A volta do Little Quail and the Mad Birds

Redação

Publicado em 03/02/2009, às 10h35

Por Pablo Miyazawa

No domingo último, primeiro dia de fevereiro, uma platéia de duzentos e poucos pagantes assistiu ao retorno aos palcos do Little Quail and the Mad Birds.

Não era exatamente um retorno, mas um show-reunião sem pretensões além das nostálgicas. O trio, formado em Brasília no fim dos anos 80 - e que foi um dos primeiros a gravar disco pelo selo Banguela, do produtor Carlos Eduardo Miranda -, desapareceu no fim dos anos 90 não sem deixar vestígios: Gabriel Thomaz, o frontman, partiu para liderar outro trio, o Autoramas. Bacalhau, o baterista, tentou a sorte com seu próprio grupo (o Rumbora) e acabou se estabelecendo no Ultraje a Rigor. Zé Ovo, o baixista, foi o único que parou de vez com esse negócio de tocar em bandas de rock e andava sumido da mídia.

Com dois discos (Lírou Quêil en de Méd Bãrds, 1994, e A Primeira Vez Que Você Me Beijou, 1996) recheados de espírito adolescente e poesia nonsense em estado bruto, o Little Quail encerrou as atividades carregando consigo a fama de injustiçado do rock brasileiro. Muito foi por conta do acaso, muito por causa da postura eternamente low-profile do trio - na mesma época, os Raimundos - vindos da mesma cidade, mas com muito mais apelo pop - bombaram.

No show, que encerrou o Festival Power Trio DeLuxe no Centro Cultural Vergueiro, em São Paulo, os little quails tocaram 22 músicas, ou praticamente todo o repertório dos dois discos, em pouco mais de uma hora e vinte minutos (ficaram de fora "Bombom", do primeiro, e "Composição de Sucesso", "AA", "Rachel's", "Problem Girl" e "Vencemos" do segundo).

Entraram em cena quase anônimos, sem aplausos ou grandes discursos - na abertura, durante a instrumental "Stock Car", cover do clássico game de fliperama, ninguém na platéia sabia muito como agir. A banda, por sua vez, ainda aquecia - ao não conseguir alcançar a nota do vocal em falsete do "uh uh uh uh", Gabriel reduziu uma oitava sem fazer muito drama.

Na segunda faixa, Zé Ovo - que tocou com um baixo emprestado - convidou o público para mais perto e a interação funcionou. O empurra comeu solto nas músicas mais rápidas do primeiro disco, "Berma is a Monster", "Samba do Arnesto", "Baby Now", obrigando o câmera que filmava o show a encontrar um lugar melhor para se posicionar. O clima era informal como em um ensaio - a introdução de "O Sol eu Não Sei" saiu capenga, e Bacalhau parou tudo sem cerimônia para recomeçar. O baterista, aliás, parecia feliz em relembrar os bons tempos, esmurrando seu instrumento sem muito dó - para desespero do roadie, que passou o show inteiro apertando as peças que se soltavam.

Mais afiado a cada faixa, o trio não dava pinta de ter parado de tocar junto há mais de dez anos. O público, de seu lado, correspondia como dava - mesmo com a platéia ganha, só dez por cento dos presentes sabia as letras de cor. Os hits surgiam na sequência e soavam como a trilha sonora da adolescência perdida - "Essa Menina", "Aquela", "Mau-Mau", "Família Que Briga Unida Permanece Unida". Nesta última, Gabriel fez auto-ironia - "Essa música eu escrevi quando tinha 14 anos". Não que fizesse alguma diferença.

Entre cada música, aliás, funcionava como antigamente: Zé Ovo fazia piadinhas, Gabriel fingia não escutar, e Bacalhau parecia ansioso para começar cada música, apesar de sempre precisar da pausa para o descanso entre cada uma. "A gente não faz parte do circuito do rock como você!", brincou enquanto se alongava, se referindo a Gabriel, o único em atividade constante com o Autoramas. Não havia clima de nostalgia, pedidos do público ou muita emoção no ar - era como se o Little Quail continuasse até hoje a rodar o Brasil a bordo da Parati caindo aos pedaços de Zé Ovo.

No clássico dos clássicos "1, 2, 3, 4", o palquinho lotou de convidados para o coro do refrão. Duas músicas depois, tudo se acabou. Gabriel, extenuado, se jogou no chão do camarim improvisado e por lá ficou por dez minutos. Já de pé, recuperado, garantiu que aquele momento foi mesmo único: "Foi só hoje mesmo. Não tem mais nada a ver, estamos em outra".

Fotos: (1) Susan Souza; (2) Carlos Eduardo Freitas