Mark Frost, um dos criadores de Twin Peaks, fala do retorno da aclamada série e de obra que chega ao mercado brasileiro
Quando Twin Peaks estreou, em 8 de abril de 1990, na rede ABC, mudou a televisão. Criada pelo cineasta David Lynch e pelo escritor e roteirista Mark Frost, a série era uma viagem aos mais bizarros e sombrios labirintos da psique humana, tendo como pano de fundo a cidade fictícia que dá nome ao programa. Twin Peaks durou duas temporadas e ganhou um filme, Twin Peaks: Os Últimos Dias de Laura Palmer (1992), uma espécie de prequel da série original, também dirigida por Lynch. O culto à trama nunca esmoreceu e por muito tempo as especulações sobre uma volta rondaram o show business.
Cerca de 25 anos depois do assassinato de Laura (interpretada por Sheryl Lee), Twin Peaks ganha a esperada terceira temporada, com 18 episódios. No Brasil, Twin Peaks: The Return estreou em 21 de maio, na Netflix. O agente Dale Cooper (Kyle MacLachlan) está de volta e, desta vez, com uma espécie de doppelgänger malvado. O fantasma de Laura Palmer segue assombrando e o primeiro episódio, violento e vindo do fundo de um pesadelo, dividiu opiniões, mas esse sempre foi o cerne de Twin Peaks, uma obra que existe para confundir, não para explicar.
Em entrevista por telefone, Mark Frost fala sobre a série, mas mantendo o cuidado de não entregar nenhum spoiler. Para os fãs brasileiros, outra boa notícia é o lançamento do livro A História Secreta de Twin Peaks (Companhia das Letras), escrito por Frost e lançado originalmente nos Estados Unidos no início de 2016. “O livro foi feito para complementar o conteúdo da série”, explica o autor. “Personagens que eram secundários nas duas primeiras temporadas aqui ganham nova vida.” A obra é estruturada como um dossiê, com documentos que remontam a 200 anos de história de Twin Peaks, a cidade. Documentos reais se juntam a papéis fictícios; as teorias da conspiração abundam. “É fake news, mas com um bom propósito”, ele se diverte.
Frost afirma que a sensação de ver esse universo ganhar novamente uma vida televisiva é revigorante. “Por todos esses anos, eu mantive ideias, anotando coisas aqui e ali. Quando eu e David [Lynch] começamos a juntar os pedaços, vimos que tínhamos algo forte em nossas mãos”, conta. “Não é um sentimento de repetição. É mais como se eu estivesse em outra vida. Nós, criadores, somos diferentes agora. As coisas mudaram. Muitas pessoas partiram de nossa vida. Isso é o ponto central da nova Twin Peaks: vamos encontrar velhos conhecidos, mas outros já não estarão lá. Todo mundo está mais velho, mas também tem gente nova, situações diferentes.”
Para Frost, o legado da série ainda é um ponto de interrogação. “Quando nós criamos Twin Peaks, não pensamos que seria um fenômeno global. Imaginávamos que seria um retrato bem particular de uma típica cidade do interior dos Estados Unidos. Era como uma torta de cereja, mas com um recheio, digamos, diferente”, ele define. “Por isso fico surpreso que Twin Peaks seja tão bem recebida em tantos locais do mundo, como no Brasil, que eu não conheço, mas imagino que não tenha nada a ver com o meu país.”