Na capa da edição de março, o líder do Foo Fighters revela o motivo do cancelamento de parte da turnê asiática da banda
A vida de Dave Grohl poderia ser muito mais fácil. Porém, algo o estimula a dificultar as coisas. Tem sido assim já há bastante tempo. Até 1994, Grohl, então com 25 anos, era “apenas” o baterista do Nirvana, a atração musical mais intensa, controversa e revolucionária da década. Naquele 5 de abril, o suicídio de Kurt Cobain encerrou a banda de modo brusco, e Grohl se viu repentinamente desamparado: sem o amigo, sem o grupo que o tirou do anonimato, sem energia para prosseguir na música. Após o luto, a chance de se restabelecer como baterista de apoio de artistas já consagrados surgia como o caminho fácil e natural. A rota difícil – liderar uma nova banda e ser o vocalista e principal compositor – se mostrava improvável demais para dar certo. Naturalmente, Grohl optou pelo caminho mais nebuloso.
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“O que eu estou tentando provar? O que eu estou fazendo? É que eu simplesmente não consigo evitar!”, Grohl questiona a si próprio sobre a assumida obsessão pelo trabalho árduo. De certa forma, todos os riscos tomados ao longo dos últimos anos compensaram. Hoje, aos 43 anos, ele se encontra mais no topo do que nunca. Wasting Light (2011), oitavo álbum de estúdio frente ao Foo Fighters, liderou paradas pelo mundo, rendeu prêmios da indústria (cinco troféus Grammy) e contribuiu para oficializar Grohl como o último defensor do rock and roll, paladino e porta-voz oficial da causa da música feita com guitarras e livre de “nefastas influências digitais”.
Em meio a esse turbilhão e prestes a retornar ao Brasil – mais de dez anos depois do show do Foo Fighters no Rock in Rio III – Dave Grohl falou com exclusividade à Rolling Stone Brasil, e revelou o motivo pelo qual a banda cancelou, recentemente, shows em Cingapura e no Japão. “Tenho um cisto na minha garganta. Só que eu vinha evitando mexer nele”, contou Grohl. Na matéria de capa da edição de março, nas bancas a partir da próxima segunda, 12, ele também relembrou a mítica passagem do Nirvana pelo Brasil, em 1993, divagou sobre seu futuro na música e constatou, em meio à avalanche de elogios e parcerias (incluindo uma com Paul McCartney no palco do Grammy 2012) após o sucesso de Wasting Light: “Se tudo acabasse hoje, eu seria o cara mais feliz do mundo.”
Estou Aqui, Me Divirta: um relato do caótico show do Nirvana em São Paulo, em 1993.
Leia abaixo um trecho da entrevista exclusiva com Dave Grohl. A íntegra você encontra na edição de março da Rolling Stone Brasil.
Vocês divulgaram ontem que cancelaram parte dos shows na Ásia por causa da sua voz. Qual é o problema? Como está se sentindo?
Eu estou bem. É algo que existe faz um bom tempo. Eu tenho um cisto na minha garganta já há anos. Só que eu vinha evitando mexer nele. Quando voltei pra casa da última viagem, aquilo acabou se transformando em algo que me obrigou a procurar um médico pra valer. Fui lá e tive de fazer uma ressonância magnética, passei por diversos médicos, só para ter certeza de que não era algo realmente perigoso.
Sabe, eu já estou viajando há muito tempo, berrando até a minha cabeça estourar pelos últimos 18 anos [risos]. A coisa mais importante para mim... quero dizer, honestamente, a coisa mais importante da minha vida é a felicidade, família e amigos. A segunda coisa mais importante para mim é a música. Então, ter certeza de que minha garganta irá funcionar pelo resto da vida é o mais importante neste momento. Eu só precisava mesmo me consultar com uns médicos, cuidar disso e ficar pronto para voar para aí e encontrar vocês.
Esse acontecimento fechou um mês bem movimentado para você. Teve a cerimônia do Grammy, os prêmios que o Foo Fighters ganhou, aquela jam no final com Paul McCartney. E teve o seu discurso. Você improvisou a coisa toda ou foi algo já preparado na sua cabeça?
Sabe, é engraçado. Meu pai era um redator de discursos. Ele escrevia discursos para políticos em Washington D.C.. E minha mãe era uma professora de discursos. Ela ensinava as pessoas a falar em público. E o melhor conselho que eles me deram na vida foi: jamais leia um discurso. Você pode até escrevê-lo e ler para si mesmo. Mas, quando chega a hora de ficar na frente das pessoas e falar, você não lê: apenas fala.
Bem, eu sabia o que queria dizer na hora. Sabia que queria transmitir para as pessoas que eu estava orgulhoso do nosso disco, porque é uma representação realmente verdadeira da banda. Porque o fizemos sem nenhuma manipulação digital, e porque o gravamos em fita analógica na minha garagem. Meu desejo era fazer esse disco soar como o Foo Fighters de verdade. Não queria que ele soasse perfeito, nem polido, nem melhor do que nós realmente somos. Eu queria que ele soasse exatamente como a gente é. E era isso que eu estava tentando dizer na hora.
E qual é a real mensagem por trás disso?
Acho que a coisa mais importante é que as pessoas – e as crianças, principalmente – compreendam que música é um processo humano. É uma forma de arte humana, entende? Esteja você programando música em um computador ou tocando um violino, é preciso um ser humano para se fazer música. Esse tipo de música que o Foo Fighters faz: eu gosto quando ela soa como se fosse realizada por pessoas. Como uma banda de rock. E eu não curto quando bandas de rock parecem que foram aperfeiçoadas por computadores. Gosto quando soa cru, como se fosse um grupo de gente tocando em uma sala. E era isso que eu estava tentando passar ali: que as pessoas precisam entender que o fator mais importante é o elemento humano. É o que vem da sua cabeça, do seu coração, das suas mãos... Se você quer que a próxima geração de crianças acredite na música, elas precisam acreditar que isso vem da mente e do coração. E que é ok soar como um ser humano. Simples assim.
A edição 66 da Rolling Stone Brasil, março/2012, com Dave Grohl na capa, estará nas bancas a partir de 12/3.