Homem Certo Na Hora Certa

Há três décadas o fotógrafo Rui Mendes registra de forma única e cheia de personalidade as figuras obrigatórias da cultura brasileira.

Paulo Cavalcanti

Publicado em 13/06/2014, às 17h01 - Atualizado em 15/01/2015, às 20h11
<b>Homenagem</b><br>“O Seu Jorge estava cogitado para fazer o Jimi Hendrix no cinema. Então, recriamos a capa do Electric Ladyland”, diz Mendes. - Arquivo pessoal
<b>Homenagem</b><br>“O Seu Jorge estava cogitado para fazer o Jimi Hendrix no cinema. Então, recriamos a capa do Electric Ladyland”, diz Mendes. - Arquivo pessoal

Rui mendes é um dos grandes heróis dos bastidores do pop-rock brasileiro. A contribuição dele é inestimável: como fotógrafo, foi responsável por criar imagens marcantes e eternas, ajudando a definir o visual e o estilo dos grandes

nomes da música nacional dos últimos 30 anos. Com a carreira iniciada na década de 1980, Mendes permanece em constante atividade até hoje. “O fotógrafo tem um compromisso com a história”, diz. “Eu sempre procurei preservar tudo o que fiz. É fácil dizer que eu estava no lugar certo e na hora certa. É verdade, mas também tenho noção de que meu trabalho tem qualidade.”

Rui Mendes é um personagem tão obrigatório na cena musical brasileira quanto as figuras que ele tem retratado há décadas. Nascido em Assis (SP) em 1962, ele estudou fotografia nos Estados Unidos (em Vancouver, no estado de Washington) no final da década de 1970. Assim que voltou ao Brasil, começou a se posicionar profissionalmente. “Os anos 1980 foram um período muito interessante. Houve uma abertura, foi o começo de tudo”, ele afirma. “O Brasil era um lugar tão fechado culturalmente quanto a Bulgária. De repente, todos fomos expostos a novas e diferentes influências.”

Durante esse período, o futuro fotógrafo foi estudar na Escola de Comunicações e Artes de São Paulo, fez parte do grupo anarquista Os Picaretas e começou a cruzar o caminho de quem fazia música e cultura alternativa na cidade. Ficou amigo de músicos como Kiko Zambianchi e Paulo Ricardo e se viu em meio à explosão do rock brasileiro. Logo começou a fotografar as bandas que despontavam para várias publicações (como a extinta revista Bizz), e não demorou a ser convidado para fazer capas de discos e fotos promocionais. Hoje com 52 anos, Mendes é um dos profissionais mais requisitados do mercado nacional e diz ter perdido a conta de quantos ensaios fotográficos já realizou. Também se mantém ativo em campanhas publicitárias e dirigindo videoclipes – nessa área, já trabalhou com Chico Science & Nação Zumbi, Charlie Brown Jr., Viper, Racionais MC’s, Arnaldo Baptista e muitos outros. Recentemente, teve suas imagens organizadas em uma exposição sobre o movimento punk paulistano na metade dos anos 1980.

Quando está em ação, Mendes é conhecido por ser um fotógrafo muito rápido e eficiente. “Eu sempre usei a adversidade a favor do meu trabalho”, ele diz. “Mas é tudo questão de treino. Os primeiros cinco minutos são primordiais para se estabelecer uma relação e criar o retrato que se deseja. Se estiver seguro nesse momento, então tudo acaba dando certo. O resto acaba sendo um pouco de encheção de linguiça.” Sobre a técnica que usa, ele diz que não se inspira necessariamente em outros fotógrafos. “Eu tenho como referências as artes, o cinema e os quadrinhos”, diz. “Os quadrinhos em particular. O trabalho do Will Eisner, por exemplo, foi muito importante para mim.”

Além de ter uma excelente memória e de ser muito organizado, Mendes é o proprietário de um acervo impressionante. “Eu possuo cerca de 1 milhão de negativos e cromos”, explica. “Tenho quatro arquivos com todo esse material que

acumulo há quase 30 anos.” Agora, parte do acervo finalmente virá à tona em um livro que cobrirá os principais momentos da carreira dele. “Dá muito trabalho escolher, é muito vasto”, ele diz. “Eu e o Richard Kováks, meu editor de imagens, estamos sempre mudando tudo. Mas até o final do ano esse livro deve estar no mercado.”

Hoje, quase três décadas depois de ter iniciado a carreira, Rui Mendes sabe que deixou uma marca difícil de ser equiparada no Brasil. “Quando você olha para uma foto que fiz, já a identifica”, ele diz, sem falta modéstia. “O trabalho que faço tem um olhar diferente. E, com isso, acabei virando referência.”