Produtor lança seu melhor disco em dez anos, mas mantém seus ideais em primeiro lugar
Moby pode não fazer mais turnês, mas continua compondo e gravando prolificamente. O recém-lançado Everything Was Beautiful, and Nothing Hurt é a prova de que o produtor, um veemente opositor de Donald Trump e fervoroso ativista pelos direitos dos animais, segue entendendo do ofício. Melhor trabalho musical dele nos últimos dez anos, o álbum apresenta a mistura de letras desoladoras com vocais de inspiração gospel e melodias sublimes que o tornaram conhecido no mundo todo. É uma carta de dor e otimismo para tempos sombrios, e uma maneira de Moby se manter em contato com o público enquanto prepara a segunda parte de sua autobiografia.
Conversamos na época do lançamento do livro Porcelain, há quase dois anos. Você acha que o mundo está pior ou melhor hoje?
Em alguns aspectos, está bem pior. A mudança climática, os níveis de poluição e o desmatamento estão piores. Em termos de percepção, o mundo parece muito instável – em parte pelo fato de Donald Trump ter sido eleito presidente dos Estados Unidos. Mas, olhando por uma perspectiva mais ampla, para as coisas melhorarem de fato, antes é preciso que piorem. Por exemplo, uma pessoa viciada em drogas geralmente precisa atingir o fundo do poço antes de dar um passo adiante em busca da sobriedade. As pessoas precisam ver o quão ruins são as consequências de suas ações para de fato mudar.
O disco novo é um meio de expressar essa sensação?
O álbum, o título e o conceito são, basicamente, uma mistura de tristeza e otimismo. A tristeza tem base na confusão que rodeia a condição humana. Ninguém sabe de fato se nossa vida tem sentido. A gente se volta para outras coisas buscando distração – drogas, hedonismo ou até o Facebook – ou algo que nos traga um significado fácil, como a igreja. Só que em algum momento precisamos parar e contemplar o vazio: olhar para o vazio existencial, em vez de preenchê-lo com hedonismo ou espiritualidade falsa.
Você geralmente se sente otimista?
Sim, exceto em relação às mudanças climáticas. Nos últimos séculos, os humanos foram descobrindo o jeito certo de fazer as coisas. Cem anos atrás, nos Estados Unidos, mulheres não podiam votar, crianças trabalhavam em fábricas. Progredimos muito, e podemos progredir ainda mais, só que para isso precisamos estabilizar o clima. Todo mundo tem suas próprias preocupações, mas nenhuma delas vai importar quando o nível dos mares estiver 60 metros acima do que está hoje.
A música pode ser uma maneira de expressão e uma forma de cura. Qual das duas representa o modo como você se relaciona com ela mais frequentemente?
Ambas. A gente tende a pensar na música como simplesmente música, mas a verdade é que é uma forma de linguagem extraordinária. O fato de que um sul-coreano não conseguiria se comunicar com alguém do Brasil, mas que os dois poderiam ouvir um solo de violoncelo e ter a mesma resposta emocional... a mágica da música, de poder se comunicar com as pessoas independentemente do idioma, é um milagre para mim.
Como ativista pelos direitos dos animais, o que faz para se manter são diante de todo o horror com o qual entra em contato?
Bem, você está supondo que sou são [risos]. Amo fazer música, mas o ativismo é a minha vida. O horror que você mencionou, os 100 bilhões de animais que são mortos anualmente de maneira cruel por humanos: eu tenho que utilizar esse dado sem deixar que ele me destrua. Esse horror me motiva a continuar, e tenho de usá-lo como ativista para tentar me comunicar com outras pessoas. Se levo meu ativismo a sério, não posso me dar ao luxo de perder a cabeça.
O debate sobre veganismo está em voga. Você tem algum conselho para pessoas que acham que é um estilo de vida difícil ou para quem tentou e desistiu?
Sim. Lembro de uma fala de Voltaire, que o presidente Barack Obama parafraseou: “Não deixe que a busca pelo perfeito se torne inimiga do bom”. É melhor ser vegano um dia da semana do que nunca ser. É melhor fazer algo do que não fazer nada.