Pedro Almodóvar
Cineasta retoma clima anárquico do começo de carreira em filme ameno
Almodóvar já foi mais pungente ao retratar as patologias e os vícios da sociedade moderna. Seus primeiros trabalhos tinham um frescor anárquico e uma energia rara na conjugação tragicômica de seres estranhos, traduzidos em cenários escrachadamente kitsch. Aos poucos, o diretor espanhol foi adicionando lirismo estético e personagens mais complexos e dúbios, até culminar no primoroso e incômodo A Pele Que Habito. Em seu mais recente filme, Os Amantes Passageiros, o diretor retoma o clima esmaecido e disfarçadamente mambembe e teatralizado dos primórdios, mas sem as hilárias alfinetadas. Aqui, um grupo de tripulantes excêntricos faz confissões desesperadas sobre pecados e últimas vontades que possuem dentro de um avião fora de controle. Existe um pouco do surrealismo de Luis Buñuel nesse ambiente claustrofóbico e sem saída, mais nas intenções do que nos efeitos. Há também várias liberdades poéticas, como uma coreografia desengonçada dos comissários de bordo. Mas esse chiste é insuficiente para trazer inspiração a um trabalho morno, tão recessivo quanto a economia do país de origem do cineasta.