"Inexorcizável (Um Zumbido Ensurdecedor)" saiu nesta quinta-feira, 23, nas plataformas digitais
Por Gabriel Nunes
O Ludovic é um fantasma que o tempo não exorcizou. Em hiato criativo desde Idioma Morto (2006), o grupo retorna “alérgico ao próprio suor” e com a autocomiseração característica que o consagrou na cena independente do início da década passada. Para cravar a volta aos estúdios e também a primeira vez que Jair Naves, Eduardo Praça, Zeek Underwood e Monttorso sobem ao palco do Sesc Pompeia, o quarteto paulistano divulga “Inexorcizável (Um Zumbido Ensurdecedor)”, primeiro lançamento em 11 anos.
Embora o instrumental da faixa tenha sido idealizado originalmente em 2008, a canção permaneceu sem letra e vocais até então.“Tínhamos algumas ideias inacabadas registradas em uma demo de 2008. Entre elas, estava essa base instrumental”, recorda Naves, que após o rompimento do grupo, em janeiro de 2009, enveredou pela carreira solo, lançando os discos E Você Se Sente Numa Cela Escura, Planejando a Sua Fuga, Cavando o Chão Com as Próprias Unhas (2012) e Trovões a Me Atingir (2015). Além disso, ele participa do duo folk NavesHarris, no qual canta ao lado da cantora norte-americana Britt Harris.
Apesar de o Ludovic ter realizado, em 2015, uma turnê de reunião, essa é a primeira vez desde o término da banda que o quarteto trabalha em cima de uma canção. Para Naves, isso foi o resultado de uma necessidade latente e inadiável de colocar as coisas a limpo. “Desde o fim havia ficado a sensação de algo mal resolvido. Pensamos que finalizar uma das muitas ideias abandonadas daquela época seria um ponto de retomada. E realmente foi.”
O grupo ainda se reuniu em 2016 para celebrar os dez anos do seminal Idioma Morto. Gravado no TC Estúdio durante primeiro semestre de 2006, o disco do então quinteto saiu no dia 7 de setembro, consolidando a sofisticação e o desenvolvimento lírico e sonoro da banda – mas sem perder a crueza e a urgência das canções, fatores indissociáveis da estética do Ludovic.
“Lembro que gostava de pensar naquelas composições como uma espécie de manifestação do inconsciente, algo que queria dizer e imagens que gostaria de verbalizar sem saber direito a razão ou o significado”, evoca o vocalista. “Esse material mais antigo é puramente emocional. Quase uma espécie de ‘terapia do grito’. É por isso que é interessante revisitar esse repertório: acabo encontrando muitas coisas que ainda reverberam intensamente dentro de mim e que eu nem lembrava direito que ainda estavam lá.”
Com versos como “quem eu já fui contra quem hoje eu sou” e “eu mesmo, um fantasma que o tempo não exorcizou”, o Ludovic busca revisitar o “país estrangeiro do qual nunca regressaremos”, tal como o escritor britânico C. S. Lewis definiu o tempo passado. No entanto, interpretá-la somente pelo viés nostálgico seria limitá-la a um sentimentalismo saudosista.
“Era inevitável que, no momento em que nos reuníssemos para trabalhar em um material novo, a gente acabasse olhando para trás e vendo onde paramos, quem éramos, o que mudou de lá pra cá”, diz Naves, que ainda destaca a canção como detentora de “alguns dos versos mais pessoais que já escreveu na vida”. “Ela fala sobre um certo estranhamento que se sente ao voltar, depois de muito tempo, a um lugar ou papel que te definiu enquanto pessoa em uma determinada época da sua vida. Mas a letra vai muito além desse questionamento sobre envelhecer. Ela fala também sobre insegurança, manipulação, desajuste social, impulsos autodestrutivos, enfim…”
Naves também ressalta ter ficado, em um primeiro momento, um tanto quanto receoso com a confecção da primeira faixa do Ludovic em 11 anos. Para ele, compor e lançar “Inexorcizável” seria como uma espécie de "parâmetro preliminar" para saber se as fontes criativas da banda ainda estariam férteis e prontas para um possível sucessor de Idioma Morto. “Não dava mais pra seguir só com turnês comemorativas”, enfatiza. “Era algo com que nenhum de nós se sentia confortável e caso a gente percebesse que não existia mais química seria desonesto continuar fazendo shows inteiramente baseados nos discos antigos.”
Satisfeito com a feitura da canção, ele declara ter “ficado claro que [o Ludovic] ainda funciona tocando junto”, bem como estar trabalhando “com calma” em novas composições ao lado do grupo para lançar no segundo semestre de 2018. “Antes disso, o Eduardo lançará o disco dele, sob a alcunha de Apeles, e eu também quero finalizar meu próximo álbum solo ainda este ano. Enquanto isso, aproveitamos esse tempo para ir desenvolvendo as ideias com a devida calma.”
Ouça abaixo o mais recente single do Ludovic.