A internet transformou-se em uma rede de insultos de cidadãos que apelam para o sentimentalismo político barato sem chance de debate
Imagine o presidente Lula, entre uma reunião com a Ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e uma conferência com o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, acessando o YouTube para assistir a seus clipes preferidos. Ou sacando o celular do bolso e mandando um SMS para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Quem sabe consultando seu chefe de gabinete, Gilberto Carvalho, pedindo permissão para conversar no MSN (bloqueado no Planalto).
Nenhum dos assessores do presidente procurado pela Rolling Stone Brasil soube confirmar se é do feitio de Lula navegar na internet. Mas o fato é que, se quisesse, ele poderia conectar-se diariamente, ter e-mail pessoal e mandar mensagem pelo celular - tudo nos conformes da lei brasileira. O que, aliás, deixaria Barack Obama em desvantagem virtual.
Obama assumiu a presidência dos Estados Unidos injuriado por ter de abandonar seu BlackBerry. A legislação dos Estados Unidos dita que eles, os chefes de Estado, devem oferecer à população acesso a todas as suas correspondências. Mudando essa lei, ele conseguiu que o serviço secreto norte-americano lhe garantisse um modelo Sectera Edge, um celular capaz de criptografar conversas secretas e documentos confidenciais (tudo em prol da segurança). Em campanha, Obama já tinha se valido de todas as ferramentas virtuais disponíveis, conseguiu arrecadar milhões de dólares em doações e conquistou outros milhões de eleitores através de mensagens. Não só isso: investiu em material de campanha em sites, publicou vídeos e não fugiu de debates online. O resultado é indiscutível: o mundo virtual foi essencial para a vitória do democrata.
Ao ser reeleito presidente da República em 2006, Luiz Inácio Lula da Silva não usou dessa tecnologia de conquista de novos eleitores, informação confirmada pela pesquisadora Sylvia Iasulaitis, doutoranda em Ciência Política pela Universidade Federal de São Carlos (SP). Na época, ela estudou o funcionamento dos websites de Geraldo Alckmin, do PSDB, e de Lula, do PT, ao longo do primeiro e segundo turnos da eleição. Descobriu que, com a exceção de enviar e-mails, as duas páginas não ofereciam interação. "Não houve possibilidade de publicação de mensagens, sala de bate-papo com ou sem a presença dos candidatos, tampouco medidas que possibilitassem a comunicação lateral entre os cidadãos", apurou a pesquisa.
No estudo "Internet, Espaço Público e Marketing Político", do professor Bernard Sorj, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), encontramos uma pista para explicar o desinteresse dos políticos em criar uma comunicação de mão dupla com seus eleitores. Para Sorj, como a internet não é regulamentada, fica muito difícil lidar com difamações e críticas, uma vez que não é possível saber, muitas vezes, nem nome nem rosto dos signatários das mensagens.
É fato. Um levantamento da jornalista Isabela Tavares, realizado na Universidade do Legislativo (Unilegis), encontrou 1.780 comunidades no Orkut em referência aos parlamentares federais brasileiros. No universo de 594 atores - 513 deputados federais e 81 senadores -, 447 (75,25%) têm comunidades a eles dedicadas, muitas delas (16,27% do total) com conteúdo bastante ofensivo.
O senador Tião Viana (PT-AC), por exemplo, é citado em uma comunidade na categoria "Gays, Lésbicas e Afins", na qual o criador e seus seguidores sonham em ter uma noite de amor com o político. Outro senador, Osmar Dias (PDT-PR), incitou o ódio de um eleitor que, sem publicar seus motivos, postou declarações que põem em cheque a capacidade mental do parlamentar.
Você lê esta matéria na íntegra na edição 29, fevereiro/2009