B.B. King

O lendário bluesman recorda nomes do blues e do jazz e ainda fala do amigo Eric Clapton

Paulo Cavalcanti

Publicado em 13/04/2010, às 07h30 - Atualizado em 15/05/2015, às 11h28
O bluesman, que visita novamente o Brasil, diz que seguirá tocando enquanto tiver forças - Divulgação
O bluesman, que visita novamente o Brasil, diz que seguirá tocando enquanto tiver forças - Divulgação

Um dos últimos remanescentes da geração de ouro do blues que floresceu depois da Segunda Guerra Mundial, Riley B. King, mais conhecido como B.B. King, ainda está na ativa e sem previsão de descansar - pelo jeito só vai fazer isso quando morrer. Neste mês de março, o cantor e guitarrista de 84 anos nascido no Mississippi passa novamente pelo Brasil. Acompanhado de sua guitarra Lucille, King vai tocar em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Brasília. Aqui, o ícone da guitarra recorda o seu início de carreira, falando de ídolos, influências e pessoas que o ajudaram em sua longa trajetória. E, apesar de ser o embaixador do blues, King também confessa seu envolvimento e paixão por outros estilos musicais correlatos, como gospel e jazz.

Como o senhor se sente ainda rodando o mundo e tocando o blues?

Bem, eu já pensei em me aposentar, eu até cheguei a anunciar isso há alguns anos, mas eu pensei: na verdade não preciso me aposentar. Enquanto tiver forças e saúde, eu vou estar no palco. Além disso, tenho uma banda formidável, a melhor que você pode imaginar. Essa gente precisa de trabalho. Eles têm que trabalhar, isso me motiva a trabalhar também! Moro em Las Vegas, mas ninguém vai ver o B.B. King espreguiçando numa cadeira ao redor de uma piscina!

Como foi a sua descoberta do blues?

É engraçado, porque existe a lenda de que as pessoas ouviam o blues no campo de algodão, mas não foi o meu caso. Minha primeira exposição ao verdadeiro blues foi ouvindo o estilo no fonógrafo de uma tia. Era sempre uma ocasião especial ir para a casa dela, quando eu era adolescente, e ouvir discos de 78 rotações de Blind Lemon Jefferson, Lonnie Johnson e Mississippi John Hurt. Eles eram meus ídolos, na verdade ainda são.

Como foi seu envolvimento com a música gospel?

É, eu quase me tornei um cantor gospel! Quando eu era garoto, minha mãe me levava a uma igreja no Mississippi. Hoje eu sei que era um truque dela, ela queria muito que eu me tornasse pregador. Isso nunca foi minha intenção, mas eu observava muito o pregador, ele também tocava guitarra, ele era um showman. Aprendi muita coisa com ele. Eu cantei e toquei guitarra em quartetos de música gospel por um certo tempo. Viajamos por todo o sul, mas, quando chegou a hora de gravar, rumamos para Memphis, já que lá existiam os melhores estúdios do sul dos Estados Unidos.

O senhor diz que ter ido para Memphis foi um ponto de virada em sua carreira...

Sim, definitivamente, minha carreira efetivamente nasceu lá. Memphis era o lugar para onde a música que eu conhecia e amava convergia. Por lá passavam os melhores artistas de country, blues, gospel e jazz. Eu visitei a cidade pela primeira vez depois da Segunda Guerra, senti o ambiente e voltei para o Mississippi, para me preparar melhor. Lá tinha muita gente boa no ramo, a competição era dura, principalmente na Beale Street, a "Broadway do blues". O tempo que trabalhei lá como DJ serviu para conhecer muita gente, o que me ajudou muito a me profissionalizar. E foi graças a um senhor chamado Sam Phillips [produtor e fundador da Sun Records] que as coisas começaram a acontecer. Ele produziu alguns dos meus primeiros discos e graças a ele aprendi a me movimentar no estúdio, buscar o melhor de mim e da minha guitarra. Deixei minha marca na música de Memphis. Anos depois, conheci lá em Memphis o jovem Elvis Presley, que confessou ser meu fã. Eu não sabia que tinha tantos garotos brancos que rota ouviam o blues!

Fora o gospel, você também sempre teve uma forte ligação com o jazz. Como é isso?

Eu acho que na verdade eu sou um trompetista frustrado [risos]. Em minhas primeiras gravações usei um naipe de metais e eu mantenho isso até hoje, gosto do som de trompetes e saxofones se misturando à minha guitarra e complementando minha voz. Minha primeira grande influencia, antes mesmo de outros nomes do gospel e do blues, foi Louis Armstrong. Eu conheci todos os grandes nomes do jazz, como Benny Goodman, Duke Ellington e Count Basie, eles foram verdadeiros exemplos. Aprendi com eles como ser um bom músico e também tudo o que você precisa saber sobre disciplina e profissionalismo. Ter ouvido as gravações da orquestra do Benny Goodman nos anos 40 foi outro momento importante para mim. Charlie Christian era o guitarrista da banda de Goodman, foi um músico que influenciou toda uma geração.

O seu álbum de maior vendagem é Riding with the King (2000), que gravou com Eric Clapton. Como foi trabalhar com Clapton?

Eu sempre fiquei surpreso quando nos anos 60 todos esses jovens músicos ingleses diziam que eu era o mestre deles. Quando eu conheci Eric Clapton, ele não tinha nem 20 anos. É o maior guitarrista do rock e toca blues como ninguém. Foi uma boa experiência fazer esse disco, não seria nada mal repetir a dose. Riding with the King ganhou disco de platina, ainda está vendendo.

O que significa o blues para o senhor?

Não acho que o blues seja diferente de qualquer outro tipo de música. Eu nunca ouvi música de que eu não gostasse. Desse jeito, também nunca iria tocar música que não me dissesse nada. O blues não é tristeza, não é pobreza, ele deve ser tocado em salas sinfônicas. Para mim, é um aprendizado, um estilo de viver e é como eu ganho meu sustento. Acho que melhoro a cada dia nesse ofício que é tocar o blues.