Ao violão, ex-Titãs regrava canções conhecidas do Rei em 'Não Sou Nenhum Roberto Mas às Vezes Chego Perto'
Pedro Antunes Publicado em 19/04/2019, às 07h00
Nos tempos da paquera por mensagens via Instagram, Nando Reis se propõe a uma volta no tempo. Do "alô" dito engasgado ao atender uma ligação (que coisa mais anos 1990!) e perceber, do outro lado da linha, está quem se ama. Desesperado, ele pede:
"Diga logo de uma vez / O que você quer de mim / Não me torture mais / Não me faça mais sofrer / Insistindo em me dizer / Que pensa em mim demais", na estrofe que abre "Alô", música de Não Sou Nenhum Roberto Mas às Vezes Chego Perto, o novo disco de nome sagaz de Nando Reis, inteiro dedicado à obra de Roberto Carlos, com canções entre 1971 e 1994, lançado nesta sexta-feira, 19.
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Em tempos de amores líquidos, de flertes iniciados com a escolha de passar o dedo para a direita em um aplicativo de paquera em busca de um "match", de ex-namorados bloqueados nas redes sociais e das fotos deletadas dos aparelhos celulares, Nando prefere ser démodé.
Ainda bem.
O ex-Titãs, dono de tantas canções poderosas na sua carteira de músicas próprias, se entrega ao coração de outro compositor e, como intérprete, se coloca a sentir amores que não os seus. Mas, no fim das contas, são - são dele, meus, seus.
Entre tantas relações descartáveis, da música de plástico e dos feat desnecessários em buscas de likes, Nando faz da sua homenagem a Roberto Carlos uma sublime obra sobre o amor.
"Você me mostrou o amanhecer de um lindo dia, me fez feliz, me fez viver", ele canta, em "Você em Minha Vida". A canção também trata do momento do desamor, da metáfora que a partida do(a) amado(a) traz o anoitecer, mas paremos um momento para entender de que tipo de amor palpável Nando opta em cantar.
Mostrar o "amanhecer de um dia lindo" requer contato, pede pela noite virada em claro, entre papos (e talvez amassos), também pede pela dedicação e pelo tempo sem pressa. Há quanto tempo um amor não fez você acordar (ou sequer dormir) e se perder pelos minutos acompanhados, a observar o dia nascente pela janela do quarto?
Com a produção de Pupillo e a direção artística de Marcus Preto (que dupla genial, aliás), Não Sou Nenhum Roberto Mas às Vezes Chego Perto é mais que um disco de de amor fora de tempo e espaço de um cantor que, pós-Jovem Guarda, descobriu-se romântico ao extremo, feito por outro artista, também bom cantar amores e desamores.
O encontro de Roberto Carlos e Nando Reis desvia dos espinhos da política conturbada do País para lembrar que o amor ainda é uma das mais poderosas forças para transformar a arte e a vida (a ordem dos fatores é desimportante aqui).
Nando revisitou os álbuns do Rei em uma viagem para Jaú, no interior de São Paulo, com a esposa Vânia. A voz de Robertão, dos anos 1970 a 1990, acompanhou a própria história dele. Na bagagem, levou uma dezena de discos de Roberto da sua fase mais terna. Tocou-o ao violão para a esposa. Deu o clique na cabeça ruiva do músico: seu 13º da carreira solo seria dedicado à esse repertório.
A faixa coberta por Nando e banda é da fase considerada "Roberto adulto", com as canções derramadamente entregues e românticas - embora não seja um álbum só dedicado aos corações feridos. "Nossa Senhora", clássico devoto de Robertão, por exemplo, é reinventada dentro do espectro ateu do ruivão. Os versos foram trocados por "na-na-ná" por respeito à fé que não é sua.
Ao seu lado na empreitada, o ruivo teve Guilherme Monteiro (guitarra), Lucas Martins (baixo), Mauricio Fleury (teclados) e Pupillo na bateria.
Eles são o núcleo duro do álbum, responsável pela base, mas o disco também traz participações de Edgard Scandurra (violão em "Alô" e guitarra em violão em "De Tanto Amor"), Leo Mendes (violão em "Nossa Senhora"), Jorge Mautner (voz na excelente "A Guerra dos Meninos"), Alex Veley (teclados de "Amada Amante") e Leonardo Matumona (vocais em "Todos Estão Surdos"). As cordas foram arranjadas por Felipe Pacheco Ventura. Já os arranjos de metais são de Tiquinho.
Nando, Pupillo, Preto e companhia pegam essas pouco mais de duas décadas de canções do Rei, quase todas românticas, e trazem uma unidade sonora à elas também. Conectam a espalhafatosa "Alô", de 1994, à "De Tanto Amor", do disco clássico de Robertão, de 1971.
Posicionadas em sequência, como primeira e segunda músicas do disco, elas entregam a mensagem principal ali em Não Sou Nenhum Roberto Mas às Vezes Chego Perto. O o amor é atemporal e único. Não importa o tempo, a roupa, o modo de amar, se é por app, mãos dadas, voraz, suado, cândido ou poético. Ele, o amor, é um só. Nando é certeiro e faz bem ao nos lembrar disso mais uma vez.
Ouça o disco Não Sou Nenhum Roberto Mas às Vezes Chego Perto em todas as plataformas aqui.
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