Philip Seymour Hoffman - AP/Andrew Medichini

Philip Seymour Hoffman, 1967-2014

O ator ganhador do Oscar, conhecido por interpretar perdedores irresistíveis, deixa para trás o legado de um trabalho que partiu o coração e deu socos no estômago do espectador

David Fear Publicado em 03/02/2014, às 15h17 - Atualizado às 15h22

Você deve tê-lo notado brevemente no papel de um estudante em Perfume de Mulher, ou como o operário parceiro de John Cusack em Dinheiro, Pra Que Dinheiro? Ele pode ter te impressionado como um caçador de tempestades movido a cafeína em Twister. Mas a primeira vez que você provavelmente viu Philip Seymour Hoffman – realmente o viu, o enxergou na tela –, foi em Boogie Nights – Prazer Sem Limites. O papel dele, Scotty, era o de um assistente de produção de um filme pornô dos anos 1970, um homem pouco inteligente sempre à espreita nos arredores. Há um senso de inocência e vulnerabilidade na atuação de Hoffman. O que falta ali é qualquer resquício de ego de ator. O personagem é um completo e impassível perdedor. Você quer empurrá-lo para longe e abraçá-lo ao mesmo tempo. Você não consegue tirar os olhos dele.

Veja a carreira de Philip Seymour Hoffman em fotos.

Nenhum ator contemporâneo era melhor em fazer o espectador sentir simpatia por idiotas, homens cheios de falhas, desajeitados, porcos, mesmo que – não, na verdade, especialmente se – ele os interpretasse colocando no centro todas as piores qualidades deles. Mas Hoffman conseguia dar um sopro de vida a qualquer personagem que pegasse para si.

Quando começou a circular a notícia de que o ator havia sido encontrado morto no apartamento dele em Nova York, no domingo, 2 de fevereiro, como resultado de uma provável overdose, começou a se formar uma interação na internet aos moldes do modelo de Kübler-Ross: “Por favor, que isso seja apenas um boato”; “Meu Deus, acho não que é um boato”; “Descanse em paz”. Mas o que ficou não foi apenas o choque genuíno que tomou conta do universo do Twitter, mesmo que Hoffman já houvesse admitido um problema com drogas no passado. Foi o senso de uma perda pessoal entre os fãs – amigos atores e cinéfilos medianos – que fez esse acontecimento todo parecer, de alguma maneira, diferente. Hoffman não apenas fez você acreditar que ele era Truman Capote, o papel que rendeu a ele o Oscar, ou o vilão megalomaníaco de Missão: Impossível III. Ele fez você sentir uma conexão com essas pessoas, não importa o quão distantes ou fantasiosas elas fossem. Ele fez você sentir por elas, ponto final.

Se você por um acaso passou algum tempo com ele em um nível pessoal, deve pensar sobre o quão incrivelmente generoso e gentil Hoffman podia ser. Há uns meses, eu e um grupo de amigos estávamos em hotel, em uma festinha de um festival de cinema, quando decidimos subir as escadas e ir até o bar no topo do prédio. Quando chegamos lá, ali estava Hoffman, sozinho, longe de todas as celebridades e baladeiros que estavam no andar de baixo; ele estava apenas ali, na varanda, de calça jeans e camiseta, tirando fotos da vista com o celular. Meu amigo decidiu ir até o ator para dizer o quanto amava Quero Ficar com Polly (2004), uma comédia menos conhecida de Ben Stiller, na qual Hoffman atuou. Imploramos a nosso amigo que não o importunasse; sem vergonha por conta da bebida, ele foi até lá e abordou Hoffman, enquanto nós nos viramos, fingindo que não tínhamos ideia do o que estava acontecendo.

Hoffman agradeceu pela gentileza e começou a conversar; logo, ele andou até o resto de nós e se apresentou. Então, falou conosco por bons 20 minutos, contando histórias da companhia de teatro LAByrinth, da qual ele fez parte em meados dos anos 1990, perguntando o que havíamos achado da exibição de O Mestre, olhando os pôsteres estrangeiros do filme que tínhamos em nossos celulares (“Oh, eu amei esse, preciso conseguir esse!”, ele disse sobre um pôster polonês particularmente artístico). Então, deu boa noite a todos e vagarosamente caminhou de volta para onde estava, completamente sozinho.

A trajetória de Philip Seymour Hoffman em dez filmes.

Ficamos embasbacados com o papo. Um de nós se questionou se ele sempre conversava com fãs em eventos desse tipo. Outra notou que, ali em cima, isolado da festa e das pessoas, Hoffman aparentava apenas estar muito, muito solitário. Todos concordamos, e descemos as escadas. Ele acenou, nós acenamos de volta. Ele então voltou a olhar para o horizonte noturno de Manhattan.

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