Baden Powell/ Vinicius de Moraes
© Baden Powell/Vinicius de Moraes
No candomblé, não existe cerimônia sem a presença de Ossanha. É essa entidade que detém a força mágica das plantas - o axé - necessária em todo ritual. Talvez esse seja o motivo de "Canto de Ossanha" ser a faixa de abertura de Os Afro-Sambas, de Baden e Vinicius, terceiro álbum surgido da união entre a música de Baden Powell e a letra de Vinicius de Moraes. O disco foi gravado num lampejo entre os dias 3 e 6 de janeiro de 1966 e lançado na sequência pelo selo Forma em duas versões: estéreo e mono, para quem ainda não tinha aparelho de som com dois canais. A canção ainda saiu no lado A de um compacto simples (acompanhada por "Tristeza e Solidão" no lado B) pelo mesmo selo."Canto de Ossanha" encabeçou um projeto concebido após Vinicius mostrar a Baden um disco que registrava cantos de candomblé, sambas de roda e vários solos de berimbau. O violonista se interessou muito e, quando foi à Bahia, conheceu os estilos de perto. Como outros afrossambas, "Canto de Ossanha" ganhou toques clássicos no arranjo do maestro Guerra Peixe, com um duo de saxofones conversando com o time do ritmo. À frente, o exímio violão de Baden, uma bela fl auta e o coro formado pelo Quarteto em Cy e outros amigos acompanham o diálogo entre Vinicius e a então dançarina e atriz Betty Faria. Nas palavras de Vinicius, Baden conseguiu "carioquizar, dentro do samba moderno, o candomblé afro-brasileiro, dando-lhe, ao mesmo tempo, uma dimensão mais universal". Esse sincretismo do Brasil com a África via Bahia, hoje tão natural, era de certa forma libertário nos anos 60. "Canto de Ossanha" ajudou o som de religiões afro-brasileiras, sistematicamente perseguidas até duas décadas antes, a entrar na MPB pela porta da frente.