A cantora pop que teve seu novo disco aprovado pelo Vaticano
Importante cardeal destacou aproximação da artista catalã com a espiritualidade; bispo celebrou abordagem livre sobre o que ela sente ser a natureza de Deus
Pedro Hollanda
Música pop e a Igreja Católica não têm a melhor das relações. Seja por Madonna, Sinéad O’Connor ou até mais recentemente Sabrina Carpenter, a organização religiosa nunca foi muito fã de como artistas tratam sua instituição. Mas finalmente encontraram uma que gostaram: Rosalía.
O ministro da Cultura do Vaticano, Cardeal José Tolentino de Mendonça, prefeito do Dicastério para a Cultura e a Educação, destacou Lux (2025), álbum mais recente da artista. Mesmo com faixas polêmicas como “Dios es un stalker” (“Deus é um perseguidor”), ele refletiu em entrevista à EFE (via ABC):
“Quando uma criadora como Rosalía fala de espiritualidade, significa que ela capta uma profunda necessidade na cultura contemporânea de se aproximar da espiritualidade, de cultivar uma vida interior.”

Em uma carta aberta à sua congregação (via The Independent), Xabier Gómez García, bispo de Sant Feliu de Llobregat — paróquia da qual a cidade natal da cantora, perto de Barcelona, faz parte —, também elogiou o trabalho da cantora. O monsenhor reconheceu que, apesar do conteúdo provocativo, a artista “fala com liberdade absoluta e sem reservas sobre o que ela sente ser a natureza de Deus, além do seu desejo e sede (por conhecer Deus)”.
Ele complementou:
“Quando escutei Lux e a Rosalía falando sobre o contexto por trás do álbum e seu processo criativo, me encontrei perante um processo e um trabalho que transcende música. Aqui estava uma busca espiritual através do testemunho de mulheres de imensa maturidade espiritual.”
Rosalía e a inspiração de Lux
Rosalía, por sua vez, tem sido aberta com relação a inspiração por trás de Lux. Em uma entrevista coletiva concedida em outubro, a artista se abriu sobre a busca espiritual que guiou o trabalho.
Ela declarou:
“No fim das contas, numa era que não parece ser de fé ou certeza ou verdade, há a necessidade maior que nunca de uma fé, ou uma certeza, ou uma verdade. Um artista duvida menos de sua vocação quando trabalha em serviço de Deus do que quando trabalha a serviço de si próprio.”
Além das textos históricos contando sobre a vida de santas ao longo da história, Rosalía também se inspirou em obras seculares envolvendo autoras mulheres — principalmente a filósofa francesa Simone Weil e a escritora brasileira Clarice Lispector, que ela citou como suas principais influências em Lux. Para a música, ela fez uso de estilos musicais europeus tradicionais, tal qual o flamenco, bolero, fado e até mesmo a ópera, tudo filtrado por sua lente de pop experimental.
Em resenha para a Rolling Stone Brasil, a jornalista Daniela Swidrak escreveu:
“Por baixo de toda a teatralidade operística, Lux também é profundamente pessoal. Algumas músicas fazem referência clara a um relacionamento que não deu certo e as fases de dor, conformidade, a busca por algo maior e enfim a superação. Estaria ela fazendo referência ao seu ex-noivo Rauw Alejandro? As entrelinhas sugerem que sim. […] Sim, Lux é um disco dramático. É introspectivo. Talvez as pessoas sintam falta de faixas mais dançantes, mas carrega uma dança na alma, aquele tipo de movimento interno que faz fechar os olhos e balançar a cabeça mesmo quando se está sozinho no quarto. […] É, simplesmente, um dos álbuns mais ousados e extraordinários já feitos por qualquer artista pop na história recente. Um disco feito sem fórmulas prontas, que vai redefinir conversas sobre música pelos próximos anos.”
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