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Sapos, Trapaças e Canos Fumegantes

Ameaças de processos mantêm inédito no Brasil filme que expõe escândalos no país

André Perfeito Publicado em 09/04/2008, às 15h12 - Atualizado em 15/05/2008, às 18h35

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Cenas de <i>Manda Bala</i>, de Jason Kohn. No alto, à direita, o ex-senador Jader Barbalho - Divulgação
Cenas de <i>Manda Bala</i>, de Jason Kohn. No alto, à direita, o ex-senador Jader Barbalho - Divulgação

Este filme não pode ser exibido no Brasil", alerta o letreiro na cena de abertura de Manda Bala, o documentário vencedor do prêmio do júri no Festival de Sundance, em 2007. Dirigido por um cineasta estreante, o norte-americano Jason Kohn, o filme mostra o Brasil sob uma perspectiva aterrorizante: o país se encontra em plena guerra de classe, 40 mil pessoas morrem por ano por conta de problemas ligados à má nutrição e violência, uma pessoa é seqüestrada por dia em São Paulo, a frota de helicópteros é gigantesca e a indústria da segurança fatura blindando carros e oferecendo cursos de direção defensiva para executivos amedrontados. Produzido ao longo de 2006, o filme não foi nem deverá ser exibido oficialmente no Brasil, uma vez que Kohn diz ter sido ameaçado de processo por partes envolvidas no documentário (ele não quis especificar detalhes).

A produção de Manda Bala começou por acaso. Filho de pai argentino e mãe brasileira, Kohn, 24 anos, não tinha muito interesse no país além de uma mera curiosidade durante a adolescência e, mais tarde, um gosto pela música e cultura local. Algo, porém, o incomodava: os comentários do pai, um empresário que fez carreira nos Estados Unidos, sobre a corrupção no Brasil. Foi então que o futuro cineasta teve acesso a um relatório de Jean Ziegler, o enviado especial da ONU ao Brasil em 2001. No documento, é traçado um panorama negativo do país, onde níveis de pobreza africana conviveriam lado a lado com bolsões de riqueza de Primeiro Mundo. Na época do relatório, Ziegler fez declarações polêmicas em entrevistas: "Em um país em que o solo é fértil e rico com clima tropical, passar fome é genocídio"; "Existe uma guerra de classes no Brasil. Quase 40 mil pessoas são assassinadas por ano. Para a ONU, 15 mil é um indicador de guerra".

Com base nesses dados, Kohn começou sua pesquisa a partir de uma indagação pessoal: "Há muito dinheiro no Brasil", explica. "A gente não pode achar que 40 mil mortes por ano são simplesmente tragédias. Já que há um crime, alguém é criminoso. Ok, vamos descobrir quem são esses assassinos." Assim se desenvolveu o roteiro de um documentário que não é exatamente investigativo, mas tenta ligar os pontos de uma cadeia difusa - mas coe-sa - entre corrupção e violência.

O ponto de partida foi o escândalo da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), fechada em 2001 por desvios de verbas e fraudes. Na época, uma auditoria apontou um desfalque de pelo menos R$ 1,7 bilhão na autarquia na época comandada pelo então Senador Jader Barbalho, do PMDB-PA. Havia indícios de que Barbalho desviara dinheiro da Sudam através de um ranário em nome de sua esposa, Márcia Centeno. José Osmar Borges (que sofria de câncer e se suicidou no final do ano passado), um dos sócios de Márcia, foi acusado pelo Ministério Público de desviar cerca de R$ 100 milhões em uma fazenda no Pará. Por causa das denúncias, Barbalho chegou a ser preso em 2002. Após ter renunciado ao cargo de senador, tornou-se deputado federal em 2006, pelo mesmo PMDB.

As cenas de Manda Bala se desenrolam entre diversos personagens envolvidos direta e indiretamente com o caso Sudam: os sapos do ranário, um seqüestrador que fugiu da seca no Nordeste, um cirurgião plástico mundialmente reconhecido pela técnica de reconstrução de orelhas decepadas (em seqüestros), além de trazer depoimentos de policiais e pessoas engajadas em prender o ex-senador.

"As pessoas no Brasil sabem de toda a corrupção, mas parecem não se sentirem ameaçadas ou emocionalmente horrorizadas", argumenta Kohn, ainda sem saber se Manda Bala será um dia exibido em território brasileiro (o filme será lançado em DVD em abril, por enquanto somente nos Estados Unidos). "O objetivo não é prender Jader Barbalho, mas tentar mudar a percepção do que a corrupção significa. Porque se existe um filho-da-puta roubando a 2 mil quilômetros de você, você acha que não lhe afeta, mas quando se percebe que a violência que existe em São Paulo é por conta desses caras, a trama fica mais pessoal."