E Foi Dada a Largada!

O ano de 2014 nem começou e partidos e candidatos já se digladiam pela liderança da corrida pelo maior cargo do Brasil: a Presidência da República

Cristiano Bastos

Publicado em 07/11/2013, às 17h00 - Atualizado em 02/06/2014, às 18h08
Ilustração - Lézio Junior
Ilustração - Lézio Junior

Há quase um ano das eleições presidenciais que definirão o novo chefe da nação, as principais escuderias políticas alistadas para a disputa já colocaram os carros na rua e estão de motores ligados. O pleito de outubro de 2014 também elegerá os novos governadores, senadores, deputados federais e estaduais que irão administrar os rumos sociais e econômicos do país pelos próximos quatro anos. E, embora ainda estejamos distantes da reta final, as cartas, apostas, especulações, números e previsões já estão na mesa – ou melhor, no grid de largada.

Segundo a última pesquisa do Ibope, se eleições fossem realizadas hoje, Dilma Rousseff (PT) venceria no primeiro turno, derrotando Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB). A presidente teria 41% dos votos, contra 14% do tucano e 10% do socialista. Se a disputa fosse com José Serra (que já concorreu duas vezes ao Planalto) e Campos, Dilma obteria 40% dos votos, contra 18% do paulista e 10% do atual governador de Pernambuco. Neves é um possível pré-candidato à Presidência e, tudo indica, deverá disputar com Serra para ser o representante do PSDB. A definição de quem será o nome do partido só será concretizada no início do ano que vem. Até lá, as especulações persistem. Para o senador Álvaro Dias (PSDB), uma das mais ativas vozes da oposição no Senado Federal, ainda é cedo para se fazer qualquer previsão, uma vez que as intenções de voto reveladas pelas pesquisas seriam ainda “volúveis”. “Não há uma consolidação real da posição do eleitor [demonstrada pelas pesquisas]. Deve-se considerar ainda o percentual muito elevado de eleitores que não respondem a questionamentos dos institutos de pesquisa.” Dias também crê que o resultado mostrado pelo Ibope é contraditório, pois mostra que Dilma tem apenas 38% de aprovação do eleitorado, número “insignificante” em um cenário cuja meta é a reeleição. “É contraditório asseverar que, com o percentual apontado pelas pesquisas, o PT sairá vencedor em primeiro turno. Por enquanto, estamos no escuro em matéria de tendência do eleitor brasileiro”, diz.

Se de fato há alguma novidade política no pleito de 2014, certamente é a filiação da ex-senadora Marina Silva ao PSB – após a proposta do partido Rede Sustentabilidade ter tido o registro negado pelo Tribunal Superior Eleitoral em outubro. Ainda que Marina tenha se aliado à legenda de Eduardo Campos na última hora, a dobradinha política, mesmo a um ano das eleições, já encontra percalços pelo caminho. Marina já afirmou que o Rede Sustentabilidade (legenda em formação) não será obrigado a seguir o PSB em coligações estaduais para 2014. “A aliança programática nacional, entre o Rede e o PSB, não faz nenhum enquadramento nos Estados”, a ex-senadora afirmou. Divergências à parte, Rodrigo Rollemberg, senador e líder do PSB no Senado, classifica a união de Campos e Marina como um acontecimento político extremamente importante, que significa “muito mais do que a soma aritmética das intenções de voto”. De acordo com Rollemberg, para quem é preciso dar fim à “falsa polarização entre PT e PSDB (...), que “restringe o debate político”, a entrada de Marina muda totalmente o jogo eleitoral, tornando a candidatura de Campos mais competitiva. “Já podemos apostar em uma possibilidade grande de segundo turno com Eduardo Campos”, diz.

Se o governo federal enfrenta críticas, algumas relacionadas à “envergadura moral” – por causa de casos como o Julgamento do Mensalão, que envolveu integrantes da cúpula do partido, e outras quanto ao crescimento lento da economia –, a oposição sofre um tanto mais pela falta de discurso. Ou, concretamente dizendo, pela inexistência de um projeto político capaz de se contrapor ao atual. Até o momento, seja a tradicional oposição do PSDB, seja a chamada “nova oposição”, simbolizada pelo PSB, não anunciaram propostas reais, no sentido de substituir um modelo político-social-econômico por outro. O PT, no entanto, desde já garante que continuará com as políticas que tem realizado; prefere não mexer nas peças do jogo que vem vencendo ao longo destes anos todos.

Vozes dissonantes existem. O senador Randolph Rodrigues (PSOL-PE), que chama o PT de a “nova direita”, acredita que o PSOL representa a grande alternativa de uma candidatura à esquerda. Só o PSOL, na opinião dele, teria condições de trazer à disputa um “autêntico posicionamento de oposição”, e afirma que as três candidaturas colocadas no cenário da disputa presidencial são “muito parecidas”. “O que eu vejo nesta corrida presidencial até agora é muito ‘mais do mesmo’. Todos aplaudem o legado petista dos últimos anos, mas, após 27 anos pós-democratização, ninguém tece crítica alguma ao processo de redemocratização”, aponta o senador. “Vivemos um processo de redemocratização inacabável, inconcluso, que ainda não conseguiu resolver, por exemplo, o problema do déficit educacional brasileiro. Temos esse enorme dilema a ser resolvido.”

O PSOL completará dez anos de existência em 2014 lançando candidato próprio à Presidência. Embora o nome que representará a sigla não esteja definido, a ex-deputada federal Luciana Genro foi a primeira a se lançar pré-candidata. O nome dela, entretanto, não é consenso: Rodrigues ressalta que a candidatura de Luciana, embora forte, não legitima a maioria do partido. “É preciso ter uma candidatura que represente essa maioria”, argumenta, admitindo também ter o desejo de concorrer. “Se meu nome for consagrado no congresso do partido [no final do ano], estarei a serviço dessa tarefa. Não sei se meu nome será o da maioria, mas sei que o da Luciana não o é.”

É impossível analisar o panorama das eleições de 2014 sem antes refletir sobre as manifestações que desde junho acontecem no país – e que sem dúvida deverão entrar na pauta. Em eventos nos quais reivindicações justas e uma “raiva despolitizada” marcharam lado a lado, a população tomou as ruas para exigir o cumprimento de uma série de mudanças pontuais. Para o cientista político Luiz Fernando Roriz, o grito das ruas fez o governo Dilma enfrentar uma das mais sérias crises de legitimidade da atual democracia. Em resposta, ele elenca, o governo anunciou um pacote de medidas que incluía a melhora na oferta de políticas públicas estaduais, a consumação da esperada reforma política – a qual deveria ser legitimada através de um plebiscito, que não chegou a ser levado a cabo – e a contratação de profissionais de saúde vindos do exterior, o controverso programa Mais Médicos.

O senador Paulo Paim (PT-RS) admite que se encontrava mais “cético” do que é hoje a respeito das consequências que as manifestações teriam no processo de reeleição da presidente Dilma Rousseff. “Com o andar da carruagem, as ‘abóboras’ foram se acomodando na carroça e, então, se viu que as críticas eram direcionadas muito mais ao conjunto dos partidos políticos, exigindo mudanças de postura, do que propriamente à Dilma”, diz o senador. E, de acordo com Paim, a “campanha” da presidente já vai muito bem. “Ela tem muita coisa para mostrar que ainda não mostrou, como os investimentos feitos pelo governo nos estados e no país.” Outro diferencial de campanha, aposta o senador, será o momento em que o ex-presidente Lula entrar de vez no processo. “A participação de Lula na campanha de Dilma deverá decidir a disputa em primeiro turno.”

Magnetizados pela criação de dois novos partidos, cujos registros foram aprovados pelo TSE, mais de 50 deputados mudaram de sigla em uma notável “dança das cadeiras” – para não dizer “virada de casaca”. A revoada de parlamentares dividiu-se entre os novatos Pros (Partido Republicano da Ordem Social) e SDD (Partido Solidariedade). Ambos já vêm sendo cooptados para eventuais alianças, tanto pelo PMDB e PT quanto pelo PSDB. Na prática, serão apenas mais duas sublegendas – do tipo que nascem já mirando apoiar outros partidos. Como são recentes e ainda não possuem eleitorado estabelecido, esses partidos não deverão puxar muitos votos. “[Os novos partidos] vão entrar na coalizão do candidato que preferirem e, dessa forma, aproveitar a projeção que lhes será dada”, estima o cientista político Luiz Fernando Roriz. “Só irão influenciar, de fato, após o presidenciável escolhido ter ganho as eleições.”

O deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, ex-PDT, presidente da Força Sindical e presidente do SDD (que já anunciou que apoiará o PSDB nas eleições), diz só haver “uma possibilidade” de evitar a reeleição de Dilma Rousseff em 2014: todos os candidatos da oposição atuarem juntos. “A saída é ter um acordo prévio para que a gente [a oposição] chegue ao segundo turno”, diz. Segundo o deputado, a presidente não atendeu a nenhum pedido dos trabalhadores e, ainda por cima, colocou o Brasil em uma crise que “não era nossa”. Contudo, o SDD, tal qual o Pros, já nasce sob suspeitas: quase metade dos deputados federais que formam as duas novas siglas são alvos atualmente de investigações criminais no Supremo Tribunal Federal. As suspeições tratam desde demandas formais de prestação de contas de campanha a delitos investigados pela Polícia Federal, como a operação Sanguessuga, de 2006, que apurou desvio de recursos na compra de ambulâncias.

No topo das pesquisas, o PT larga com vantagem na “corrida maluca” das eleições presidenciais brasileiras – especialmente por terem definido a chapa antecipadamente, que deverá apresentar a previsível reedição da dupla Dilma-Michel Temer e a manutenção do PMDB como o aliado preferencial. Mesmo com o vento soprando a favor, o PT sente o natural desgaste da tradicional agenda política realizada pelo atual governo, voltada para o desenvolvimento econômico, distribuição de renda e políticas públicas. Mas a maior dificuldade com a qual o partido deverá se deparar será dialogar com as atuais demandas da juventude, que tem reclamado e exigido a atenção dos governantes nas ruas, em palanques diversos e nas redes sociais. Hoje, 51 milhões de brasileiros se encontram na faixa entre 15 e 29 anos. “O discurso passadista do governo, de que continuará fazendo as mesmas políticas sociais, não é suficiente para a atual juventude brasileira”, aponta Yuri Soares Franco, historiador e secretário executivo do Conselho de Juventude do Distrito Federal. Tudo o que os jovens desejam – e afinal o Brasil como um todo – é uma narrativa sobre o futuro.