêntrica e fascinante ao longo de cada lirismo e sonoridade.

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São quatro anos desde o lançamento de Taurina, compartilhado com o público no dia 16 de fevereiro de 2018, no entanto, o projeto segue muito vivo em Anelis. Ela conta: “Olho para essas músicas, para esses sons, para essas palavras, e vejo uma elaboração do que eu vislumbrava acontecer, o que eu não queria acontecendo, do que sonho, sonhava e sonharei em transformar. Ainda olho para [Taurina] com processos bastantes profundos.” 

Criado ao longo de três anos e patrocinado pela Natura Musical, a parte prática do disco foi “gratificante” e “privilegiada”, porque foi desenvolvida com calma, reflexão e respiro, com uma busca certeira dentro da produção musical, e com um “elástico muito confortável de criação”.

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Um resultado intenso como o apresentado neste disco pede por uma criação complexa e bem-trabalhada. A cantora explica que foram “processos de criatividade bem deslocados” em relação ao esperado: “Quando eu vi, tinha um disco com assuntos em comum, embora canções bem diferentes entre si”.

“Fui pescando e entendendo o porquê eu estava escrevendo daquele jeito. Fui me relacionando com a palavra através dos prazeres. Foi muito bonito, como artista, poder ter o tempo de observar essa obra sendo construída, inconscientemente em um primeiro momento”, acrescenta.

As canções do disco são autorais, com exceção do primeiro single, “Receita Rápida”, uma música original de Itamar Assumpção e Vera Lúcia Motta. A faixa não havida sigo gravada fonograficamente pelo pai da cantora, porém. 

Serena Assumpção também fez parte da criação do álbum. A cantora e compositora, irmã de Anelis, morreu em 2016 em decorrência de um câncer de mama: “Taurina  tem muito dela. Fiz muitas músicas com ela viva, mas já doente. Outras apareceram pouco depois que ela morreu, talvez inspiradas pela morte, pela finitude e por esse aleijamento que é perder uma irmã”, afirma. 

Aclamadíssimo pela crítica, Taurina  foi eleito pela própria Rolling Stone Brasil como o 14º melhor disco brasileiro de 2018, e a Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) o colocou entre os 25 melhores álbuns brasileiros do primeiro semestre de 2018.

“Foi muito lindo. Estou bastante saudosa com toda essa situação nova. Talvez isso nunca mais aconteça, ou aconteça de uma forma melhor, mas infelizmente o cenário não está desenhando isso. [...] É um disco que me orgulha muito. Gosto de todos os meus discos, mas talvez Taurina seja o mais maduro até aqui”, reflete.

Enquanto artista após o lançamento do álbum, Anelis Assumpção se vê de diversas maneiras: mais medrosa, mais madura, mais realizada, diferente, triste, feliz, não-estacionada, instigada.  

"É uma realização muito potente. Penso: ‘Ok eu vim até aqui’. Até Taurina, talvez eu tivesse mais dúvidas em relação ao meu artístico. Talvez esse disco tenha me colocado em um eixo mais seguro em que posso dizer: 'Sim sou uma artista, sou uma compositora. Sou uma mulher que canta o que compõe'. Me vejo mais livre", conclui.


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Reinvenção na pandemia e responsabilidade nas redes sociais

Desde 2020, o mundo precisa aprender a se adaptar ao novo normal devido à pandemia de coronavírus e à necessidade do distanciamento social. Para Anelis Assumpção, é um processo de reinvenção.  

A cantora conta que compôs menos e escreveu bastante, embora “sem muito prazer nos resultados”. Anelis ressalta que, de fato, em um primeiro momento, todos nós precisávamos “dar espaço para sobrevida e para adaptação” e encontrar uma nova rotina e um novo modo de trabalhar.

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“Tivemos que nos adaptar a novas linguagens, trazer o show para tela, se comunicar por ela e descobrir uma forma criativa de fazer isso. E não é nada muito rápido para uma taurina. Talvez eu tenha ficado um pouco mais introspectiva em alguns aspectos, mas a própria situação também pode ter me forçado a desenvolver uma não-introspecção”, explica.

Devido ao distanciamento social, o contato entre as pessoas se deu principalmente através das redes sociais. Sobre a comunicação online, Anelis afirma: “Fiz muito mais lives e me comuniquei virtualmente muito mais do que o meu normal meu comum nas redes sociais. Trabalhei através disso e descobri potências criativas desse lugar.”

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Figura muito importante nas redes sociais, a cantora é verdadeira com as convicções e disposta a falar quando necessário. A compositora reflete, inclusive, sobre a responsabilidade enquanto pessoa pública na internet.

"Estamos entendendo o significado de se comunicar através das redes. Quando me comunico pelas redes é para muitas pessoas. Mas, falo da mesma forma como converso com meus filhos e amigos. São meus pensamentos em relação ao que acredito. É uma maneira de firmar minhas verdades como uma pessoa que acredita em um pensamento mais comunitário, e menos capitalista e egoico", afirma. 

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Ela acrescenta: "Me sinto responsável de alguma forma quando percebo como meu pensamento e a minha reflexão influem e provocam. Entendo a partir desse momento que ali [nas redes sociais] não é um lugar para falar coisas irresponsáveis. Na verdade, é preciso saber arcar com o que falamos e pensamos."

Curiosamente, as reflexões de Anelis têm um alcance maior do que a imagem, mas não foi uma ação proposital ou pensada, "foi um desdobramento da própria comunicação que acontece hoje em dia."

Por fim, ela conclui: "Tento me manter responsável, mas também o tempo todo lembrando que não posso, nem eu, nem nenhuma pessoa, ser responsável por uma nação e por um pensamento social. É preciso compreender também que podemos falhar nesse lugar [redes sociais] e falhamos bastante."


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