Baseado em artigo da Rolling Stone, Cães de Guerra mostra como dois garotos bobões ficaram ricos de forma improvável
O sonho americano de ficar rico com uma ideia brilhante mudou. Hoje em dia, a mina de ouro está em criar um aplicativo de celular inovador ou uma tecnologia revolucionária, mas nos anos 2000 um jeito eficiente de chegar lá era achando brechas no sistema. Foi assim que os personagens de Cães de Guerra descobriram como faturar com o lucrativo mercado de contratos militares. “Em Miami, dois melhores amigos de 20 e poucos anos conseguem vender centenas de milhões de dólares em munição para o Exército norte-americano e entram para a lista dos maiores traficantes de armas da Guerra do Golfo”, resume Miles Teller, intérprete do protagonista David Packouz, sobre o longa que chega aos cinemas em setembro. O filme é baseado em uma matéria publicada pela Rolling Stone EUA em 2011 (que também resultou em livro). O diretor, Todd Phillips, leu a reportagem quando estava voando para Bangcoc durante as filmagens de Se Beber, Não Case! Parte II. “Recebo muitas coisas que podem render um bom filme, mas depois que começo a me aprofundar percebo que algumas delas funcionam apenas como artigos mesmo. Nesse caso, quanto mais pensava nas oportunidades de elenco e de loucura, mais achava interessante”, explica.
O enredo de Cães de Guerra passa muito perto de um tema polêmico nos Estados Unidos, o direito do cidadão a ter acesso a armas, algo garantido pela Constituição do país, mas que tem causado diversos problemas e protestos. Porém, o roteiro não chega a cutucar a ferida de forma contundente. Phillips justifica que o longa é sobre armamento militar. “Até quem é contra as armas por aqui não discorda de que os militares precisam delas. Não acho que o filme aborde
a restrição ao uso de armas nos Estados Unidos – que está completamente fora de controle, é uma situação ridícula. Espero que as pessoas percebam que a maneira como o governo norte-americano negocia armas serve para ilustrar como a situação está ruim e merece ser condenada. Isso não caberia a dois garotos que nem sabiam o que estavam fazendo”, explica. “Estávamos falando sobre isso: é curioso ver como a imprensa internacional reage ao filme, porque existe uma certa graça em rir dos norte-americanos”, diz Jonah Hill. “É interessante, especialmente para um cineasta como Todd, explorar o humor e a tristeza de como nos comportamos diante das leis.” Teller completa: “Podemos entender que um dos personagens é ganancioso, o outro só queria sustentar sua família e encontraram uma brecha no sistema que leva ambos por numa jornada muito louca. Existe uma grande zona cinzenta aí e, no mínimo, eles moldaram e trouxeram a conversa à superfície”.
Uma presença constante e bem-vinda ao longo de Cães de Guerraa são as referências a Scarface (1983), clássico de Brian De Palma estrelado por Al Pacino. Ela está, inclusive, em um dos cartazes de divulgação, que homenageia o pôster original do clássico, que por sua vez pode ser visto no escritório dos protagonistas. “Scarface foi muito importante nesse filme, porque esses caras queriam viver como se fossem ele [Tony Montana]. É como em qualquer episódio do programa MTV Cribs, que mostrava a casa dos artistas nos anos 2000: sempre tinha um pôster do longa de De Palma na casa dos rappers. Cães de Guerra virou uma representação do sonho americano pela lente do crime”, contextualiza Jonah Hill. A ligação entre as duas produções foi tão forte que a trilha da clássica cena de passagem de tempo, quando Montana (Pacino) toma o poder do tráfico e ganha muito dinheiro ao som de “Push It to the Limit”, de Paul Engemann, foi considerada para certo ponto de Cães de Guerra. “Em um momento, estávamos aproveitando muito mais daquela trilha, mas eu mostrava para às pessoas na edição e elas me perguntavam por que tinha escolhido aquela música velha. A maioria não entenderia a piada, seria muita referência interna”, analisa Phillips.
Como essa é uma história baseada em fatos reais e os protagonistas, Packouz – que faz uma ponta tocando “(Don’t Fear) the Reaper”, do Blue Öyster Cult, em uma casa de repouso – e Efraim Diveroli, existem de verdade, parte do trabalho dos atores consistiu em conhecer e se surpreender com as pessoas que estão interpretando. “O que aprendi sobre isso é que elas geralmente não têm a melhor perspectiva sobre si mesmas”, conclui Teller.