Um dos pioneiros do rock, Jerry Lee Lewis segue de pé
Em julho de 2014, Jerry Lee Lewis tirou férias. Segundo ele, foi a primeira vez em 60 anos de carreira. “Eu precisava andar de trem. Estava ansioso por isso”, diz o astro veterano com um forte sotaque de Louisiana, reclinando em sua cadeira favorita na sala de estar da casa onde mora, em Nesbit, Mississippi. Lewis foi acompanhado por Judith, sua sétima esposa, em uma viagem a
Grand Rapids, Michigan, para visitar Jerry Lee Lewis III, filho dele, de 28 anos. O lendário pianista não gostou das acomodações do trem e voltou de carro, mas disse que o sacrifício valeu a pena, já que teve a chance de, por dez dias, brincar com o netinho de 1 ano, chamado Jerry Lee Lewis IV. “Ele é um belo garoto”, se orgulha.
Há uma década, uma viagem como essa não teria sido possível. Terríveis dores nas costas e o abuso de medicamentos controlados faziam com que todos pensassem que o artista estava acabado. As coisas mudaram quando apareceu o bilionário filantropo Steve Bing, um superfã que ajudou a colocar em ordem as finanças do músico, além de providenciar novos médicos para ele. Logo Lewis estava com uma nova banda e de volta à estrada. Este mês, por exemplo, tem shows agendados em Londres e Glasgow.
Um dos principais nomes revelados na Sun Records – a gravadora de onde saiu Elvis Presley – e autor de petardos do início do rock, como “Great Balls of Fire” e “Whole Lotta Shakin’ Goin’ On”, Lewis chega aos 80 anos. Também conhecido como The Killer (O Matador) devido a seu jeito arrasador de tocar piano, ele nasceu no dia 29 de setembro de 1935, em Ferriday, Louisiana. Sempre foi um sobrevivente. Teve mais problemas de saúde do que qualquer um possa contar. Enfrentou longos períodos de uso abusivo de álcool e era um encrenqueiro crônico. Dois dos f lhos dele morreram de forma trágica – um afogado e outro em um acidente de carro. Em 1958, enquanto estava na Inglaterra, foi acusado de ser pedófilo e bígamo – tinha se casado com
Myra Gale Brown, uma prima de 13 anos. Era o segundo casamento dele. O primeiro ainda não havia sido anulado. Por causa do escândalo, a carreira dele entrou em declínio no começo da década seguinte. Mas Lewis se reinventou como cantor country e seguiu como uma incontestável lenda do rock.
Em nosso encontro, ocorrido no final do ano passado, ele usava uma camisa azul- -clara de abotoar e calça de pijama, e mudava constantemente de posição na cadeira, batendo a bengala dourada no chão toda vez que queria chamar atenção. Ele ainda estava entusiasmado com a recepção que havia tido em um show no Ryman Auditorium, em Nashville. Teve que voltar para quatro bis, e depois os fãs rumaram para o carro dele querendo cumprimentá-lo.
Lewis mora há mais de 40 anos em uma casa de tijolos aparentes de dois andares nos arredores de Nesbit, que fica a pouco mais de 30 quilômetros de Memphis. Localizada em uma rua deserta, a propriedade é fácil de achar, já que ostenta um portão de ferro com um piano e a inscrição The Lewis Ranch. Circundando o local, há um pequeno lago lamacento, onde Lewis quebrou a perna nos anos 1980 enquanto pilotava um jet ski. Quando você chega perto, é recebido por seis cães que latem furiosamente atrás de uma cerca que protege a residência.
Na sala de estar, logo acima da cadeira de Lewis, está uma foto emoldurada tirada em dezembro de 1956, quando ele e os colegas Elvis Presley, Johnny Cash e Carl Perkins se encontraram no estúdio da Sun Records. Os músicos reunidos foram batizados de O Quarteto de 1 Milhão de Dólares. Acima do bar se encontra uma foto das sessões de Class of 55, um álbum de 1986 que reuniu Lewis, Cash, Perkins e Roy Orbison. “Todos eles se foram. Eram realmente bons amigos”, ele diz, em voz baixa. Lewis ostenta o fato de ser um sobrevivente com orgulho – inclusive, seu álbum de 2006 ganhou o nome Last Man Standing (Último Homem de Pé). “Um monte de gente não gostou quando eu afirmei isso. Mas tiveram que aceitar”, brada.
Só que quando questionado se ele é realmente a última lenda viva entre os pioneiros que criaram o rock, o jeito bravateiro se dissipa. “Eu não sei. Apenas agradeço a Deus por estar respirando e ainda vivo. Não tenho mais problemas nas costas. Estou bem.” O Lewis intempestivo de antigamente parece ter ficado para trás. “Eu coloco Deus na frente”, diz, afirmando que a religião o ajuda a manter a sanidade. “Rezo o tempo inteiro. Fui criado dessa forma.”