Em The Next Day, músico inglês faz uma retrospectiva e segue em frente com álbum irônico, reflexivo e cheio de guitarras
Rob Sheffield/Tradução: Ligia Fonseca Publicado em 01/03/2013, às 10h06 - Atualizado às 19h56
David Bowie já cantou uma música ou duas sobre o espaço sideral, mas “The Stars (Are Out Tonight)” é uma das melhores que ele compôs, elevando-se em guitarra, cordas e aquela voz inconfundível. Ele canta sobre dois amantes olhando para o céu à noite, onde veem todo o universo em plena atividade: “We will never be rid of these stars/But I hope they live forever” (“Nunca nos livraremos destas estrelas/Mas espero que elas vivam para sempre”). Eles sentem a poeira estelar em seus corações acender e, de repente, percebem que são parte do cosmos, simplesmente por estarem juntos. É como se Bowie decidisse fundir “Heroes” com “Space Oddity” na mesma música, um feito que nunca tentou. Caramba, David Bowie.
David Bowie está na capa da edição 77 da Rolling Stone Brasil. Veja aqui.
É um momento triunfante em um álbum triunfante. The Next Day é o retorno que os fãs de Bowie temiam nunca acontecer. Depois que um problema de saúde acabou com sua turnê em 2004, ele se isolou e a maioria de nós achava que o Thin White Duke tinha finalmente cantado seu último rock. Nem os fanáticos por Bowie conseguiam se ressentir da aconchegante aposentadoria de seus anos dourados.
Só que Bowie e aconchego não são os melhores amigos. Em janeiro, em seu 66º aniversário, ele chocou a todos ao anunciar que tinha um novo álbum pronto. As sessões de The Next Day foram ultrassecretas. Ninguém tinha feito isso dessa maneira: atingir um pico criativo, tirar 10 anos de folga e voltar de surpresa.
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The Next Day tem uma forte conexão com o período no final dos anos 70, quando Bowie e o produtor Tony Visconti fizeram a trilogia de Berlim com Low, “Heroes” e Lodger. Também tem o ataque de guitarras de registro grave de Scary Monsters. As músicas estão no modo reflexivo de seus excelentes (embora absurdamente subestimados) discos da meia-idade: Earthling e Hours, do final dos anos 90, e Heathen e Reality no início dos anos 2000. As guitarras afiadas se encaixam nas músicas – irônicas, comoventes, adultas, resistentes à histeria piegas ou ao sentimentalismo exagerado.
“The Next Day”, a canção, define o tom do álbum desde os primeiros momentos, enquanto Bowie rosna “Here I am, not quite died/My body left to rot in a hollow tree” (“Aqui estou, não morri exatamente/Meu corpo deixado para apodrecer em uma árvore oca”). Embora cante “I can’t get enough of that doomsday song” (“Não me canso daquela música do juízo final”), Bowie nunca soou tão longe deste dia. Em vez disso, vai de um desabafo furioso antiguerra (“I’d Rather Be High”) à compaixão pela juventude perdida (“Love Is Lost”) e ao amor no casamento (“Dancing Out in Space”). O álbum termina com o zumbido eletrônico entorpecido de “Heat”, enquanto ele repete as palavras “I tell myself/I don’t know who I am” (“Digo a mim mesmo/Não sei quem sou”).
Embora cante na maior parte de The Next Day em sua voz de rock com staccato, Bowie contém sua teatralidade incendiária em duas grandes baladas, o doo-wop gótico de “You Feel So Lonely You Could Die” e a majestosa canção de amor em estilo New Romantic “Where Are We Now?” Todo o álbum evoca “In My Life”, de seu velho amigo John Lennon – de certa forma, cada música aqui poderia ser uma sequência dela. Há toneladas de referências musicais e líricas a seu passado, enquanto Bowie relembra os lugares aonde foi e os rostos que viu. Só que ele está decididamente mirando o futuro, e quando atinge os picos delirantes de “The Stars (Are Out Tonight)”, faz o futuro soar irresistível.
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