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Cinema Pessoal

Para superar histórica crise de criatividade, Hollywood aposta fichas na reimaginação e no toque pessoal de nova safra de cineastas

Por Fábio M. Barreto Publicado em 17/06/2009, às 10h07

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Resistir aos encantos do novo longa metragem baseado na franquia Star Trek é inútil. O diretor e produtor J.J. Abrams não apenas revitalizou a franquia com seu estilo imaginativo e arrojado, mas recriou completamente o mítico e cultuado universo de Spock, Kirk e a nave Enterprise. Entretanto, ele é apenas um dos integrantes de um pequeno e influente grupo de cineastas que, caprichando no toque pessoal, transformam em oportunidades uma das maiores crises criativas da história de Hollywood. Graças a nomes como John Lasseter, Christopher Nolan, Guillermo Del Toro e McG, os blockbusters, ao que as evidências levam a crer, encontraram o caminho do cinema mais autoral, no qual bons roteiros, decisões focadas em públicos cativos e extrema dedicação importam mais que as ordens dos cartolas dos estúdios.

"Há dois tipos de estúdio: aqueles controlados por executivos e aqueles controlados por cineastas", define Lasseter, rodeado por storyboards do desenho Bolt - Supercão, dentro do quartel general da Walt Disney Animation, em Burbank (Califórnia). Com a notoriedade de quem pilotou sucessos de crítica e público

como Toy Story, Vida de Inseto e Carros, Lasseter se declara favorável à liberdade autoral aos diretores. "Entregar as decisões a um cineasta não resultará, necessariamente, em um fi lme que só ele goste. Crescemos assistindo a filmes populares e artísticos, como títulos de Walt Disney ou Chuck Jones. Consequentemente, produziremos algo que honre nossos modelos, no mínimo", ele decreta.

Mais recente longa de animação comandado pelo time de Lasseter, Bolt foi relativamente bem nas bilheterias (rendeu US$ 290 milhões mundialmente e segue para repetir o sucesso no formato DVD). Os próximos projetos de Lasseter - versões repaginadas de clássicos como A Princesa e o Sapo e Rapunzel - seguem motivados pela mesma premissa: a palavra final será sempre dos diretores, jamais do estúdio.

Enquanto a casa de Mickey Mouse investe na criatividade de seus gênios, fora da animação, o momento parece ser propício à reimaginação de franquias e personagens. Lançado recentemente, o remake de Sexta- Feira 13 faturou quase US$ 90 milhões mundo afora e assustou positivamente ao deixar claro que, em uma era dominada por fracos remakes de filmes asiáticos, os filmes de terror podem ter qualidade ao mesmo tempo que apresentam apelo comercial. Entretanto, fatores que espantam são o curto período entre cada filme de uma série ou a velocidade com que as refilmagens são produzidas: thrillers asiáticos são refilmados com poucos anos de diferença; séries relativamente recentes, como Tomb Raider, já se encontram em revisão conceitual; e sucessos da década de 1980 entraram na linha de produção - até mesmo uma versão do cultuado Blade Runner: O Caçador de Androides já tem roteiro quase pronto.

Crise para uns, oportunidade para outros. O diretor mexicano Guillermo Del Toro aproveitou para inserir a mesma visão crua dos contos de fadas vista no sucesso O Labirinto do Fauno em Hellboy 2, enquanto se prepara para dar um toque todo pessoal a O Hobbit, baseado no universo de O Senhor dos Anéis. McG, por sua vez, ousou ao convocar Christian Bale para reinventar o herói John Connor em O Exterminador do Futuro: A Salvação. Ousadias à parte, ninguém bate J.J. Abrams. Superativo, ele deu aos Estados Unidos seu primeiro monstro destruidor de cidades em Cloverfi eld - Monstro e assumiu a direção do novo Star Trek fazendo questão de sacramentar sua assinatura pessoal na obra. "Os estúdios encaram algumas dessas propriedades como jogada de segurança. Eu não, sempre parto de ideias originais, mesmo quando se trata de alguma propriedade já desenvolvida", Abrams diz, enquanto displicentemente desenha uma caricatura do repórter. "Nunca fui fã de Star Trek, então tudo isso é novo para mim."

Assumidamente movido pela empolgação, Abrams enxerga de forma bem clara a influência autoral nos blockbusters: "Há uma realidade inegável em termos de criação. Sexta-Feira 13 ou O Cavaleiro das Trevas só funcionam por conta de um diretor com objetivo", ele decreta, ajeitando os óculos de aros grossos. O fato é que os filmes Star Trek - no Brasil imortalizados como Jornada nas Estrelas - possuem péssimo histórico recente nos cinemas, com fracassos consecutivos e frustrando tanto os fãs quanto a própria Paramount. Muitos diretores pensariam em corrigir os rumos, poucos arriscariam pensar em algo original, mas Abrams foi sufi cientemente audacioso para imaginar uma trama que recupera a essência dos personagens clássicos. "Todo mundo tinha medo. O estúdio, incerto por causa do histórico. E os fãs fundamentalistas, reclamando antes mesmo de qualquer acerto", enumera o diretor, que também assina a cocriação de seriados de sucesso como Alias, Lost e o recente Fringe. "No caso de Star Trek, temos uma fantástica trama envolvendo pessoas que, por acaso, vivem num ambiente de fi cção científi ca. As possibilidades, com essa combinação, são infi - nitas." Se resistir é inútil, a salvação das boas ideias no cinema parece ser bem possível.