Ex-vocalista do Ludovic, Jair Naves extravasa angústias de forma mais mansa em primeiro disco solo
Jair naves estava à beira dos 30 anos e se via sozinho. O Ludovic, banda liderada por ele e dona de fiéis seguidores no cenário independente paulistano, chegou ao fim em junho de 2008. Depois de oito anos e dois discos, o músico não tinha mais escudo. Entre dúvidas e engolido pelo imenso buraco negro da liberdade, encontrou o caminho ao assistir ao filme O Caso dos Irmãos Naves (1967), de Luís Sérgio Person, uma história real de dois homens – primos da avó dele, descobriu mais tarde – torturados injustamente até a morte durante o regime ditatorial de Getúlio Vargas. A história se passa em Araguari, Minas Gerais, onde o brasiliense Naves cresceu, ao lado da família do pai, antes de se mudar para São Paulo, aos 8 anos.
Foi o estalo para Araguari, EP de quatro músicas gravado quase inteiramente por ele. No trabalho lançado em 2010, a guitarra foi trocada por violão, piano e voz doce. As letras, ainda viscerais, giravam em torno de um conceito autobiográfico: nostalgia, medos e arrependimentos. Diante dessa nova dinâmica, Naves compreendeu a necessidade de uma jornada interna. “Fiquei muito tempo com essa dúvida”, ele conta. “Ainda estava inseguro, testava coisas mais melódicas do que da época com o Ludovic”, complementa, confirmando a importância do EP para o momento vivido em 2012, com o lançamento da estreia solo, E Você Se Sente numa Cela Escura, Planejando a Fuga com as Próprias Mãos.
Acompanhado pela banda base formada por Alexandre Molinari (baixo), Renato Ribeiro (guitarra), Thiago Babalu (bateria) – além da surpreendente sanfona de Cimara Fróis em “No Fim da Ladeira, entre Vielas Tortuosas” –, o músico percebeu que seu “leque de possibilidades havia se ampliado”. As provas são a delicada “A Meu Ver” ou “Pronto para Morrer (O Poder de uma Mentira Dita Mil Vezes)”, primeiro single do disco. “Nunca havia feito uma letra tão grande”, diz sobre a última, uma faixa sem refrão, com 4 minutos e meio.
Filho de uma católica, ele fez “Maria Lúcia, Santa Cecília e Eu” para a mãe, uma canção com temática mais esperançosa. “Foi um dos momentos mais marcantes da gravação deste disco”, ele diz. O músico registrou a voz, inseguro, diante de Renato Ribeiro e Fernando Sanches, produtores do disco. “Pedi para que falassem se estivesse muito tosco.” Ao fim do último verso, os dois engoliam o choro. Aos 32 anos, diante de um caminho, Jair Naves não está mais sozinho.