OPINIÃO

As comédias românticas morreram? Ainda não [OPINIÃO]

O último ano no cinema trouxe lampejos de esperança de que o clássico gênero de Hollywood pode reencontrar seu espaço

Por Esther Zuckerman

Publicado em 01/01/2025, às 16h00
'The Idea of You,' 'Hit Man,' e 'Fly Me to the Moon.' Alisha Wetherill/Prime; Brian Roedel / Netflix; Dan McFadden/Sony Pictures
'The Idea of You,' 'Hit Man,' e 'Fly Me to the Moon.' Alisha Wetherill/Prime; Brian Roedel / Netflix; Dan McFadden/Sony Pictures

Esta matéria é uma tradução. Leia a original na Rolling Stone americana AQUI.


Este ano, pela primeira vez em algum tempo, um filme me deu aquele impulso de serotonina que só sinto ao assistir a uma grande comédia romântica. Isso aconteceu perto do final do filme Hit Man, dirigido por Richard Linklater e estrelado por Glen Powell e Adria Arjona. Powell interpreta Gary Johnson, um professor universitário que trabalha como falso assassino de aluguel para ajudar a polícia a pegar pessoas que tentam contratar matadores. Nesse ponto, Gary se apaixonou por Madison, de Arjona, que ele salvou de ser presa ao convencê-la a não mandar matar seu marido abusivo. Agora, Madison fez algo muito grave, e Gary sabe disso. Enviado para confrontá-la em sua casa enquanto usa um microfone escondido, Gary começa a digitar notas em seu iPhone para orientá-la sobre como vender sua história às autoridades que o estão ouvindo. A cena é pura energia de comédia screwball, com Gary e Madison dizendo palavras que seus olhos e corpos não transmitem.

Nos últimos anos, lamenta-se muito o desaparecimento da comédia romântica. Mas esse gênero clássico de Hollywood está realmente morto? Minha resposta: é complicado.

Embora a comédia romântica seja mais comumente associada aos anos 1980, 1990 e 2000 — a era de ouro de roteiristas e diretores como Nora Ephron e Nancy Meyers, e ícones como Meg Ryan, Hugh Grant e Julia Roberts —, o gênero é tão antigo quanto o próprio cinema.

Vai ser necessário muito mais do que alguns anos fracos para matá-lo. E, enquanto trabalhava no meu novo livro, uma história do gênero intitulada Falling in Love at the Movies: Rom-Coms From the Screwball Era to Today, encontrei razões para ser otimista sobre sua longevidade, mesmo que o panorama pareça sombrio.

Um panorama do último ano em comédias românticas conta essa história turbulenta. Tudo começou de forma positiva com Anyone But You, estrelado por Sydney Sweeney e Glen Powell, uma releitura de Muito Barulho por Nada que estreou sem muito alarde em dezembro de 2023, mas lentamente conquistou uma audiência nas redes sociais e acabou arrecadando mais de 200 milhões de dólares mundialmente. Mas pouquíssimas comédias românticas têm recebido lançamentos amplos nos cinemas recentemente, e as que receberam não corresponderam às expectativas. The Fall Guy, sobre um dublê interpretado por Ryan Gosling tentando reconquistar seu antigo amor, uma diretora interpretada por Emily Blunt, foi uma comédia romântica disfarçada de filme de ação. Apesar (ou talvez por causa) dessa mescla de gêneros, teve um desempenho fraco nas bilheterias, arrecadando pouco acima de seu orçamento de produção. E quase ninguém viu Fly Me to the Moon, uma história ambientada na Corrida Espacial dos anos 1960, com Scarlett Johansson e Channing Tatum em papéis que remetem a Doris Day e Rock Hudson.

Enquanto isso, a encantadora The Idea of You, um original da Amazon baseado em um romance que foi um fenômeno no BookTok, foi relegada exclusivamente ao streaming. Anne Hathaway trouxe seu charme brilhante para a história de uma galerista quarentona que se apaixona por um cantor de boy band inspirado em Harry Styles. Eles se conhecem por acaso quando ela entra por engano no banheiro do trailer privativo dele durante o Coachella. (Ah, o amor.)

Hathaway é uma remanescente de uma era anterior de comédias românticas. Ela começou sua carreira trabalhando com um dos reis do gênero, Garry Marshall, em O Diário da Princesa. Eu a adoro nesse estilo, conquistando mas com uma naturalidade que faz essas heroínas parecerem reais.

Ainda assim, ao avaliar o estado da comédia romântica em 2024, minha mente volta a Glen Powell, que começa a se sentir como um defensor solitário do gênero. Hit Man, que ele coescreveu, talvez não tenha sido promovido como uma comédia romântica, mas, ao assisti-lo, é inegável que o DNA do gênero está lá. A tensão central do filme não é se Gary será descoberto como falso, mas se ele acabará com Madison. Powell trouxe até uma energia de comédia romântica para Twisters, embora ainda fosse, bem, um filme sobre tornados, e ele e sua coestrela Daisy Edgar-Jones nem sequer se beijaram no final, para a decepção de praticamente todos que assistiram.

Em Falling in Love at the Movies, procurei traçar um paralelo entre o antigo e o novo no gênero. Meg Ryan não surgiu do nada com seu retrato da “mulher exigente” Sally Albright em Harry e Sally - Feitos um para o Outro, por exemplo. Ela existe em diálogo com Jean Arthur em Os Pecados de Teodora, de 1942, outra loira que parece recatada por fora mas tem uma energia sexual surpreendente.

Em Powell, vejo traços de Gary Cooper nos filmes de Ernst Lubitsch como A Oitava Esposa do Barba Azul ou Ladrão de Alcova. Assim como Cooper, que talvez fosse mais conhecido por westerns, Powell pode ser um cowboy, certamente, mas também pode ser introspectivo ou sofisticado. Ele consegue fazer slapstick tão bem quanto cenas de ação. E, até agora, ele evitou interpretar super-heróis, uma prisião de spandex que manteve tantos astros carismáticos longe da comédia romântica, seja Jennifer Lawrence (que chegou mais perto com O Lado Bom da Vida e Passagem) ou Paul Rudd (por onde anda Josh de As Patricinhas de Beverly Hills?).

Enquanto as estrelas de hoje tentam encontrar seu espaço nas comédias românticas, referenciando e reinterpretando ídolos das telas do passado, as próprias comédias românticas continuam evoluindo. Elas se adaptam aos tempos em que existem.

A magia absurda dos screwballs dos anos 1930 e 1940 eventualmente desapareceu, e os anos 1950 trouxeram narrativas mais melancólicas, como A Princesa e o Plebeu. Logo, aquele brilho dos diálogos deu lugar às comédias românticas mais ousadas dos anos 1970, como Noivo Neurótico, Noiva Nervosa e Ensina-me a Viver. Depois, o modelo de Ephron-Meyers surgiu no final dos anos 1980 até os anos 2000, impulsionado pelas exportações britânicas de Richard Curtis, como Quatro Casamentos e um Funeral, Um Lugar Chamado Notting Hill, O Diário de Bridget Jones e Simplesmente Amor. Todos esses filmes geraram inúmeras imitações, que eventualmente foram descartadas em favor do modelo mais ousado de Judd Apatow, com Ligeiramente Grávidos.

Nos anos 2010, as comédias românticas mudaram em grande parte para o streaming. Houve um vislumbre de esperança para grandes lançamentos nos cinemas em 2018, quando Podres de Ricos foi um sucesso massivo e dominador da cultura. Mas, naquele mesmo ano, Para Todos os Garotos que Já Amei, da Netflix, explodiu nas redes sociais, dando início a uma série de comédias românticas brilhantes no streaming, principalmente centradas em adolescentes. Essas ainda aparecem aqui e ali (veja: o recente Sweethearts, da Max), mas mesmo elas diminuíram enquanto a Netflix volta sua atenção para produzir deliberadamente conteúdos fórmula de feriados para competir com o Hallmark Channel.

Apesar da ascensão de Powell, os anos 2020 ainda não encontraram sua estética para a comédia romântica. Os estúdios tentaram lucrar com a nostalgia, reunindo estrelas dos anos 1990 como Julia Roberts e George Clooney em Ingresso para o Paraíso ou Jennifer Lopez e Owen Wilson em Case Comigo. Mas esses encontros acabam parecendo imitações pálidas do que veio antes.

Por enquanto, temos que nos contentar com um monte de comédias românticas que não querem se rotular como tais: filmes de ação onde os amantes empunham armas ou filmes de arte como o provocante Challengers, de Luca Guadagnino, que basicamente termina da mesma forma que Ladrão de Alcova. Ambos são sobre tríades amorosas.

A boa notícia é que, enquanto esperamos que Hollywood entregue a comédia romântica definidora desta era, você sempre pode assistir a um clássico do gênero e renovar sua esperança de que o melhor ainda está por vir.