No segundo disco, Tudo Tanto, Tulipa Ruiz deixa o pop florestal de lado e devaneia na cidade
Em janeiro passado, Tulipa Ruiz passou pelo meio da plateia que a esperava no Cine Joia, uma casa de shows em São Paulo. Apesar de não estar atrasada para a apresentação que faria logo depois de Marcelo Jeneci, ela tinha um olhar de pânico fixo no rosto. A motivação para isso vinha de outro mundo – nada paranormal, mas eventualmente irreal. “Eu não sabia que tinham divulgado que o show era às 22h”, explica a cantora, tomando um chá de limão e gengibre no apartamento em que mora, na capital paulista. “Nessa hora, eu ainda estava em casa com a galera, fazendo um esquenta. E começaram a tocar terror em mim no Twitter e no Instagram, postando fotos da fila... Todo mundo me xingando por causa disso. Aí eu fiquei meio desesperada com essa coisa do ‘tempo real’, da reclamação ao vivo. Eu fui maluca para lá!”
Essa experiência pode não ter sido extremamente marcante para a cantora, mas une três elementos essenciais na concepção do recém-lançado Tudo Tanto, segundo disco de Tulipa: a correria das apresentações ao vivo, as pressões do mundo online na vida real e a urbanidade disso tudo. “Estou em uma velocidade bem urbana”, ela explica. “E este disco é um reflexo disso.” O antecessor, Efêmera (2010), alternava-se entre a cidade grande e o campo (no caso, o interior de Minas Gerais, onde mora a mãe dela), em algo que a cantora chamava de “pop florestal”. “Faz um ano e meio que não vou a São Lourenço, o que é um absurdo”, referindo-se à cidade de pouco mais de 40 mil habitantes onde cresceu. “No ano passado, foi o primeiro Natal que não passei lá.” (A questão já foi resolvida: no fim de semana seguinte à entrevista, Tulipa fez sua primeira apresentação no local desde a estreia em disco.)
Mesmo com essas inspirações que poderiam soar tensas, o resultado final mistura letras bem-humoradas, como a do dueto com Lulu Santos em “Dois Cafés”: “O banco, o asfalto, a moto, a britadeira / Fumaça de carro invade a casa inteira / Algum jeito leve você vai ter que dar / Sair pra algum canto, levar na brincadeira”. Nesse caso, até a mesma internet que causou desespero na artista no episódio do “show atrasado” serviu de conexão para a parceria. “Mandei um e-mail para o Lulu, que respondeu muito rápido”, ela conta. “Fiquei um tempão pensando no título do e-mail. Porque é muito complicado, né? Você desperta o interesse ou o desinteresse. Aí foi: ‘Lulu no meu novo disco?’. E ele respondeu: ‘Boa pergunta’.” O questionamento teve um final feliz, e o veterano – que já era fã da cantora – ainda tocou guitarra slide na faixa, além de cantar.
Mesmo com o clima de correria da turnê dominando o dia-a-dia de Tulipa – em 2011 foram 76 shows –, ela tinha pelo menos uma determinação clara para Tudo Tanto. “Eu não queria que ele parecesse, ou soasse como, um disco apressado”, conta. A postura foi meio assustadora para a banda e a equipe da artista, que trabalhavam com prazos e datas, apesar de o trabalho seguir o caminho do anterior, independentemente das grandes gravadoras. O título, por exemplo, essencial para o desenvolvimento do projeto gráfico do álbum, surgiu da forma mais relaxada possível. “Sonhei com o nome Tudo Tanto. Eu tinha um arquivo em Word com 400 mil nomes, fazia enquete com os amigos. E aí sonhei com isso. No sonho havia um raciocínio muito louco que fazia sentido e me levava a esse nome. Era algo do tipo: ‘Tulipa, é muito show, é muita coisa na sua vida, na das pessoas, e o nome do disco é esse!’”