Gustavo Bertoni fala sobre o processo criativo do álbum que chega após o ganhador do Grammy Latino Éter
Após estourar com a participação em Superstar, reality show musical da Globo, o Scalene desfilou potência com Éter (2015). O disco levou o Grammy Latino de Melhor Álbum de Rock em Língua Portuguesa e rendeu ao quarteto brasiliense a oportunidade de fazer mais shows do que nunca, com a agenda lotada ao redor do Brasil. Essas experiências estão refletidas em Magnetite, terceiro disco de estúdio do grupo formado por Gustavo Bertoni (vocais e guitarra), Tomás Bertoni (guitarra), Lucas Furtado (baixo) e Philipe "Makako" (bateria e vocais). Explore o processo criativo do LP neste guia faixa-a-faixa.
Por: Anna Mota
O stoner rock que abre Magnetite é a faixa que mais conversa melodicamente com o antecessor, Éter (2015). “É uma crítica aos extremos, que se mostram, principalmente na política hoje em dia. É um comportamento que só enfraquece a sociedade”, explica Gustavo Bertoni.
As novas escolhas musicais do Scalene começam a aparecer na segunda faixa, que explora o R&B enquanto fala sobre a necessidade de “propagar o bem”. “Também foi a primeira música em que usamos a influência do dance-punk”, relembra Bertoni.
Com letra assinada pelo vocalista, é a canção mais pessoal de Magnetite. “É uma reflexão sobre os dois últimos anos de banda. Com tanta exposição, é necessário fazer uma manutenção da própria essência. Me manter conectado comigo mesmo foi um desafio nesse período, mas hoje me sinto dez vezes mais ligado ao que sou.”
Após o lançamento de Éter, em 2015, o Scalene entrou em uma rotina intensa e fez shows por todo o Brasil para divulgar o álbum. Uma das influências adquiridas nessas viagens está refletida em “Esc (Caverna Digital)”. “Ouso dizer que usamos algo da música nordestina. Foi muito divertido fazer essa faixa, em que nos inspiramos em uma galera contemporânea, como o Boogarins e o Temples.”
Escrita pelo guitarrista Tomás Bertoni, a faixa afiada — que já ganhou um clipe — condena os falsos profetas. “Talvez algumas pessoas entendam errado, mas é uma música que traduz muito o estilo do meu irmão de ser. É uma crítica direta à exploração psicológica feita por esses caras”, diz Gustavo.
A sombria faixa vai da psicodelia à black music, sem deixar o pulso frenético de lado em nenhum momento. “Tem alguma coisa do Inky, ex-banda da Luiza [Pereira, namorada de Bertoni] na música. E é sobre essa loucura que vivemos, sobre domar o caos em vez de evitá-lo.”
É a música que carrega o nome do disco nos versos. “Magnetite visível, telepatia de ser” é a frase que entoa no início do refrão. O espiritualismo da canção vem de uma pedra, a magnetita, que é o mais magnético de todos os minerais da Terra. “E você sabia que ela existe em nossos corpos?”, indaga Bertoni.
A reinvenção e os comportamentos sociais são temas que permeiam as faixas que compõem Magnetite e são evidenciados nesta canção, outra escrita por Tomás. “Pelas redes sociais, e pelo ambiente em que vivemos, acabamos nos antecipando em nossos julgamentos com uma grande frequência hoje em dia”, explica Gustavo.
“É uma das minhas favoritas, uma mistura dos elementos que mais gostamos no R&B com o que mais gostamos no stoner rock. E a letra é quase um mantra para uma trilha sobre consciência limpa. Por que nós nunca pisamos em ninguém para chegar até aqui. Ela evidencia a situação do músico como um trabalhador comum, uma realidade pouco abordada.”
A melodia mescla batidas de R&B e jazz com um piano característico da MPB, três elementos que não haviam aparecido em nenhum dos dois discos anteriormente lançados pelo Scalene. “Nessa, falamos sobre como é importante entender os próprios privilégios e se despir deles.”
Enquanto “Extremos Pueris” conversa com Éter, o post-hardcore de “Heteronomia” acena a Real/Surreal (2013), disco de estreia do grupo. “O nome e a letra estão ligados à necessidade de pensarmos de forma autônoma, de se entender no mundo e de não permitir que sistemas que querem nos doutrinar, nos deixem cegos.”
O nome da canção vem da letra grega Phi, que representa uma constante matemática chamada proporção áurea, que é utilizada para estabelecer harmonia em formas geométricas, desenhos, construções arquitetônicas etc. “Eu estava lendo um livro sobre a razão áurea, e comecei a escrever sobre isso. Para mim, é algo ligado à empatia, à união, à natureza e ao momento que vivemos.”