Dylan, fotografado no show da quarta-feira, 5 - Marcos Hermes/Divulgação

Tempos Modernos

Bob Dylan declama e desconstrói clássicos em SP

Por Antônio do Amaral Rocha Publicado em 07/03/2008, às 15h04 - Atualizado às 15h18

Foi a quarta vez que Bob Dylan se apresentou no Brasil: a primeira foi em 1990, no Hollywood Rock; depois em 1991, em turnê por São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre; e a última em 1998, quando abriu para os Rolling Stones. Uma relativa overdose de Dylan, um dos últimos ícones vivos da música dos anos 60, ao lado de Paul McCartney, Mick Jagger e Keith Richards.

Os shows recentes que o músico fez em São Paulo, parte da divulgação de seu mais recente álbum, Modern Times (2006), ajudam a suscitar uma pergunta: as apresentações lotam porque o músico ainda é bom, ou porque o público é generoso com ele? Convenhamos, este Modern Times está mais para Era da Barbárie do que qualquer outra coisa. Na noite de quinta, 6 de março, a platéia do Via Funchal se encontrava lotada de garotos na faixa dos 20 a 30 anos, quarentões e cinquentões - todos na expectativa de uma feliz noite com o maior poeta pop da história da música. E o que se viu durante quase duas horas de apresentação foi um muxoxo generalizado. O público bem que queria, mas Bob Dylan não deu - aliás, sequer falou - "good night".

O show começou pontualmente às 22h, conforme o combinado. Dylan "cantou" três versões irreconhecíveis de seus clássicos ("Rainy Day Women #12 and #35", "Lay Lady Lay" e "I'll Be Your Baby Tonight"), acompanhado de sua banda e ele mesmo tocando guitarra. A iluminação, péssima no início, não deixava ver quase nada de sua lendária figura, mas Dylan - com um chapéu enterrado na cabeça - foi muito aplaudido. Depois disso, foram mais 14 canções com Dylan ao teclado, de lado para o público, cumprindo a aparentemente "chata" função de se apresentar ao vivo.

Dylan não cantou, mas discursou os versos como um autêntico pregador, acompanhado de uma competente banda de cinco elementos. Perdeu-se, assim, o lirismo de suas canções. Declamar é muito diferente de cantar, ainda mais ignorando o público, que entregava energia como resposta ao que era apresentado. Mas Bob não retribuiu. Será que ele não consegue mais cantar, ou não quis se arriscar? Está claro que sua voz já apresenta aquele "cansaço das fibras". A sonoridade do local, cheia de ecos, piorou as coisas.

E como não é assim que Dylan cantava em seus discos, identificar cada canção foi trabalho penoso. Pouca coisa de sua interpretação dava pistas, já que ele pareceu se esforçar para desconstruir sua própria música. É esse o Dylan do século 21 em contraponto àquele Dylan dos anos 60 e 70, 80, 90?

Antes do bis, a platéia se sentiu um pouco recompensada, quando o músico "declamou" "Like a Rolling Stone" e a preencheu com belos solos de gaita. Só então, o público se sentiu encorajado a ficar de pé e a cantar junto, mas já era tarde.

Set List

1. "Rainy Day Women #12 and #35"

2. "Lay Lady Lay"

3. "I'll Be Your Baby Tonight"

4. "Love Sick"

5. "Rollin' and Tumblin'"

6. "Spirit on the Water"

7. "Hard Rain's Gonna Fall"

8. "Honest with Me"

9. "Workingman's Blues"

10. "Highway 61 Revisited"

11. "When the Deal Goes Down"

12. "Tangled Up in Blue"

13. "Ain't Talking"

14. "Summer Days"

15. "Like a Rolling Stone"

BIS

16. "Thunder on the Mountain"

17. "Blowin' in the Wind"

bob-dylan

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