O ex-vice-presidente norte-americano explica como a internet pode salvar o planeta
Al gore passou sua carreira em cargos públicos defendendo duas questões. A primeira - a ameaça do aquecimento global - rendeu a ele um Prêmio Nobel da Paz. A segunda - o potencial político da internet - fez com que fosse ridicularizado.No entanto, desde a eleição de Barack Obama, até republicanos atentos à web começaram a saudar Gore, que faz parte da diretoria da Apple e é consultor sênior para o Google, como um dos primeiros e mais influentes profetas da democracia digital. Andrew Rasiej, fundador do bipartidário Personal Democracy Forum, a maior reunião anual de nerds tecnopolíticos, chama Gore de "poderoso chefão desse movimento político emergente".
Em um belo dia de outono, Gore concede esta entrevista para a Rolling Stone em sua casa em Nashville. Com energia fornecida por um sistema geotérmico e 33 painéis solares, a casa tem um certificado Gold LEED, uma das classificações mais altas atingíveis para o design verde. Usando jeans e uma camisa azul desbotada, com um iPhone vibrando no bolso esquerdo, ele parece mais magro e relaxado do que nos últimos anos. Às vésperas da publicação de seu novo livro, Our Choice: A Plan to Solve the Climate Crisis (Nossa Escolha - Um Plano para Resolver a Crise Climática), Gore reflete sobre a evolução da internet e a sobrevivência do planeta.
Obama escreveu o roteiro sobre como vencer uma eleição usando a internet, mas, um ano após sua posse, muitos acham que sua administração está sendo conduzida à velha maneira de Washington. O que houve?
Basicamente, todo o braço da campanha que utilizou a internet foi cortado do grupo que entrou para a Casa Branca. Eles usaram a internet como uma ferramenta para aumentar a eficácia de seus organizadores de origem popular, e fizeram isso melhordo que ninguém. Só que ainda não conseguiram achar um jeito de passar da campanha para a governança. É uma transição longa e difícil para qualquer político.
O que o senhor diz para as pessoas que se sentem frustradas com isso?
Era inevitável que todas essas grandes esperanças se chocassem com as ainda impressionantes forças de resistência embrenhadas no Poder Legislativo. Pediria que as pessoas responsabilizassem Obama e continuassem com a pressão, mas lhe dessem crédito pelas muitas mudanças que ele já causou. Por exemplo, embora ainda não tenha conseguido aprovar a lei sobre clima no Senado, a EPA [Agência de Proteção ao Meio Ambiente] decretou novas reduções de CO2 e Obama anunciou que novas regras sobre mercúrio entrarão em vigor em 2011.
O que o senhor acha de o presidente Obama ter vencido o Nobel da Paz?
Fiquei feliz. Espero que isso o estimule a ser ainda mais ousado.
Se os blogueiros tivessem tido, em 2000, a mesma influência que têm agora,isso teria mudado o resultado da eleição [Gore perdeu para George W. Bush,que se elegeu presidente pela primeira vez. Na época houve suspeita de fraude eleitoral por parte do vencedor]?,
Meu Deus, sem dúvida nenhuma. Absolutamente.
Então estamos começando a ver o tipo de democracia digital que o senhor visualizou quando entrou no Congresso como um "Democrata Atari"?
A internet está se aproximando do ponto no qual possivelmente eclipsará a TV, permitindo que as pessoas realmente participem da democracia representativa, mas ainda não chegamos lá. Ainda estamos em uma fase na qual a TV domina completamente nossa cultura política, o que possibilita que quem tenha muito dinheiro exerça uma influência enorme sobre o sistema político.
É por isso que o ativismo online ainda não conseguiu estimular ações sobre as mudanças climáticas?
É o exemplo máximo de como o amplo interesse público é oposto ao interesse especial fervorosamente mantido pelos grandes poluidores por carbono. Todo o mundo espera que os Estados Unidos se organizem e se tornem campeões do amplo interesse público ao salvarem o futuro da civilização. Só que o sistema ainda é tão disfuncional e a influência desses interesses especiais é tão obscenamente grande que paralisaram o sistema político a ponto de ele não reagir ao mais poderoso interesse público - a sobrevivência das futuras gerações.
As mesmas ferramentas utilizadas pelos poluidor espor carbono para defender seus interesses?
Não acho que seja por acaso que todo grande movimento de reforma progressiva se baseie na internet. A natureza do meio é tal que ele convida a novas ideias e a um desafio regular à ortodoxia. E isso é bom para a civilização humana nesta etapa da história, em que estamos confrontando essa nova realidade, a relação entre as espécies e o planeta foi alterada radicalmente. Temos de encontrar rapidamente um novo padrão, que não continue o processo de destruição da ecosfera, da qual a vida humana depende. Um dia, quando a internet eclipsar a TV, políticos surgirão em um nível mais alto de complexidade, no qual o papel do indivíduo é recuperado, mas a pessoa tem de lutar por isso e tem de sentir que vale a pena lutar por isso.