MÚSICA SACRA

A cantora pop que teve seu novo disco aprovado pelo Vaticano

Importante cardeal destacou aproximação da artista catalã com a espiritualidade; bispo celebrou abordagem livre sobre o que ela sente ser a natureza de Deus

Pedro Hollanda

Papa Leão XIV visita túmulo de São Francisco em Assis, próximo ao Vaticano (Foto: Simone Risoluti - Vatican Media via Vatican Pool/Getty Images)
Papa Leão XIV visita túmulo de São Francisco em Assis, próximo ao Vaticano (Foto: Simone Risoluti - Vatican Media via Vatican Pool/Getty Images)

Música pop e a Igreja Católica não têm a melhor das relações. Seja por Madonna, Sinéad O’Connor ou até mais recentemente Sabrina Carpenter, a organização religiosa nunca foi muito fã de como artistas tratam sua instituição. Mas finalmente encontraram uma que gostaram: Rosalía.

O ministro da Cultura do Vaticano, Cardeal José Tolentino de Mendonça, prefeito do Dicastério para a Cultura e a Educação, destacou Lux (2025), álbum mais recente da artista. Mesmo com faixas polêmicas como “Dios es un stalker” (“Deus é um perseguidor”), ele refletiu em entrevista à EFE (via ABC):

“Quando uma criadora como Rosalía fala de espiritualidade, significa que ela capta uma profunda necessidade na cultura contemporânea de se aproximar da espiritualidade, de cultivar uma vida interior.”

Rosalía
A cantora Rosalía (Foto: PG/Bauer-Griffin/GC Images)

Em uma carta aberta à sua congregação (via The Independent), Xabier Gómez García, bispo de Sant Feliu de Llobregat — paróquia da qual a cidade natal da cantora, perto de Barcelona, faz parte —, também elogiou o trabalho da cantora. O monsenhor reconheceu que, apesar do conteúdo provocativo, a artista “fala com liberdade absoluta e sem reservas sobre o que ela sente ser a natureza de Deus, além do seu desejo e sede (por conhecer Deus)”.

Ele complementou:

“Quando escutei Lux e a Rosalía falando sobre o contexto por trás do álbum e seu processo criativo, me encontrei perante um processo e um trabalho que transcende música. Aqui estava uma busca espiritual através do testemunho de mulheres de imensa maturidade espiritual.”

Rosalía e a inspiração de Lux

Rosalía, por sua vez, tem sido aberta com relação a inspiração por trás de Lux. Em uma entrevista coletiva concedida em outubro, a artista se abriu sobre a busca espiritual que guiou o trabalho.

Ela declarou:

“No fim das contas, numa era que não parece ser de fé ou certeza ou verdade, há a necessidade maior que nunca de uma fé, ou uma certeza, ou uma verdade. Um artista duvida menos de sua vocação quando trabalha em serviço de Deus do que quando trabalha a serviço de si próprio.”

Além das textos históricos contando sobre a vida de santas ao longo da história, Rosalía também se inspirou em obras seculares envolvendo autoras mulheres — principalmente a filósofa francesa Simone Weil e a escritora brasileira Clarice Lispector, que ela citou como suas principais influências em Lux. Para a música, ela fez uso de estilos musicais europeus tradicionais, tal qual o flamenco, bolero, fado e até mesmo a ópera, tudo filtrado por sua lente de pop experimental.

Em resenha para a Rolling Stone Brasil, a jornalista Daniela Swidrak escreveu:

“Por baixo de toda a teatralidade operística, Lux também é profundamente pessoal. Algumas músicas fazem referência clara a um relacionamento que não deu certo e as fases de dor, conformidade, a busca por algo maior e enfim a superação. Estaria ela fazendo referência ao seu ex-noivo Rauw Alejandro? As entrelinhas sugerem que sim. […] Sim, Lux é um disco dramático. É introspectivo. Talvez as pessoas sintam falta de faixas mais dançantes, mas carrega uma dança na alma, aquele tipo de movimento interno que faz fechar os olhos e balançar a cabeça mesmo quando se está sozinho no quarto. […] É, simplesmente, um dos álbuns mais ousados e extraordinários já feitos por qualquer artista pop na história recente. Um disco feito sem fórmulas prontas, que vai redefinir conversas sobre música pelos próximos anos.”

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Pedro Hollanda é jornalista formado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso e cursou Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Apaixonado por música, já editou blogs de resenhas musicais e contribuiu para sites como IgorMiranda.com.br, Scream & Yell e Rock'n'Beats.
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