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Obama no Comando

Em uma entrevista no Salão Oval da Casa Branca, o presidente discute guerra, economia e o que está em jogo no governo norte-americano

Por Jann S. Wenner Publicado em 16/12/2010, às 14h58

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<b>GUERRA EM CASA</b> O presidente norte-americano Barack Obama, na Casa Branca, em Washington D.C., em 17 de junho - PETE SOUZA/THE WHITE HOUSE
<b>GUERRA EM CASA</b> O presidente norte-americano Barack Obama, na Casa Branca, em Washington D.C., em 17 de junho - PETE SOUZA/THE WHITE HOUSE

Chegamos ao portão sudeste da Casa Branca pouco depois das 13h do dia 17 setembro. Era um dia agradável de outono, mas a capital parecia silenciosa e quase vazia, como ocorre às sextas-feiras no final do verão, com o Congresso norte-americano ainda em recesso. A Rolling Stone já havia entrevistado Barack Obama duas vezes anteriormente, ambas a bordo de seu avião de campanha - a primeira em junho de 2008, pouco depois de ele ser indicado como candidato pelo Partido Democrata, e a segunda em outubro do mesmo ano, um mês antes de sua vitória nas eleições. Desta vez, o editor-executivo Eric Bates e eu nos sentamos com o presidente no Salão Oval, ladeado por bustos de Abraham Lincoln e Martin Luther King Jr. A conversa durou mais de uma hora. O presidente começou elogiando minhas meias listradas multicoloridas. "Se eu não fosse o presidente", riu, "poderia usar meias assim".

Quando o senhor assumiu o cargo, sentia que conseguiria trabalhar com a oposição. Quando percebeu que os republicanos haviam abandonado qualquer esforço real de trabalhar com o senhor e criar uma política bipartidária?

Bom, eu diria que, devido às condições econômicas durante minha transição, entre minha eleição e a posse, nossa hipótese de trabalho era a de que todos iriam desejar se unir, porque havia uma chance considerável de termos uma derrocada financeira e o país inteiro entrar em depressão. Então, tivemos de trabalhar muito rapidamente para criar uma combinação de medidas que interromperia a queda livre e interromperia o desemprego.

O pacote de recuperação que formamos foi elaborado com a teoria de que não deveríamos excluir nenhuma ideia com base em predisposições ideológicas, e assim um terço do Recovery Act ("lei de recuperação") era de cortes fiscais. Esses eram os cortes de impostos mais progressistas da história, muito voltados para famílias de classe média. Havia não apenas uma mentalidade de justiça nisso mas também uma mentalidade econômica - essas eram as pessoas com mais probabilidade de gastar dinheiro e, assim, gerar demanda em um momento no qual a economia realmente estava congelando.

Ainda me lembro de ir à convenção do Partido Republicano para apresentar nossas ideias e pedir ideias a eles, antes de apresentarmos o pacote final. No caminho, o partido essencialmente divulgou um comunicado dizendo: "Votaremos 'não' como um todo." E isso foi antes mesmo de conversarmos. Naquele momento, percebemos que não teríamos o tipo de cooperação que esperávamos. A estratégia que os republicanos buscariam era a de ficar nas laterais, tentando bagunçar o coreto, com base na hipótese de que, dado o escopo e o tamanho da recuperação, a economia não seria muito boa, mesmo em 2010, e que seria melhor para eles atribuir a culpa a nós do que trabalhar conosco para tentar resolver o problema.

Como o senhor se sente com o fato de, dia após dia, haver esse ataque altamente destrutivo a qualquer coisa que o senhor proponha? Isso o incomoda? Fica chocado?

Não acho que seja um choque. Fui senador, vi como o atraso proposital se tornou uma ferramenta rotineira para desacelerar as coisas, o que é contrário do que era, uma ferramenta seletiva - embora frequentemente muito destrutiva, porque tipicamente era voltada para os direitos civis e as aspirações de afro-americanos que tentavam se libertar da segregação. Mas fui senador por tempo suficiente para saber que o maquinário ali estava quebrando.

O que me surpreendeu, e decepcionou - embora eu tenha de admirar, com inveja, sua eficácia -, foi o nível no qual o [líder da minoria no Senado] Mitch McConnell conseguiu manter sua cúpula unida em muitas questões. Eventualmente, conseguimos cansá-los, e finalmente pudemos aprovar leis muito importantes, algumas das quais não receberam muita atenção - a lei da reforma nos cartões de crédito, a legislação antitabagista ou a prevenção de fraudes em habitação e hipotecas. Conseguimos atrair dois ou três republicanos que queriam fazer o que era certo.

Só que os atrasos, os votos de encerramento e a obstrução inédita que ocorreram no Senado foram prejudiciais. Mesmo se você eventualmente conseguia algo, demoraria tanto e seria tão disputado que enviava uma mensagem ao público do tipo: "Caramba, o Obama disse que assumiria e mudaria Washington, e está exatamente na mesma, mais contencioso do que nunca". Tudo parece se arrastar - mesmo o que deveriam ser atividades rotineiras, como nomeações, não estão acontecendo, então isso criou uma atmosfera na qual um público que já está bastante desconfiado do governo, mas talvez tivesse esperança logo depois da minha eleição, ficou desanimado e sentia que "só estamos vendo mais do mesmo".

O que o senhor acha do canal Fox News? Acredita que seja uma boa instituição para os Estados Unidos e a democracia?

[Risos] Olha, como presidente, jurei respeitar a Constituição, e parte dela é a liberdade de imprensa. Temos uma tradição neste país de uma imprensa que frequentemente tem uma opinião forte. A era dourada de imprensa objetiva foi um período muito curto em nossa história. Antes disso, havia pessoas como [William Randolph] Hearst que usavam seus jornais muito intencionalmente para promover seus pontos de vista.

Acho que a Fox faz parte dessa tradição - que tem um ponto de vista muito claro e inegável. É um ponto de vista do qual discordo, que acho essencialmente destrutivo para o crescimento de longo prazo de um país com uma classe média vibrante e que é competitivo no mundo. Mas, como uma empreitada econômica, tem sido incrivelmente bem-sucedida. E desconfio que se você perguntar a [Rupert] Murdoch [dono da emissora] qual é sua principal preocupação, ele responderá que é a de que a Fox tenha muito sucesso.

Vou perguntar sobre reforma financeira. Apesar de todas as coisas, como proteção aos consumidores, que o senhor conquistou, a regulação de Wall Street - especialmente o fechamento de toda a negociação de derivativos que estava no cerne da crise financeira - parece ter sido estripada.

Tenho de discordar disso. Se você olhar para isso, o que dissemos basicamente é que a vasta maioria dos derivativos agora será vendida através de uma câmara de compensação. E, se você perguntar aos especialistas qual é a melhor forma de garantir que o mercado de derivativos não derrube a economia novamente, a resposta é a transparência, para que todos entendam quais são as contrapartes, qual é o negócio, quais são os riscos - está tudo na mesa, às claras.

As pessoas têm preocupações legítimas de que se as regras elaboradas por todas essas agências responsáveis pela implementação da reforma financeira tiverem exceções tão grandes que dá para dirigir um caminhão entre elas, e de repente você tem esses derivativos feitos especialmente sob medida e vendidos fora da câmara de compensação, poderá acabar com uma estrutura reguladora inadequada. Mas se as regras forem escritas adequadamente - e tenho confiança de que as pessoas que indiquei para essas agências têm a intenção de aplicá-las adequadamente -, isso fará a diferença. Vai resolver cada possível problema em Wall Street em um mercado de capitais mundial de trilhões de dólares? Provavelmente não. Poderá haver novos esquemas, novas brechas que alguém irá tentar explorar. Os interesses especiais já estão esquentando os motores para tentar influenciar o processo de elaboração de regras, então temos que ficar atentos, mas dizer que não melhoramos consideravelmente a supervisão do mercado de derivativos simplesmente não é verdade.

Também há uma preocupação quando se trata da reforma financeira de que sua equipe está altamente identificada com Wall Street e com a desregulamentação que causou o colapso. Essas são pessoas que deveriam ter ficado de olho em Wall Street, e muitas delas trabalhavam para ou eram próximas de bancos como Goldman Sachs.

Antes de mais nada, quero dizer que...

O senhor trabalhou no Goldman Sachs!

[Risos] Exatamente. Li algumas matérias que Tim Dickinson e outros escreveram na Rolling Stone [norte-americana] . Entendo o ponto de vista deles, mas olha: [o secretário do tesouro] Tim Geithner nunca trabalhou no Goldman; [o conselheiro econômico] Larry Summers não trabalhou no Goldman. Não há dúvida de que eu trouxe um bando de pessoas que entendem de mercados financeiros da mesma maneira, aliás, que Franklin D. Roosevelt trouxe muitos homens que entendiam de mercados financeiros depois do crash de 1929 - incluindo Joe Kennedy, porque meu trabalho principal naquele momento era garantir que não tivéssemos uma crise financeira total.

O motivo pelo qual isso era tão importante não era porque estava preocupado em garantir que quem ganhava milhões de dólares mantivesse seus bônus no ano seguinte, mas sim porque víamos 750 mil empregos sendo perdidos por mês quando tomei posse. A consequência para as pessoas comuns foi catastrófica e tínhamos de estancar a hemorragia. Conseguimos estabilizar os mercados financeiros a um custo muito inferior aos contribuintes do que o esperado. A verdade é que esse TARP [programa para impulsionar o setor financeiro] acabará custando menos de US$ 100 bilhões, no final das contas. E garanto que, há dois anos, você poderia perguntar a qualquer economista e especialista financeiro e ele teria dito "Aceitamos esse negócio".

Uma das coisas que você percebe quando está na minha posição é que, tipicamente, os problemas que chegam à minha mesa - não há respostas simples para eles. Normalmente, o que faço é operar com base em várias probabilidades: vejo as melhores opções disponíveis com base no fato de que não há escolhas fáceis. Se houvesse, outra pessoa teria resolvido o problema e ele não chegaria à minha mesa.

Isso é verdadeiro para a reforma regulatória financeira, para o Afeganistão, para como lidamos com a ameaça terrorista. Em todas essas questões, você tem um número enorme de fatores complexos envolvidos. Quando se está do lado de fora, você pode pensar "Bom, isso parece simples", e pode trabalhar baseado em suas predisposições ideológicas.

O que estou tentando fazer - e certamente o que estamos tentando fazer em nossa equipe econômica - é manter uma estrela guia ali: quais são os princípios centrais que seguimos? Na esfera econômica, meu princípio central é que os Estados Unidos funcionam melhor quando há uma classe média crescente e escadas para que as pessoas que ainda não estão lá possam aspirar a virar classe média, e, se essa base ampla está rolando, o país vai bem.

Vamos falar sobre a guerra no Afeganistão. Onde o senhor estava quando ouviu os comentários feitos pelo general Stanley McChrystal e sua equipe e como se sentiu ao lê-los?

Estava no meu escritório na residência, na Sala de Tratados. [O vice-presidente] Joe Biden me ligou - ele foi o primeiro a ouvir falar disso. Acho que era uma noite de domingo e pedi para um funcionário enviar uma cópia, e li a matéria inteira. Quero começar dizendo que acho o general McChrystal um bom homem, um soldado excepcional e que ele serviu o país muito bem. Não creio que tenha feito aqueles comentários maliciosamente, acho que alguns deles vieram de sua equipe, então ele estava mal assessorado. E me doeu ter de tomar aquela decisão. Tendo dito isso, ele demonstrou um mau julgamento. Quando coloco alguém a cargo da vida de 100 mil jovens em uma situação muito perigosa, essa pessoa tem de se portar de maneira exemplar, e não foi isso o que ele fez.

Mas não pode ter sido só esses comentários, que foram casuais e perdoáveis. A matéria inteira foi bastante incriminadora.

Os comentários em si, acredito, mostraram mau julgamento. O restante da matéria teve a ver com uma série de escolhas muito difíceis e complexas em solo no Afeganistão, onde, como disse, não há respostas fáceis. Então, o McChrystal, em resposta a uma preocupação muito séria e legítima sobre mortes de civis no Afeganistão, deu ordens que reduziram essas mortes consideravelmente. O reverso disso é que isso frustra nossas tropas, que sentem que podem não ser capazes de ir à ofensiva de maneira tão eficaz e isso pode colocá-las em perigo. Este é um debate estratégico e tático profundo que ocorre no exército. Não é exclusivo do general McChrystal - é um debate que o general [David] Petraeus [comandante das tropas no Afeganistão] está tendo de abordar, que eu tenho de abordar como chefe do Estado Maior.

Para ampliar a questão por um segundo, você perguntou sobre as fontes de frustração na comunidade progressiva; claramente, o Afeganistão está quase no topo da lista, talvez até no topo. Sempre tento enfatizar que, número um, isso não deveria ter sido surpreendente. Quando fiz campanha, fui muito específico, disse: "Vamos terminar a guerra no Iraque, aquilo foi um erro", e foi o que fiz. O que eu também disse foi que precisamos reforçar o que fazemos no Afeganistão, porque é de onde a ameaça terrorista original surgiu, e precisamos terminar o trabalho. É o que estamos fazendo.

Agora, acho que muitos apoiadores pensaram que talvez fosse mais fácil do que realmente é tentar levar o Afeganistão a um lugar onde podemos ver uma luz no fim do túnel. O fato é que, quando chegamos, descobrimos que a negligência no Afeganistão havia sido mais profunda do que esperávamos. Alguns exemplos simples: o Exército Nacional Afegão, as forças de segurança do Afeganistão, frequentemente era recrutado, recebia uniformes, rifles e só - nada de treinamento. Funcionalmente, não havia como ele começar a tomar o lugar das tropas norte-americanas.

O que tivemos de fazer após uma ampla revisão na qual me envolvi era dizer a nossos comandantes em solo: "Vocês precisam ter uma estratégia na qual treinamos forças de segurança afegãs, rompemos o impulso do Talibã, mas vou estabelecer uma data na qual iniciaremos a transição e começaremos a entregar essas funções de segurança para uma força de segurança afegã recém-treinada." Estamos nesse processo.

É arredondar um custo terrível. Sempre que vou a Walter Reed ou Bethesda, ou quando estive no Afeganistão e encontrei rapazes que perderam as pernas ou tiveram outros ferimentos graves, sou lembrado desse custo. Ninguém mais do que eu quer poder terminar uma guerra de uma forma que garanta que a região não seja usada como base para ataques terroristas contra os Estados Unidos, mas o que temos de fazer é acompanhar esse processo. A partir de julho de 2011, iniciaremos um processo de transição, e, se a estratégia que adotamos não funcionar, vamos reexaminá-la até garantir que tenhamos uma que funcione.

Uma pergunta sobre o derramamento de óleo no Golfo. A British Petroleum demitiu Tony Hayward, então a questão é: por que o Secretário de Interior Ken Salazar ainda está no emprego? A corrupção no Serviço de Gerenciamento de Minerais era amplamente conhecida quando ele assumiu o cargo, foi denunciada várias vezes na Rolling Stone e em outros veículos e ajudou o desastre do Golfo a acontecer.

Quando Ken Salazar entrou, ele falou para mim: "Uma das minhas principais prioridades é limpar a MMS [serviço de administração dos minerais]." Não era segredo. Havia um tipo de comportamento naquele cargo que era abusivo e o Ken reformou a agência para eliminar esses lapsos éticos cruciais - drogas, outras coisas ruins reportadas ali. O que o Ken admite, eu admito e pelo qual temos de assumir responsabilidade é que ele não mudou totalmente os conflitos institucionais inerentes ao cargo. Se você perguntar por que não fizemos isso, a resposta muito simples é que este é um grande governo com muitas pessoas, e mudar burocracias e agências é um processo que consome tempo. Simplesmente não fizemos isso rápido o suficiente.

Tendo dito isso, a pessoa colocada a cargo da MMS foi demitida. Trouxemos Michael Bromwich, alguém que leva a sério a missão de limpar essa agência. Estamos comprometidos em garantir que esse lugar funcione da forma como deveria, mas quando tenho alguém como Ken Salazar, que tem sido um servidor público excepcional, que leva suas coisas a sério, que sangra quando vê o que está acontecendo no Golfo e começou em um caminho de reforma, mas não chegou com a rapidez possível em cada aspecto dela, simplesmente tive de lhe dizer. "Você é responsável, espero que mude isso." Tenho confiança de que ele pode fazer isso e acho que ele está no processo.

James Hansen, cientista da Nasa que talvez seja a autoridade mais respeitada sobre aquecimento global, diz que a mudança climática é a questão moral predominante do século 21, comparável à escravidão enfrentada por Abraham Lincoln e à resposta ao nazismo enfrentada por Winston Churchill. O senhor concorda com essa afirmação?

Concordo que a mudança climática tenha o potencial de provocar efeitos devastadores sobre as pessoas no mundo inteiro e temos de fazer algo quanto a isso. Para tal, temos de nos mobilizar nacionalmente e internacionalmente.

Nos últimos dois anos, não fizemos tanto progresso quanto eu gostaria quando tomei posse. É muito difícil progredir nessas questões em meio a uma enorme crise econômica, porque a inclinação natural no mundo inteiro é dizer: "Quer saber? Pode ser um problema enorme, mas agora um problema realmente grande é ter 10% de desemprego" ou "Um problema realmente grande é que nossas empresas não conseguem empréstimos". Isso desviou a atenção do que considero uma prioridade urgente. A Câmara dos Deputados tentou lidar com a questão de uma maneira séria. Não foi perfeita, mas foi séria. Não conseguimos os 60 votos para uma abordagem comparável no Senado.

Uma de minhas principais prioridades para o próximo ano é ter uma política energética que comece a abordar todas as facetas de nossa dependência excessiva de combustíveis fósseis. Podemos ter de fazer isso em partes, em vez de uma legislação abrangente, mas nos manteremos nisso porque é bom para nossa economia, para nossa segurança nacional e, no final das contas, para nosso meio ambiente. No entanto, entenda que, mesmo na ausência de legislação, demos passos nos últimos anos que fizeram uma diferença significativa. Darei um exemplo, no qual às vezes penso que a comunidade progressiva simplesmente guarda o que fazemos, não dá valor a isso e depois pergunta: "Por que você não fez isso?"

Instituímos o primeiro aumento nos padrões de eficiência de combustível neste país em 30 anos. Antes, a Califórnia tinha algumas regras muito rigorosas, e outros Estados tinham umas muito mais fracas. Agora, temos uma só regra. Não é só isso - caminhões não eram cobertos e havia todo tipo de brecha - foi assim que os utilitários esportivos rodavam a 3 quilômetros o litro. Agora, todos estão regulados - não apenas carros, mas também caminhões. Fizemos isso com a anuência da indústria automobilística, que nunca havia concordado com isso. Estamos tirando o equivalente a milhões de carros das estradas, quando se trata da quantidade de gases de efeito estufa produzidos.

É suficiente? Absolutamente não. O progresso que fazemos em energia renovável, em melhorar equipamentos prediais e garantir que estejamos reduzindo o uso de eletricidade - tudo isso, cumulativamente, se continuarmos nisso nos próximos anos, permitirão á que atinjamos a meta que defini, que seria uma redução de aproximadamente 17% em nossos gases de efeito estufa.

Só que teremos de fazer muito mais. Quando converso com o [Secretário de Energia] Steven Chu, que, aliás, foi um herói anônimo no derramamento de óleo no golfo - ele foi lá e ajudou a elaborar a maneira de tapar o buraco com os engenheiros da BP -, ninguém é maior defensor da causa da redução de mudança climática do que ele. Quando pergunto como resolveremos esse problema internacionalmente, ele responde que podemos fazer cerca de um terço disso através de eficiências e tecnologias existentes, um pouco mais através da precificação do carbono, mas essencialmente precisaremos de algumas inovações tecnológicas. Então, os investimentos que estamos fazendo em pesquisa e desenvolvimento em torno de energia limpa também serão importantes se quisermos atingir essa meta. Estou satisfeito com o que já fizemos? Absolutamente não.

O que o surpreendeu mais sobre estes primeiros dois anos no cargo? Que conselho o senhor daria a seu sucessor sobre os primeiros dois anos?

Nos últimos dois anos, o que eu provavelmente esperava, mas você não entende totalmente até assumir o cargo, é algo que já disse - se um problema é fácil, não chega à minha mesa. Se há uma solução óbvia, nunca chega aqui -, outra pessoa já a resolveu há muito tempo. As questões que chegam à minha mesa são difíceis e complicadas, e frequentemente envolvem o conflito não entre certo e errado, mas entre dois certos, e você tem de equilibrar e conciliar valores concorrentes igualmente legítimos.

Uma coisa que me orgulha muito é que, como uma administração, mantivemos nossa bússola moral, mesmo enquanto trabalhamos nessas questões bem difíceis. Não significa que não tenhamos cometido erros, mas acho que levamos o país para uma direção profundamente melhor nos últimos dois anos.

Que músicas o senhor tem escutado? O que descobriu, o que o comove atualmente?

Meu iPod tem umas 2 mil músicas e é uma grande fonte de prazer para mim. Provavelmente ainda ouço mais as músicas da minha juventude do que coisas novas. Ainda há muito Stevie Wonder, muito Bob Dylan, muito Rolling Stones, muito R&B, muito Miles Davis e John Coltrane. São os clássicos. Muita música clássica. Não sou grande conhecedor de ópera em termos de ir a um espetáculo, mas há dias nos quais Maria Callas é exatamente o que preciso.

Graças ao Reggie [Love, assessor pessoal do presidente], meu gosto em rap melhorou bastante. Jay-Z predominava, mas agora tenho algo de Nas e um pouco de Lil Wayne e outras coisas, mas não diria que sou especialista. [Minhas filhas] Malia e Sasha estão chegando a uma idade na qual começam a me atualizar no assunto. Música ainda é uma grande fonte de alegria e, às vezes, de consolo no meio de alguns dias que podem ser difíceis.

O senhor recebeu Bob Dylan aqui. Como foi?

Há uma coisa que amo no Dylan: ele era exatamente o que eu esperava. Ele não veio ao ensaio; normalmente, todos esses caras ficam ensaiando antes do show. Não quis tirar uma foto comigo - normalmente, todos os artistas morrem de vontade de tirar uma foto comigo e Michelle antes do show, mas ele não fez isso. Chegou e tocou "The Times They Are A-Changin'". Uma apresentação linda. Ele é tão absorto nisso que pode simplesmente chegar com um novo arranjo e a música soa completamente diferente. Termina a música, sai do palco - estou sentado na primeira fila - vem, aperta minha mão, meio que inclina a cabeça, dá um sorrisinho e sai. E só - depois ele foi embora. Essa foi nossa única interação com ele. E pensei: você quer o Bob Dylan assim, não é? Você não quer que ele seja todo simpático e sorridente com você, quer que seja um pouco cético com a coisa toda. Então aquilo foi muito bom.

Receber o Paul McCartney aqui também foi incrível. Ele é muito educado. Quando estava no palco cantando "Michelle" para a Michelle, pensei: "Imagine a Michelle crescendo, aquela garotinha da zona sul de Chicago, de uma família de trabalhadores". A noção de que um dia um beatle estaria cantando essa música para ela na Casa Branca - não dava para imaginar algo assim.

O senhor chorou?

Sempre que penso na minha mulher, ela consegue me emocionar. Minha esposa e minhas filhas, elas me emocionam.

(Após um sinal de seus assessores, o presidente encerra a entrevista e sai do Salão Oval. No entanto, pouco depois, retorna e diz que tem uma coisa a acrescentar. Fala com intensidade e paixão, repetidamente esfaqueando o ar com o dedo.)

Um comentário de encerramento que quero fazer: é indesculpável para qualquer democrata ou progressista agora ficar neutro nestas eleições. Pode haver reclamações sobre não fazermos algumas coisas, não com a rapidez suficiente, fazendo algumas concessões legislativas. Só que agora, temos uma escolha entre um Partido Republicano que foi para a direita de George Bush e quer adotar as mesmas políticas que nos meteram nesses desastres versus uma administração que, com alguns problemas admitidos, foi a mais bem-sucedida em uma geração no andamento de pautas progressivas.

A ideia de que temos uma falta de entusiasmo na base democrática, que as pessoas ficam sentadas reclamando, é uma irresponsabilidade.

Todos ali têm de pensar no que está em jogo nestas eleições e se querem que progridamos nos próximos dois, seis ou dez anos em questões cruciais como mudança climática, como devolver uma sensação de isonomia e otimismo a famílias de classe média que viram suas rendas cair 5% na última década. Se queremos o tipo de país que respeita os direitos e as liberdades civis, é melhor lutarmos nestas eleições, e agora estamos sendo derrotados por 8x1 por essas organizações com isenção fiscal que o tribunal de Roberts diz que podem gastar impunemente sem divulgar de onde o dinheiro vem. Em cada um desses distritos congressionais, você vê essas organizações independentes superarem os gastos de partidos políticos e de candidatos por, como disse, fatores de 4x1, 5x1, 8x1, 10x1.

Temos de tirar as pessoas de cima do muro. Elas precisam sair dessa letargia e se preparar. Fazer mudanças é difícil - foi o que disse durante a campanha. Tem sido difícil e temos algumas marcas de guerra para mostrar, mas se as pessoas agora querem pegar a bola e ir para casa, isso me diz que elas nunca levaram isso a sério.

Se você leva a sério, agora é exatamente a hora de sair do muro.