Documentário alterna momentos em família e temas polêmicos para compor retrato da cantora
Com os olhos marejados e perceptivelmente nervosa, Cássia Eller olha para a câmera, faz sinal de positivo e sorri. Conhecida por uma postura explosiva no palco, a cantora, naquele momento, aguardava para dar à luz Francisco Eller, o Chicão, único filho dela. A cena, íntima e tocante, faz parte do documentário Cássia, do diretor Paulo Henrique Fontenelle, que chega aos cinemas em 29 de janeiro. Intercalando fotos, vídeos inéditos e entrevistas com artistas, amigos e familiares, a obra é uma viagem profunda ao universo da polêmica cantora, morta em 2001, aos 39 anos.
O filme contempla os fãs com um rico material, recuperando imagens da infância de Cássia e cenas das primeiras apresentações, em Brasília (cidade na qual ela foi morar aos 18 anos), além de registros caseiros, que mostram a cantora ao lado do filho e da mulher, Maria Eugênia. O documentário também é permeado por depoimentos emocionados. Os músicos Zélia Duncan e Nando Reis, ao lado de Nancy Ribeiro, mãe de Cássia – que fala abertamente sobre a sexualidade da filha e as crises de abstinência que ela enfrentou pouco antes de morrer – protagonizam os momentos mais tocantes.
“A Cássia é uma fi gura emblemática para a música brasileira, mas o público só conheceu o lado explosivo dela. Fora dos palcos, ela era uma pessoa doce, tímida e simples”, conta Fontenelle, experiente em obras biográficas após dirigir Loki: Arnaldo Baptista (2008) e Dossiê Jango (2013). O relato sobre a vida e a obra do integrante d’Os Mutantes foi o passaporte do cineasta para conseguir o apoio da família da cantora na realização do filme. “Quando enviei o projeto para a Maria Eugênia, ela me disse que o Chicão havia visto o documentário sobre o Arnaldo e gostado muito”, ele conta. “Por isso, eles se interessaram pela minha proposta.”
Fontenelle também faz questão de ressaltar que a viúva de Cássia pediu que a intérprete fosse mostrada como realmente foi, “sem máscaras, porque ela nunca escondeu nada sobre a vida dela”. Um destaque do documentário é o registro da luta travada por Maria Eugênia, companheira de Cássia por 14 anos, para manter a custódia de Chicão. O pai da artista, à revelia do resto da família, tentou obter a guarda do garoto na Justiça. O processo, vencido pela viúva, é um marco para os direitos civis das famílias brasileiras formadas por casais homossexuais.