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Stephen Hawking 1942-2018

Como um astrofísico se tornou um ícone da cultura pop global

Cady Drell Publicado em 19/04/2018, às 00h19 - Atualizado às 00h20

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<b>Gênio Trabalhando</b><br>
O professor Stephen Hawking em seu escritório em Cambridge em outubro de 2001

 - Ammar Abd Rabbo/Abaca/Sipa via AP Images
<b>Gênio Trabalhando</b><br> O professor Stephen Hawking em seu escritório em Cambridge em outubro de 2001 - Ammar Abd Rabbo/Abaca/Sipa via AP Images

Apesar de todas as teorias dele sobre o Cosmos, Stephen Hawking pode ser lembrado tanto pela avaliação do “universo em forma de rosquinha” de Homer Simpson quanto pela obra inovadora que deixou sobre a natureza do tempo e a existência de dimensões paralelas – e esta é apenas uma das muitas contribuições do cientista para um legado cômico surpreendentemente sólido.

Hawking, que morreu em 14 de março aos 76 anos, não era uma figura com chance de se tornar um ícone cultural pop adorado. A esclerose lateral amiotrófica, da qual recebeu diagnóstico aos 21 anos, deixou a mobilidade dele gravemente limitada e fez de um sintetizador de voz automatizado seu único meio de comunicação. Ele foi considerado uma das maiores mentes científicas de todos os tempos, sendo professor lucasiano de matemática da Universidade de Cambridge – um cargo um dia ocupado por Sir Isaac Newton. O livro mais famoso que publicou, Uma Breve História do Tempo, tornou assuntos complexos, como física quântica e a formação de buracos negros, compreensíveis para leitores que não têm Ph.D. É um assunto bastante denso (literalmente, no caso dos buracos negros) e não exatamente um material ideal para a comédia.

No entanto, mesmo enquanto questionava a forma como pensávamos sobre o universo, Hawking ainda teve tempo para exercer seu senso de humor maldoso. Quem, se não Hawking, poderia derrubar as teorias de Albert Einstein e também aparecer derrotando-o no pôquer em um episódio de Star Trek?

A página de Hawking no site IMDb está repleta de aparições icônicas na TV e, embora sempre tenha feito o papel de si mesmo (e poderia ser diferente?), a “versão alter ego” dele era engraçada pela arrogância e pela autodepreciação. Graças a uma participação em Os Simpsons, há uma grande chance de mais gente saber que ele não conseguiu formular uma teoria de campo unificada do que saber exatamente o que é isso. Em diversas aparições como ele mesmo em The Big Bang Theory, Hawking frequentemente lembrava ao protagonista da série, Sheldon, que era a única pessoa mais inteligente que ele. Em uma entrevista brilhante para o Last Week Tonight with John Oliver, em 2014, ele de alguma forma consegue ser mais mordaz que o próprio Oliver.

Quando outra pessoa poderia, compreensivelmente, ter se esquivado de usar suas limitações físicas para fazer uma piada, Hawking usou o tom robótico monotônico de seu sintetizador de voz, combinando-o com uma noção matadora de timing, para criar um efeito hilariantemente impenetrável. “Seja sincero, esta é a maior homenagem que você já recebeu?”, John Oliver pergunta a ele na entrevista. “É”, Hawking responde. Oliver devolve: “Que bom! É um pouco difícil de saber pelo seu tom de voz: você está sendo sarcástico?”. Depois de uma pausa, Hawking diz: “Sim”.

No comentário do DVD para sua primeira aparição em Os Simpsons, no episódio “They Saved Lisa’s Brain”, na décima temporada, os roteiristas revelam que Hawking não apenas foi às leituras de roteiro mas demoradamente digitava suas falas, que eles gravaram com um microfone como qualquer outro dublador. “É bom saber que estávamos pegando o homem mais brilhante do mundo e usando o tempo dele para gravar piadas sílaba por sílaba”, brincou o criador do desenho, Mike Scully (dizem que Hawking era fã do seriado, apareceu nele quatro vezes entre 1999 e 2010. Uma vez, até foi, segundo contam, a uma festa de Réveillon fantasiado de morador de Springfield).

Além de seu alter ego da cultura pop, no entanto, Hawking tinha uma sagacidade notável. Em uma entrevista de 2004 para o The New York Times, disse que “a vida seria trágica se não fosse engraçada”. E garantiu que fosse assim. Na biografia que escreveu sobre o cientista em 2013, Kitty Ferguson conta um caso incrível sobre como ele passava com a cadeira sobre os pés de pessoas que o irritavam e que um de “seus maiores arrependimentos na vida foi não ter tido a chance de passar por cima do pé de Margaret Thatcher”. Quando questionado sobre isso, o cientista fez a seguinte negação: “Um boato maldoso. Vou passar em cima do pé de quem repetir isso”.

Em 2015, perguntaram a Hawking qual era o efeito cosmológico da saída de Zayn Malik do One Direction. “Finalmente uma questão sobre algo importante”, disse, depois aconselhando qualquer jovem de coração partido a recorrer à física teórica para ter um consolo. “Não estaria além dos domínios da possibilidade que, em algum lugar fora do nosso Universo, exista outro universo diferente. E, nesse universo, o Zayn ainda está no One Direction.”

No entanto, esse senso de humor ainda não explica por que uma mente tão brilhante que tinha que pensar em muitas outras coisas usaria seu tempo e energia limitados para participar de programas de comédia. Talvez realmente gostasse disso e achasse que suas aparições fossem uma boa pausa na contemplação do Universo conhecido. Ou talvez fossem mais uma forma de ilustrar, como fez várias vezes, que a doença e seus efeitos colaterais debilitantes não o impediriam de fazer o que quisesse. Ou talvez o fato de ser professor e aparecer como si mesmo em algo tão acessível como Os Simpsons abrisse as portas para conhecerem seu trabalho mais acadêmico.

Ao aparecer por toda parte na cultura pop nerd, ele se tornou uma figura acessível que ajudaria os não gênios entre nós a ganharem uma entrada para pensamentos incrivelmente complexos. Provavelmente, não é coincidência que tenha começado a aparecer na TV em 1993 com aquela participação em Star Trek: The New Generation, cinco anos depois da publicação de Uma Breve História do Tempo. Por mais que o assunto do livro fosse impossivelmente difícil, vendeu 10 milhões de exemplares ao longo de duas décadas, um número que sugere que muita gente fora da comunidade da física tentou lê-lo.

Talvez o “porquê?” não seja realmente importante. Stephen Hawking foi inspirador, engraçado e brilhante. Se virar uma presença improvável na cultura pop tenha apresentado suas contribuições científicas a mais pessoas, melhor ainda. As aparições televisivas cimentaram seu legado como não apenas um dos maiores pensadores de nosso tempo, mas também como um ícone surpreendente da cultura pop, e quem estiver triste com a morte dele deve recorrer à física teórica – afinal, provavelmente há um universo por aí em que Stephen Hawking na verdade é o criador de Os Simpsons.