CRÍTICA RS

‘M3GAN 2.0’ é exatamente 0,0% assistível

Então a boneca de terror agora é uma heroína de ação? Lutando contra os caras da tecnologia com kung fu? O que está acontecendo aqui?

David Fear

M3GAN 2.0
M3GAN 2.0 - Foto: Divulgação

As continuações de filmes de terror costumam seguir um ciclo repetitivo: você adorou quando Michael Myers/Jason Voorhees/Freddy Krueger/Ghostface/Chucky fez tal coisa. Agora aqui está ele fazendo de novo. Pela segunda vez. Ou terceira. Ou décima. Ocasionalmente, os criadores ficam ambiciosos e/ou ridículos — tipo, vamos fazer um crossover! Ou mandar um deles para o espaço! — mas, geralmente, a ideia é entregar algo parecido com o que fez os fãs se assustarem, se empolgarem, etc., da primeira vez. Acrescente alguns numerais romanos e mantenha tudo igual até o inevitável reboot metalinguístico. Só as máscaras mudam de vez em quando.

Para seu crédito, o pessoal por trás de M3GAN 2.0 não seguiu o plano tradicional de Parte II. Eles poderiam ter escolhido o caminho fácil, simplesmente trazendo de volta a boneca psicótica do sucesso de 2022 e fazendo ela repetir cenas só para agradar os fãs. Um pouco de facadas aqui, umas pausas para piadinhas irônicas ali, algumas reprises da agora icônica dancinha. Em vez disso, optaram por uma sequência fora do padrão — inesperada, mas ainda assim familiar. A Androide Modelo 3 Generativa, com gosto pelo caos, voltou. Mas agora ela é… uma heroína de ação.

Sim, apesar de ter levado uma chave de fenda bem no “cérebro” no final do filme anterior, o robô está de volta — chutando bundas, pulando de penhascos com wingsuit e se metendo em várias travessuras no estilo Missão: Impossível pelo Vale do Silício. Conceitualmente, dá para ver como essa mudança pode parecer interessante. Na prática? Haja paciência. Transformar ela de potencial ícone de slasher em algo tipo “M3GAN Bond” deve ter parecido uma evolução. O resultado é mais para Microsoft Bob das continuações de terror. O modelo é 2.0. O filme — exagerado, sem impacto e narrativamente inquieto — é 0.0% assistível.

Resumindo: tem uma nova boneca na área. Resumo esticado de forma dolorosa e arrastada: M3GAN original, agora só uma consciência flutuante que aparece em dispositivos inteligentes para soltar comentários passivo-agressivos, precisa ser transferida para uma máquina maior, mais rápida, melhor — e que luta kung fu — para enfrentar sua sucessora. Gemma (Allison Williams), sua criadora, agora virou uma importante ativista anti-IA. Cady (Violet McGraw), a jovem que era dona da M3GAN, continua traumatizada pelo surto da robô-companheira, mas agora sabe aikido. De alguma forma, o projeto de Gemma foi parar nas mãos dos militares, que o usaram para criar droides armados. O protótipo, chamado Amelie (Ivanna Sakhno), foi emprestado à inteligência saudita para uma missão. Não dá certo. Amelie ignora sua diretiva primária e começa a seguir sua verdadeira missão: se carregar na nuvem e dominar todas as redes online em nome da dominação mundial, blá blá blá.

Tem agentes do FBI babacas, capangas genéricos com sotaques forçados, um “bro” da tecnologia com falsa humildade (Aristotle Athari) e um bilionário da tecnologia (Jemaine Clement) que é uma mistura de vários figurões horríveis da vida real, mas que bem poderia se chamar Melon Tusk. E falando em nomes: parabéns ao roteirista-diretor Gerard Johnstone por colocar um MacGuffin em uma empresa fictícia dos anos 1980 que começou fazendo fotocopiadoras e depois virou referência em tecnologia, e chamá-la de Xenox. Não temos ideia de que empresa real ele quis se referir. (Mas, dito isso, a homenagem visual a Metrópolis em um dos doze clímax do filme é bem legal.)

Você também vai ver Williams alternando entre expressões de preocupação e expressões de muita preocupação; tantos “plot twists” e reviravoltas narrativas que talvez seja melhor começar a anotar num gráfico conforme as coisas avançam; e tédio. Dois assistentes, vividos por Jen Van Epps e Brian Jordan Alvarez, funcionam como anjinho e diabinho nos ombros de Gemma, mas acabam parecendo personagens que não foram finalizados a tempo porque o prazo estava apertado. Vários “revólveres de Tchekhov” — um neurochip, um exoesqueleto, alguma coisa que pode desligar robôs rebeldes antes que eles soltem veneno demais — são colocados na estante com setas de neon apontando para eles.

O que M3GAN 2.0 não entrega são sustos, frases de efeito dignas de gif ou qualquer vestígio de diversão. Fora a anti-heroína fazendo, do nada, uma versão de “This Woman’s Work”, de Kate Bush, há pouco (ou nenhum) traço do que fez o filme original ser um deleite para os fãs do gênero e, ao mesmo tempo, um produto kitsch e autoconsciente, perfeito para virar meme. Teríamos preferido ver uma continuação fictícia dentro da propriedade intelectual original do que essa cópia pobre de um filme de ação.

É como se o pessoal por trás do primeiro filme achasse que o que importava mesmo era a boneca — e que ela era tão adorada que poderia ser jogada em qualquer história que o público ia curtir do mesmo jeito. Cópias mal feitas podem até esgotar uma franquia. Mas aquelas que esquecem ou ignoram o que fez tudo funcionar no começo podem matá-la. De repente, uma repetição genérica da versão 1.0 nem parece uma ideia tão ruim assim.

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