Onde rock, folclore e regionalismos se encontram
A caminho da última edição do festival Mada, realizado em maio último em Natal (RN), uma mesma recomendação era repetida várias vezes por pessoas de diferentes procedências: "Preste atenção no quarteto carioca Manacá. Essa banda vai longe!".
O nome pode parecer estranho à primeira vista, mas depois que seu significado é desvendado começa-se a entender qual é o ideário estético e conceitual por trás de umas das grandes revelações da novíssima safra de bandas do rock brasileiro. "Trata-se do nome de uma flor. Nós o tiramos de um livro do escritor Ariano Suassuna, O Romance da Pedra do Reino, onde é dito que a flor do manacá era utilizada para produzir um chá alucinógeno, tomado em rituais para evocar Dom Sebastião", explica Luiz César Pintoni, guitarrista e um dos fundadores do Manacá.
O grupo, que conta ainda com a vocalista Letícia Persiles,o baixista Daniel Wally e o baterista Bruno Baiano, existe há pouco mais de um ano, embora seus músicos já sejam nomes calejados na cena underground carioca. Essa experiência foi fundamental para que, em pouco tempo, o Manacá chamasse a atenção de público, jornalistas e produtores, a ponto de ser convidado para tocar em um festival do porte do Mada. E em Natal conquistou o público com um set poderoso e curto, de apenas meia hora, que desvelou o "som manacá": guitarras pesadas, cozinha suingada, tudo dando suporte a letras escritas em ótimo português que perscrutam referências do folclore brasileiro e da cultura regional nordestina. Como se não bastasse, a performance de palco de Letícia, com gestos precisos e suaves de uma bailarina e a intensidade de uma atriz criada no tablado - aos 24 anos, estuda arte dramática desde os 11, além de fazer pesquisas sobre folclore em seu curso de produção cultural na Universidade Federal Fluminense -, é arrasadora. "No meu sangue corre teatro. Isso influencia diretamente no meu comportamento em relação ao Manacá tanto durante o show, nas performances de palco, quanto antes, na preparação e depois, quando ele termina. Existe uma série de rituais sagrados do teatro que não pretendo largar nunca", explica Letícia, que também chegou a participar de um dos capítulos do seriado teen Malhação, da TV Globo.
Se o lado MPB e folclórico/regional é levado à banda por Letícia, o lado roqueiro vem à tona através do extenso e variado gosto musical do trio de instrumentistas. Luiz César Pintoni, por exemplo, não tem pudor em admitir que gosta de Incubus, Cake, Mars Volta ou Hellacopters. "E aí eu pego essas referências e as trabalho juntamente com minhas harmonias de guitarra, que têm muita influência do choro", diz o guitarrista. O mesmo gosto pelo rock alternativo estrangeiro também pontua a atuação do baixista Daniel e do baterista Baiano. "Minha praia sempre foi o lance de rock mais pesado, tipo Pantera, Lagwagon, Nirvana, Ramones. Mas de uns oito anos pra cá me aprofundei em ritmos brasileiros. Diria que estou aprendendo ainda [risos]", confessa Baiano.
E, mesmo com tamanha diversidade, não existe conflito estético ou ideológico na hora de compor o material do Manacá. Tanto que músicas como "Lua Estrela", "Meu Amor" ou "O Galo Cantou" revelam um conjunto absolutamente entrosado e maduro musicalmente, pronto para se destacar no atual cenário do rock nacional. Tanto é verdade que o quarteto já foi cooptado pela produtora carioca Na Moral, do empresário Marcelo Lobato, que cuida das carreiras de Pitty, Luxúria e Marcelo D2, entre outros. O álbum de estréia, agora, é apenas uma questão de tempo. E o sucesso comercial, se houver justiça, também.