U2
“Nada pode evitar que este seja o melhor dia de todos”, Bono declara em “Love Is All We Have Left”, abertura de Songs of Experience, sequência de Songs of Innocence (2014). Mas a interpretação do cantor nos intriga por se mostrar reservada: parece uma prece cautelosa ou um desejo frágil, suspenso sob um toque da guitarra de The Edge e pela grave tensão do baixo de Adam Clayton. O cantor usa a bravata em “Lights of Home”: “Mais um empurrão e eu renasço”, ele canta, com o verso reforçado pela guitarra bluesy de The Edge e pela batida rock/hip-hop de Larry Mullen Jr. Na canção, o cantor reconhece a mortalidade: “Eu não deveria estar aqui. Deveria estar morto”, ele admite logo no começo da faixa.
Se em Songs of Innocence a banda mais esperançosa do rock olhava para o passado, especificamente para a época em que eles eram sonhadores vivendo sob as raízes punk na Dublin dos anos 1980, Songs of Experience retrata outra realidade dos músicos, que agora chegaram à meia-idade. Essa urgência amarra o mosaico do disco; o começo sinistro e hesitante em “Love Is All We Have Left”; o nascer do sol em “You’re the Best Thing about Me”; e a súplica psicodélica em “Summer of Love”, com alusões a uma Síria devastada. O álbum também tem reflexos do passado. “The Blackout” abriga as contradições de Pop (1994), em que as noites de embalo trombam com o apocalipse; “The Little Things That Give You Away” resgata ecos de The Joshua Tree (1987).
As mudanças de dinâmicas sonoras e de atmosferas emocionais causam um efeito cumulativo em “Get Out of Your Own Way” e “Red Flag Day”. Repleta de guitarras metálicas, “American Soul” é uma declaração de gratidão às raízes musicais norte-americanas que impulsionaram o U2. A gravação traz a participação de Kendrick Lamar, em uma espécie de sermão reprimido.
“13 (There Is a Light)” também marca uma volta à inocência, repetindo o refrão já apresentado em “Song for Someone”, do álbum anterior. Mas se esta última era uma carta de amor a Ali, esposa do cantor, “13” é uma renovação dos propósitos que Bono tem na arte de escrever canções e tocá-las no palco. O U2 nos ensinou que cada nova faixa do grupo ainda pode soar como o primeiro dia do resto de nossas vidas. Songs of Experience é essa inocência renovada.
Fonte: Universal