Mick Jagger
“Havia competição entre nós, mas nunca de um jeito negativo”
Não consigo me lembrar de como conheci David – e isso é esquisito –, mas costumávamos passar bastante tempo juntos em Londres no início da década de 1970 – íamos a muitas festas. Ele vinha à minha casa para me mostrar músicas – eu me lembro de vários mixes diferentes de “Jean Genie”, uma canção que, de certa maneira, tinha a ver com os Rolling Stones. Era disso que eu gostava: de vê-lo se desenvolvendo como artista.
Sempre houve uma troca de informações dentro da nossa amizade. E acho que sempre houve um elemento de competição entre nós, mas nunca de um jeito negativo. Quando ele vinha aqui, a gente conversava sobre o nosso trabalho – um novo guitarrista, uma nova maneira de compor, estilo e fotógrafos. Tínhamos muito em comum no sentido de querer fazer coisas novas no palco.
Ele sempre olhava as etiquetas das minhas roupas. Quando me encontrava, me dava um abraço e eu sentia que estava pegando no colarinho da minha camisa para ver o que eu estava usando. David às vezes me copiava, mas era muito honesto a respeito disso. Se tas como óbvias, mas que não existiam antes. Gostaria de me considerar amigo de David, mas sou mais um fã. Ele veio nos visitar quando estávamos mixando Achtung Baby (1991). Nós fazíamos piada um com o outro – David ia nessa direção nas conversas, e às vezes nós até magoávamos um ao outro. Ele levou a filha a uma matinê para ver o musical Spiderman: Turn off the Dark (2011), e me mandou as razões pelas quais ele pegava alguma característica sua, falava: “Isso é seu, eu só experimentei”. Eu não me incomodava em dividir coisas com ele – era uma via de mão dupla.
Nós estivemos muito próximos na década de 1980, em Nova York. Saíamos muito e íamos a boates para dançar. É por isso que “Let’s Dance” é a minha música preferida dele – me lembra daquele tempo. não havia gostado. E tudo o que ele disse ajudou mesmo, porque foi logo no começo. Em última instância, as armas de um compositor e performer são seus pensamentos e sentimentos. Algumas pessoas podem ter pensamentos originais, mas com uma paisagem musical não tão inédita. Você tem de ser capaz de fechar os olhos e apenas sentir as músicas e dizer: “Que parte de mim está sendo afetada por essas notas?” Ou: “Quem mais toca isso?” E, no caso de Bowie, a resposta é ninguém. A paisagem musical dele afeta a gente de um jeito que é completamente diferente de todas as outras músicas. Essa parte de mim só é tocada por David Bowie.
A minha lembrança favorita é de quando nós fizemos “Dancing in the Street” juntos, em 1985. A gente tinha que gravar a música e rodar o videoclipe em um dia só; nos divertimos muito. O vídeo é hilário de assistir. Foi a única vez que nós realmente fizemos uma parceria. Pensando bem, isso é uma estupidez e tanto.
Mais tarde, ele comprou uma casa na ilha de Mustique, onde eu tenho uma propriedade, e a gente costumava passar um tempo nas Índias Ocidentais. David ficava tão relaxado lá; era tão gentil com todo mundo. Ele se empenhou muito para melhorar o atendimento médico para os locais. Eu fazia trabalho beneficente nas escolas, e ele me acompanhava e contava histórias para as crianças de lá.
Eu sei que David parou de fazer turnês por volta de 2004. Depois disso, ele meio que sumiu, tanto da minha vida quanto do palco, por assim dizer, até voltar com um álbum muito interessante. É muito triste quando alguém vai embora e você passou muito tempo sem falar com essa pessoa. Você gostaria de ter feito isso, de ter feito aquilo. Mas é o que acontece. Coisas estranhas acontecem na vida.
Bono
“David era tão vivo, tão luminoso. O céu está mais escuro sem ele”
Eu brinquei de ser astro do rock, mas na verdade não sou. David Bowie é a minha ideia de astro do rock. Neste momento, estou em Myanmar, um pouco isolado da reação à morte de David, mas posso garantir que o céu está muito mais escuro aqui sem o Starman.
A primeira vez que eu o vi se apresentar foi no programa Top of the Pops, em 1972, cantando “Starman”. Ele era tão vivo. Tão luminoso. Tão fluorescente. Nós tivemos uma das primeiras televisões em cores da rua, e David Bowie era o motivo para ter uma TV em cores. Eu já disse que ele foi o nosso Elvis Presley. Há tantas semelhanças: a dualidade masculino-feminino, o domínio do palco. Eles criaram silhuetas e formas originais que hoje são vistas como óbvias, mas que não existiam antes.
Gostaria de me considerar amigo de David, mas sou mais um fã. Ele veio nos visitar quando estávamos mixando Achtung Baby (1991). Nós fazíamos piada um com o outro – David ia nessa direção nas conversas, e às vezes nós até magoávamos um ao outro. Ele levou a filha a uma matinê para ver o musical Spiderman: Turn off the Dark (2011), e me mandou as razões pelas quais não havia gostado. E tudo o que ele disse ajudou mesmo, porque foi logo no começo.
Em última instância, as armas de um compositor e performer são seus pensamentos e sentimentos. Algumas pessoas podem ter pensamentos originais, mas com uma paisagem musical não tão inédita. Você tem de ser capaz de fechar os olhos e apenas sentir as músicas e dizer: “Que parte de mim está sendo afetada por essas notas?” Ou: “Quem mais toca isso?”
E, no caso de Bowie, a resposta é ninguém. A paisagem musical dele afeta a gente de um jeito que é completamente diferente de todas as outras músicas. Essa parte de mim só é tocada por David Bowie.
Iggy Pop
“David não era o tipo de pessoa que desperdiçava uma música”
Mais do que todos os outros músicos de rock, David Bowie se interessava pelas pessoas – ele se interessava de verdade, principalmente por outras pessoas nas artes. Ele sempre ficava tipo: “Certo, quem é você e no que está pensando? Como você faz o que faz?” E ele apreciava os esquisitões – as pessoas que tinham um visual diferente e que falavam de um jeito diferente. Tinha uma curiosidade muito forte e valores estéticos muito completos.
Conheci David em Nova York, em 1971. Eu estava hospedado no pequeno e fedido loft do assessor de imprensa Danny Fields. Era tarde em uma noite, e Danny foi à casa noturna Max’s Kansas City. Eu não queria ir. Estava vendo TV, assistindo ao filme A Mulher Faz o Homem. Danny me ligou: “Tem um cara aqui. Você se lembra dele”. E eu me lembrava mesmo. David tinha dito algo na revista Melody Maker a respeito das músicas preferidas dele, e disse que gostava do Stooges, algo que não muita gente admitia na época. Danny disse: “Você precisa muito vir para cá”.
David estava lá com o empresário, Tony DeFries, e mais um monte de gente ao seu redor. A minha impressão foi de que ele era muito altivo e muito simpático, mas não tão simpático naquele ambiente quanto quando eu o conhecei melhor em grupos menores. Deu para ver que ele tinha algumas ideias para mim.
Aprendi muito com ele. Ouvi Ramones, Kraftwerk e Tom Waits pela primeira vez por causa dele. Ele também tinha uma espécie de rigor. Se via algo em outro artista que admirava, e a pessoa não fazia jus a essa qualidade, não tinha o menor problema em dizer: “Bom, se você não vai aproveitar, eu aproveito. Vou fazer o que você deveria ter feito”. E isso era muito válido.
David teve um efeito importante sobre o terceiro álbum do Stooges, Raw Power. Nós fizemos algumas sessões no estúdio Olympic, em Londres, e mandamos as fitas para David. Ele me retornou: “Vocês podem fazer melhor do que isso”. Então, nós fizemos. Nós compusemos mais e mais, e acabamos com um trabalho mais sofisticado. Dá para ver o que eu aprendi com David como performer se olhar para as imagens da turnê solo que fiz no ano passado.
Eu sou dono do meu terreno – e David sabia fazer isso.
Ele também não era o tipo de pessoa que desperdiçava uma música: nunca desperdice uma ideia. Ouvi “Scary Monsters (And Super Creeps)”, uma canção dele de 1980, pela primeira vez quando estávamos em uma casa em Los Angeles, em 1974. Ela se chamava “Running Scared” na época. David estava tocando no violão e queria saber se eu era capaz de fazer algo com ela. Eu não fui capaz. Ele guardou e trabalhou nela. Essa foi outra coisa importante que eu
aprendi: não jogue coisas fora.
Trent Reznor
“Ele era uma figura graciosa, encantadora, alegre e destemida”
Na década de 1990, Bowie me procurou e disse: “Vamos fazer uma parceria e uma turnê juntos”. É difícil expressar como a experiência toda serviu para me validar e o quanto foi surreal descobrir, para o meu deleite, que ele ultrapassava qualquer expectativa que eu tivesse. Ele era uma figura graciosa, encantadora, alegre e destemida.
Em um dos nossos primeiros encontros, estávamos conversando sobre como seria a turnê. Deparei com uma situação difícil e bem estranha: naquele momento, tínhamos vendido mais ingressos do que ele na América do Norte. E não tinha como, de jeito nenhum, David Bowie abrir para mim. Além disso, ele disse: “Sabe, eu não vou tocar nada que ninguém quiser que eu toque. Vamos tocar muitas coisas do tempo de Low e o álbum novo. Não é isso que as pessoas vão querer ver, mas é isso que eu preciso fazer. E vocês vão arrasar com a gente toda noite”.
A reação dele na maior parte do tempo era de altivez. Em um show de rock ao ar livre no verão, pessoas com latas de um litro de cerveja na mão provavelmente teriam preferido escutar “Changes” em vez de ver uma instalação de arte no palco. Ele fez o que queria fazer. Aquilo causou um impacto: em um mundo em que o padrão parece estar cada vez mais baixo, onde a estupidez se enraizou, ainda há lugar para uma visão sem amarras.