- Alice Cooper no Rock in Rio 2017 (Foto: Diego Padilha/I Hate Flash/Divulgação)

Strippers, Drag Queens e cachorros dançantes: a festa que lançou Alice Cooper em 1971 [FLASHBACK]

O novo livro de Peter Ames Carlin, Sonic Boom, traça um panorama da ascensão da Warner Bros. Records de forma bastante detalhada

Rolling Stone EUA. Tradução: Marina Sakai | @marinasakai_ sob supervisão de Yolanda Reis Publicado em 03/02/2021, às 18h27

Havia gravadoras de discos comuns, e então havia a Warner Brothers. Durante a cena musical dos anos 1960 e 1970, a Warner Brothers — junto com suas marcas associadas como a Reprise e Sire — conquistaram a reputação de assinar alguns dos artistas menos convencionais do pop.

Melhor, a gravadora — e executivos como Mo Ostin, Joe Smith e Lenny Waronker — permitiram aos músicos a liberdade de evoluir no estúdio sem muitas limitações. Jimi Hendrix, Joni Mitchell, Neil Young, Van Morrison, Grateful Dead e Randy Newman eram alguns nomes da primeira onda de talento da marca, seguidos por Prince, Madonna, Van Halen, Devo e os Replacements.

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O resultado foi um período de música inovadora, e também de muito lucro para todos os envolvidos — e muitas maneiras de gastá-lo e aproveitar o excesso. Neste trecho de Sonic Boom: The Impossible Rise of Warner Bros. Records from Hendrix to Fleetwood Mac to Madonna to Prince (em tradução livre: Sonic Boom: A impossível ascensão da Warner Bros. Records desde Hendrix até Fleetwood Mac a Madonna e Prince), de Peter Ames Carlin, a gravadora — especialmente o publicista principal Bob Regehr, em parceria com o empresário da banda Shep Gordon — decide lançar uma nova atração chamada Alice Cooper em 1971.

Alice Cooper, banda de hard rock composta por cinco pessoas e conhecida por não respeitar as delimitações de gêneros na hora de se vestir, com seu vocalista parecido com um personagem de um filme de terror (futuramente, ele usaria o nome da banda para si próprio), passou por um período difícil durante os primeiros anos na Warner/Reprise.

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O grupo, primeiro, assinou com Frank Zappa em sua gravadora Bizarre/Straight, distribuída pela Warner, e os dois primeiros discos da banda não foram bem, também por conta do desinteresse de Zappa no conjunto. Alice Cooper também não se ajudou quando Gordon arrebanhou um grupo de executivos da Warner/Reprise para assistir uma performance no Whisky a Go Go e, durante a apresentação que deixou a desejar, o baterista conseguiu cair do palco. Um show terrível.

Gordon, aos 22 anos, entretanto, estava convencido do potencial do grupo. Então, quando oferecida a oportunidade de abrir uma turnê nacional no verão de 1970, apenas não receberem o dinheiro da turnê e precisarem dos parceiros de Zappa da Bizarre/Straight, o empresário decidiu levar a situação para o escritório central da Warner.

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Gordon reuniu a banda, comprou tacos no caminho para Burbank, esperou Joe Smith sair para almoçar, e reuniu suas tropas para invadir a sala do presidente da gravadora, onde, carregando seus tacos, esperaram esticados nas poltronas.

Quando o executivo retornou, Gordon o cumprimentou e se apresentou. Prometeu permanecer parado ali até Smith voltar com o dinheiro necessário para a turnê. Caso contrário, Smith poderia ligar para a polícia e jogá-los para fora. Assim, entretanto, o ocorrido se tornaria público, e Smith não gostaria de ler notícias sobre como expulsou uma de suas próprias bandas do prédio.

Smith pensou por um tempo e acenou com a cabeça. “Você tem coragem,” disse a Gordon, com respeito evidente em sua voz. “Venha comigo.” Smith levou o empresário ao escritório de finanças e pediu o cheque.

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A turnê foi bem, e com o dinheiro para produzir um novo single, Alice Cooper ressurgiu com a melodiosa “I’m Eighteen," conto de frustração adolescente (a música entrou raspando no Top 20 singles da Billboard).

Transferida da Bizarre/Straight para a Warner/Reprise, a banda viu seu terceiro disco, Love It to Death (1971), escalar até o número 35 em março do ano de lançamento. Nele, os músicos trocaram as influências psicodélicas pelo hard rock inspirado em quadrinhos de terror, sátira e transgressões sexuais, colocando-os na vanguarda do florescente gênero do glam rock.

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Era uma combinação potente, mas como a Warner/Reprise poderia destilar sua essência em uma campanha promocional para chamar a atenção da imprensa? Bob Regehr era o mais preparado para lidar com esse problema.

Regehr e Gordon entraram em uma sessão de brainstorming e tiveram a ideia de fazer um baile de debutante para a personagem Alice Cooper no elegante Ambassador Hotel, onde todas as melhores famílias de Los Angeles celebravam o começo das vidas sociais de suas filhas. Os gerentes do Ambassador nunca permitiriam se soubessem o real propósito do evento, então Regehr pediu para sua assistente, Shelley Cooper, quem tinha a voz e atitude mais adequadas, lidar diretamente com o hotel.

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Ninguém poderia dar indícios da real identidade da debutante, uma das bandas de rock & roll mais doidas do momento. Para se certificar da presença de Mo Ostin e Joe Smith, Regehr marcou o evento para a noite de 14 de julho, data do aniversário de Evelyn Ostin. 14 de julho também era o Dia da Bastilha na França. Não sabiam disso, mas usaram o fato também, por quê não?

Com tudo decidido, começaram a trabalhar nos detalhes. Foi quando tudo começou a ficar interessante, e caro. As contas chegaram a US$ 7 mil, um número muito alto para um único evento em 1971, e Smith ficou preocupado. Regehr lhe deu alguma explicação, e disse à Shelley Cooper para parar de enviar as contas ao financeiro enquanto a festa não tinha acontecido. “Se for um sucesso, não vão ligar,” explicou. “Se não for, seremos demitidos de qualquer forma.”

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Contrataram uma banda de dança tradicional, adquiriram um bolo de casamento grande o suficiente para alguém pular para fora dele, alugaram um par de fantasias de gorilas e contrataram, entre outros animadores, um cachorro treinado para fazer truques inusitados, uma cantora/stripper de 135 kg chamada TV Mama e uma trupe de Drag Queens de São Francisco conhecidas como Cockettes. Enviaram convites para centenas de pessoas da indústria e figuras da imprensa, pedindo um traje formal, ou “apropriado”.

Regehr tinha especificado: a debutante, a jovem Miss Cooper, preferia uma sala cheia de lustres, então os gerentes do Ambassador fizeram acontecer. Quando a grande noite chegou, alguns convidados vieram usando vestidos e smokings e outros vestiam roupas mais casuais.

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O ator Richard Chamberlain estava lá, assim como os artistas da Warner Bros. Rod McKuen, Randy Newman, Gordon Lightfoot, John Kay do Steppenwolf, Donovan, Cynthia Plaster Caster e alguns outros nomes da marca, junto com dúzias de escritores, repórteres, críticos e figuras da indústria.

As fantasias de gorila foram dadas a dois garçons, colocados na porta para cumprimentar os convidados com bandejas de prata cheias de aperitivos. A Sinfônica Edward Gould tocava versões alegres de “Moonglow,” “Somewhere My Love,” e outras, enquanto casais dançavam diante dela.

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Quando a hora chegou, o público se reuniu na sala principal, para a grande surpresa das damas vestidas de chiffon e os cavalheiros de smoking. A sinfônica então tocou “Pomp and Circumstance” para começar a procissão. 

Primeiro, vieram as Cockettes, uma dúzia de homens maquiados de vestidos e saltos muito altos. Um estava vestido como se estivesse em uma boate, com uma bandeja carregando cigarros, charutos e tubos de Vaselina. Depois, veio o cachorro andando em suas patas traseiras e empurrando um carrinho de bebê com as dianteiras. Talvez estivesse usando um chapéu de festa; as lembranças variam.

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TV Mama, a cantora/stripper de 135 kg, veio depois, usando vestido de seda branco e preto para destacar seus prodigiosos bens. Finalmente, veio Alice Cooper, os cinco integrantes da banda vestidos de smoking, um se destacando pelo rímel em quantidade, e bochechas com muito pó, agachando para pegar uma das rosas jogadas em sua frente. Então, a festança começou, abastecida pelos open bars e a droga causando fungação nos banheiros.

Mo e Evelyn Ostin chegaram junto com Joe e Donnie Smith, Ahmet Ertegun e a namorada do momento. A chegada de Evelyn provocou um refrão de “Parabéns para você”, liderado por TV Mama, cantando, dançando e chacoalhando seus bens perto da aniversariante o máximo possível. 

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Quando tudo terminou, Evelyn gritou no ouvido de Joe Smith: “Deveríamos estar aqui!?” Smith gritou de volta: “Onde mais no mundo você gostaria de estar!?” Evelyn disse algo inaudível quando o topo do enorme bolo de aniversário foi retirado. Miss Mercy, a integrante da banda GTO colocada dentro do bolo, cansou de esperar sua hora e saiu explodindo. Então, começou a encher as mãos de glacê e jogá-lo nos convidados, muitos deles não hesitando em jogar de volta.

Alice Cooper tocou, e quando os relógios foram além da meia-noite, prevaleceu um caos risonho. O poeta McKuen, um borrão de cabelos cinza, nariz aquilino e smoking sob medida, subiu na mesa e começou a despedaçar um dos lustres, enquanto as garotas do cigarro dos Cockettes retornavam com bandejas cheias de pênis de plástico multicoloridos, muitos emprestados rapidamente para casais animados para testá-los. Em algum lugar fora de visão, uma Cockette havia trocado seu vestido por uma das fantasias de gorila e com ela, saiu do hotel e foi vista pela última vez na Sunset Strip galopando na madrugada.

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Quando Regehr voltou ao escritório na manhã seguinte, sua mesa estava cheia de mensagens raivosas do gerente do Ambassador Hotel ("Você quebrou nosso lustre!"), da companhia de aluguel de roupas ("Você roubou nossa fantasia de gorila!"), do chefe do gerente do hotel ("Você quebrou nossa dignidade!"), e alguns outros mais. Mas elas foram esmagadas por mensagens sobre a avalanche de cobertura de mídia sobre a festa de Alice Cooper.

O Los Angeles Times planejou uma inclusão grande para a banda no jornal. As agências de notícias espalharam a história para jornais ao redor do país, enquanto revistas falavam das  experiências na festa, todas celebrando como a Warner/Reprise conseguiu lançar outra banda hit.

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O tsunami de publicidade trouxe o álbum Love It to Death, com três meses de vida, de volta aos recordes, onde permaneceu até o fim do ano trilhando o caminho para vender 1,2 milhões de cópias. Killer (1971), lançado por volta do Dia de Ação de Graças, foi até o número 21 na lista de discos.

O próximo single da banda, "School's Out,” subiu para o Top 10 em maio, desencadeando a chegada do álbum de mesmo nome, lançado um mês depois, ao número 2 na lista de discos e mais de um milhão de cópias vendidas. Como Regehr previu, ninguém nunca perguntou quanto a festa custou.

Trecho extraído do livro Sonic Boom: The Impossible Rise of Warner Bros. Records from Hendrix to Fleetwood Mac to Madonna to Prince. Lançado nos EUA pela Henry Holt e Company em janeiro de 2021. Copyright de Peter Ames Carlin, todos os direitos reservados.

+++ PAI EM DOBRO | ENTREVISTA | ROLLING STONE BRASIL

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