Musa se despe dos ornamentos do rock
PJ Harvey se despiu de sua peça mais básica, a guitarra, e desvendou nuances de sua música que, até agora, só apareciam discretamente em um ou outro decote de sua obra. White Chalk é o oitavo álbum da inglesa e musa quase absoluta do rock de sua geração. Antes áspera até as entranhas, sua voz agora aparece sempre suave, inclusive nas raras melodias desesperadas. "Grow Grow Grow", por exemplo, é cantada com sutileza apesar da tensão sugerida pelas frases de piano. E mesmo "The Mountain", que encerra o disco com um berro agudo e fantasmagórico, não lembra em quase nada a cantora que urra elegantemente em "Who the Fuck" - faixa do seu disco de inéditas anterior, Uh Huh Her, de 2004. Voz e piano, aliás, são corpo e alma de White Chalk. Um ou outro instrumento aparecem como maquiagem extra das faixas, mas a essência instrumental do trabalho é concebida de teclas. A infalível e lisérgica faixa-título, à base de violão, e "Broken Harp", tocada com harpa e sob inspirações de Velvet Underground & Nico, são as únicas exceções em um repertório de 11 músicas. Curiosamente, a multiinstrumentista não dominava o piano antes de White Chalk. A pouca intimidade fez a roqueira desenvolver um jeito próprio de tocar, não muito sofisticado em harmonias, mas sempre solto e surpreendente na construção dos arranjos. A ruptura com as guitarras pode provocar algum saudosismo no ouvinte menos preparado. Mas a incursão de Polly Jean por uma estética sombria e sutil a fez tornar-se uma cantora ainda melhor, sem nenhum prejuízo para a atitude e estilo que cultiva há 15 anos como última diva do rock. O piano intuitivo e o timbre de voz em sua forma mais pura desnudam sua música dos ensinamentos da escola punk e lapidam sua vocação como compositora e intérprete de canções profundas.
Por Ramiro Zwetsch
PJ Harvey
White Chalk
Island Records / Universal
12
10
2007