O comediante que afirma: "O Didi atropelou o Renato Aragão" - DIVULGAÇÃO

Se Os Trapalhões existisse atualmente, “seria o maior sucesso da televisão”, diz Renato Aragão

O eterno Didi, que acaba de completar 80 anos, fala ainda sobre as críticas que sofreu recentemente e reclama do meme “no céu tem pão?”

Redação Publicado em 13/01/2015, às 20h08 - Atualizado às 20h32

“É mais uma etapa, um acidente geográfico”, diz Renato Aragão sobre completar 80 anos nesta terça, 13. “São as pessoas que me alertam de que eu fiz 80 anos, eu não percebo que tenho essa idade, que sou um senhor. Na verdade, adquiri foi muita experiência na vida e na carreira”, completa o ator, hoje indissociável do personagem Didi, que integrava o quarteto Os Trapalhões.

O mais novo octogenário do entretenimento chega a esse momento ainda se desafiando. Depois de décadas a fio como um ícone da televisão e do cinema, Aragão fez sua estreia no teatro ano passado, ao lado do amigo e colega de Os Trapalhões Dedé Santana. No último fim de semana, enquanto estava no palco durante o musical Os Saltimbancos Trapalhões, ganhou uma homenagem capitaneada pela filha adolescente, Lívian, que o deixa emocionado até agora. “Não desconfiei de nada! Armaram com todos os artistas, com a TV Globo. Na história, minha filha faz papel de menino e depois se revela como mulher. Nessa hora de se revelar, ela veio falar que ia homenagear uma pessoa que faz aniversário, entrou bolo, não sabia de nada”, conta, ainda contente. “Nunca pensei em fazer teatro. De repente fui encarar esse desafio. E está indo muito bem, estão aceitando muito. Gostei muito desse presente de aniversário.”

Aragão, acima de tudo, se mostra lisonjeado com o carinho do público. “Talvez seja o Didi mais do que eu. Ele completa 55 anos, já se misturou com o Renato Aragão, me dá força. E o público também me dá força. É uma responsabilidade muito grande ter passado pelas três gerações que o Didi passou”, afirma. “Não posso dizer que vou me aposentar. Até pode ser. Mas não agora.”

Ao longo de 2014, Aragão deu muitos sustos no público, virando manchete por causa de problemas de saúde graves relacionados a um infarto e a uma infecção urinária. Segundo ele, sua inquestionável fé, sempre demonstrada ao longos dos anos, é uma das razões para não se deixar abater. “É o que me dá animo de alcançar mais uma idade. Não sei mais quanto tempo vou viver depois dos 80, mas não tenho medo de nada. Cuido da alimentação, da saúde, que é para ter uma longevidade, mas não sei quem é que calcula isso”, diz.

Lembrando a importância de Didi Mocó para a própria carreira e para a história do humor no Brasil, Aragão justifica o sucesso do personagem com as características mais marcantes dele. “Não sei se é a ingenuidade, aquele humor simples, que não quer ofender ninguém – por mais que haja um policiamento. É humor limpo, família.” O tema, inevitavelmente, o faz cair na entrevista recente que deu para a revista Playboy e que foi motivo de muito debate nas redes sociais. Na entrevista, ele afirma que, antigamente, homossexuais, negros e gordos não se ofendiam da forma como acontece atualmente.

“Isso tudo não foi dito. Alguém não leu tudo. É que eu fazia uma brincadeira com o Mussum: ‘Ô, Paraíba’, ‘Ô, Negão’. Não era para ofender uma classe”, reforça, tentando “justificar” que “a ofensa era entre eles”. “O sucesso se tornou o oitavo pecado capital”, declara. “Você não pode fazer sucesso que as pessoas começam a inventar. Nunca tentei ofender ninguém. Ao contrário, eu quero é conquistar! Deus me livre fazer uma piada que vai afastar qualquer alguém. Eu amo os negros, homossexuais, os gordos.”

“Eu fui quem mais sofreu preconceito na vida como comediante e ator”, continua. “Eu sempre fui discriminado por fazer esse tipo de humor [mais simples]. Não liguei para isso, quanto mais criticavam, mais aumentava a bilheteria. O povo sempre teve carinho comigo e me defendeu. Alguém que ofende tem que ser criticado mesmo. Nem queria falar sobre esse assunto porque as pessoas gostam de levantar polêmica. Mas vou repetir mais uma vez: eu nunca ofendi negros, homossexuais, gordos, nem ninguém. Levantaram essa lebre contra mim.”

Quando os papéis se invertem e Aragão fala sobre se sentir ofendido por outras pessoas, é ele quem se revolta ao lembrar da repercussão da história-triste-que-virou-meme “no céu tem pão", um vídeo compilando as diversas ocasiões em que Renato Aragão narrou o episódio verídico de uma criança que, antes de morrer de fome, perguntou se no céu havia pão. E Aragão ainda não perdoou.

“Esse pessoal é muito maldoso, isso foi uma realidade que aconteceu. Deviam ir passar fome lá no Nordeste, ver uma seca...", diz Aragão, irritado. "Dois anos seguidos de seca e teve uma criança que falou isso para a mãe porque não tinha o que comer. Que maldade, que sacanagem, fiquei muito triste com isso, as pessoas ficarem zombando do falecimento de uma pessoa com fome.”

Saudade

Nenhum tópico passa pela boca do ator sem que ele lembre da saudade que tem d’Os Trapalhões. Sempre categórico em afirmar que jamais retomaria o grupo sem Mussum e Zacarias, que morreram em 1994 e 1990, respectivamente, ele tenta imaginar como seria o programa da trupe hoje, uma época em que o humor é recebido de uma forma completamente diferente. E não se acanha em dizer: “Seria o maior sucesso da televisão hoje”. Mesmo em outros tempos? “Eu poderia sofrer preconceito, como sofremos”, diz, afirmando que seria tudo igualzinho. “O nordestino sofrido, o galã da periferia, que é o Dedé, o “negão” da mangueira, o Mussum, e aquele menininho mineiro que não queria crescer [Zacarias]. Era a cara do Brasil.”

Ele ainda lembra com nostalgia de uma das encenações preferidas daquele período. “Não sei contar piada, eu sei encenar piada. O Didi é sempre Didi, o que muda é a situação em volta dele. O que foi mais marcante para mim são aqueles clipes que fazia. Sidney Magal, Maria Bethânia, Ney Matogrosso”, relembra, afirmando que adoraria fazê-los de novo.

Passado e futuro

Se o legado de Renato Aragão após mais de meio século de carreira é imensurável e difícil de resumir, o aniversariante não tem dificuldade em apontar com precisão de onde vem a inspiração pessoal.

“Os maiores de todos os tempos? Oscarito, no Brasil. Universalmente, o [Charles] Chaplin. Eles são gênios. É a única definição que posso te dar. São gênios inimitáveis.” Já nos dias de hoje, Aragão reforça o apreço que tem pelo trabalho do grupo Porta dos Fundos. Eles são muito bons, maravilhosos! Falam tanto palavrão... é isso que digo quando falo que é pesado. Porque eles não precisam falar, são muito bons. Estão começando um novo marco de humor”, crava.

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